Jesus: a Luz que dissipa as trevas
Breve introdução
Em plena Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos e ao celebrarmos, neste domingo, o Domingo da Palavra, a liturgia coloca o nosso olhar sobre a pessoa de Jesus. Ele é a verdadeira luz que brilha nas trevas. Assim O apresenta o evangelista Mateus, citando o texto do profeta Isaías que nos serve de primeira leitura. E, ao mesmo tempo e sem demoras, Jesus começa a sua pregação nas sinagogas e nas aldeias por onde passava. Não sem antes ter chamado os primeiros quatro Apóstolos (dois pares de irmãos) para que sejam testemunhas d’Ele: do que viram e do que ouviram. É Ele o único fundamento da Igreja. Fundamento lembrado por Paulo na sua Primeira Carta aos Coríntios, tentando superar as divisões que se instalaram nela, também a propósito de motivos religiosos. É através da pregação que a Igreja, hoje, de forma particular, pode apresentar Cristo ao mundo. Pregação que fará brotar frutos de caridade.
1. Invocação
Senhor Jesus,
Vós que dissestes:
«Eu sou a luz do mundo. Quem me segue,
não andará nas trevas, mas terá a Luz da vida» (Jo 8,12),
tocai os nossos corações para que,
iluminados pela vossa graça,
possamos construir um mundo
mais justo e mais fraterno,
onde as trevas do pecado e da morte
sejam vencidas pela luz da fé
e pela beleza do amor.
Ámen.
2. Escuta da Palavra de Deus
2.1. Vamos escutar uma passagem do Evangelho segundo S. Mateus
Depois das narrações dos chamados Evangelhos da Infância de Jesus e após o Seu Baptismo no Jordão, Jesus inicia a sua missão na Galileia, mais precisamente nos territórios de Zabulão e Neftali, fixando-se em Cafarnaum, à beira do Lago de Genesaré, que funcionará como ponto de partida das suas pregações pelas regiões vizinhas. Não sendo a capital política (era Tiberíades), nem tendo a importância de Magdala, mas rica, acabava por ser tida como a capital religiosa da Galileia, fazendo fronteira com Golan e por onde passava o famoso «caminho do Mar» que levava do Egipto à Mesopotâmia. Considerada terra de pagãos pelos judeus mais zelosos, pois os seus habitantes tinham-se misturado com outros povos, é precisamente aqui que Jesus quis iniciar a Sua acção messiânica de redenção e salvação.
2.2. Leitura do Evangelho de S. Mateus (Mt 04, 12-23)
Quando Jesus ouviu dizer
que João Baptista fora preso,
retirou-Se para a Galileia.
Deixou Nazaré e foi habitar em Cafarnaum,
terra à beira-mar, no território de Zabulão e Neftali.
Assim se cumpria o que o profeta Isaías anunciara, ao dizer:
«Terra de Zabulão e terra de Neftali,
estrada do mar, além do Jordão, Galileia dos gentios:
o povo que vivia nas trevas viu uma grande luz;
para aqueles que habitavam na sombria região da morte,
uma luz se levantou».
Desde então, Jesus começou a pregar:
«Arrependei-vos, porque o reino de Deus está próximo».
Caminhando ao longo do mar da Galileia,
viu dois irmãos:
Simão, chamado Pedro, e seu irmão André,
que lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores.
Disse-lhes Jesus: «Vinde e segui-Me
e farei de vós pescadores de homens».
Eles deixaram logo as redes e seguiram-n’O.
Um pouco mais adiante, viu outros dois irmãos:
Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João,
que estavam no barco, na companhia de seu pai Zebedeu,
a consertar as redes.
Jesus chamou-os
e eles, deixando o barco e o pai, seguiram-n’O.
Depois começou a percorrer toda a Galileia,
ensinando nas sinagogas,
proclamando o Evangelho do reino
e curando todas as doenças e enfermidades entre o povo.
2.3. Breve comentário
Tendo nascido em Belém, da Judeia, Jesus cresceu e viveu grande parte da vida em Nazaré. Nos últimos três anos da Sua vida, quando iniciou a pregação sobre o Reino de Deus fixa-se em Cafarnaum. Não deixa de ser interessante considerar que a Galileia, região que os judeus mais ortodoxos consideravam uma terra de pagãos, tenha sido a escolhida por Jesus para iniciar as suas pregações. Particularmente Cafarnaum, ficava na fronteira com o mundo pagão. Aponta já para a nova realidade que Jesus vem ensinar: a universalidade da salvação, ou seja, não um exclusivo do povo judeu, mas uma proposta feita a todos os povos. «… O povo que vivia nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam na sombria região da morte, uma luz se levantou».
Num segundo momento do texto apresenta-se o conteúdo da mensagem e da missão de Jesus: «Arrependei-vos, porque o reino de Deus está próximo». É Jesus, Ele mesmo, a concretização desse Reino: um reino de Justiça, paz, misericórdia, bem diferente dos reinos do mundo e de muitos reinados que o povo judeu conheceu, com monarcas mais preocupados com os seus interesses pessoais do que com a causa do bem comum, como bem denunciaram muitos profetas. Para acolher este novo Reino e fazer parte dele é necessário o arrependimento. Não basta uma operação de cosmética superficial. É necessário mudar de mentalidade e, de coração, deixar que Deus reine. Assim era para aqueles primeiros discípulos e para nós, hoje.
Jesus chama a Si os primeiros discípulos. Ao contrário dos rabis, até então, que eram escolhidos pelos seus discípulos, é Jesus que toma a iniciativa de chamar, formar e depois de entrarem em profunda sintonia com o Seu projecto salvador, envia-los em missão para darem testemunho do que viram e ouviram. Aliás, será esse um dos critérios para nos primeiros tempos se agregar alguém ao colégio dos Apóstolos: alguém que testemunhou os ensinamentos de Jesus, alguém que fez caminhada com eles. E eles, de imediato, deixaram as suas famílias, as suas profissões, o seu quadro mental de referências, as suas seguranças económicas e seguiram Jesus. Certamente não entenderam tudo de uma vez. Mas a generosidade do seu sim deve ser para nós inspirador. Para além dos cálculos, ser cristão e, por consequência, discípulo-missionário, é um risco que vale a pena correr.
Por fim, vemos Jesus actuar: «ensinando nas sinagogas, proclamando o Evangelho do reino e curando todas as doenças e enfermidades entre o povo». Às palavras, juntam-se os gestos de Jesus. As Suas Palavras dizem e fazem. Não são palavras inconsequentes ou de pura retórica. São palavras de vida eterna, como um dia lhe dirá Pedro. São palavras que levantam, perdoam, reconstroem vidas.
3. Silêncio meditativo e diálogo
– A celebração da Eucaristia é constituída por dois momentos fundamentais: a liturgia da Palavra e a liturgia Eucarística. A Palavra de Deus não é um adorno: ela é a expressão da vontade e dos projectos de Deus a nosso respeito e para nosso bem. Se não escutarmos a Palavra, como poderemos conhecer os projectos do Senhor, como poderemos responder ao Seu chamamento com prontidão, como fizeram Pedro, André, Tiago e João? Neste domingo da Palavra, é mais uma oportunidade que temos para deixar que as Palavras do Senhor ecoem no mais profundo do nosso coração.
– Em Jesus, o anúncio do Reino de Deus não é mera proclamação, mas realização. O início da pregação de Jesus foi verdadeiro bálsamo para aqueles pobres de Israel que esperavam a concretização das promessas de Deus, anunciadas por Isaías e que Jesus assume por inteiro: «cumpriu-se hoje mesmo aquilo que acabais de ouvir». Quem participa na Eucaristia deve ser capaz de tirar consequências socias para a sua vida e para a vida da comunidade. Como respondo à Palavra de Deus?
– «Arrependei-vos, porque o reino de Deus está próximo». O Hoje da Salvação, realizado por Jesus, deve concretizar-se em nós com uma dupla atitude que se implica mutuamente: de arrependimento e de fé. Sem fé não há verdadeiro arrependimento (é mero esforço nosso) e o arrependimento reforça em nós a confiança na misericórdia de Deus. O acto penitencial, no início da Eucaristia, ajuda-nos a tomar consciência da nossa condição de penitentes sempre necessitados de perdão. Como me preparo para receber Jesus com um coração puro? Celebro com frequência o sacramento da reconciliação?
– «Vinde e segui-Me e farei de vós pescadores de homens». Ao contrário do comodismo que nos instala, Jesus desinstala-nos e propõe-nos segui-Lo. E é na medida que nos dispomos a segui-Lo que poderemos assumir a Sua missão, hoje. Ser pescador de homens é resgatar quem está na iminência de se perder nas ondas do mar revolto da vida. Que contributo quero eu dar para ajudar quem vive na tristeza, no desespero, na angústia?
4. Oração final e gesto familiar
Há uma só fé, um só Senhor, um só Baptismo, um só Deus revelado por Jesus. A Eucaristia, nas duas mesas do Pão e da Palavra, é um convite forte à unidade. Se há um só Deus, não pode haver mais do que um rebanho. Procuremos rezar pela unidade e participar, quanto possível, nalgum momento comunitário de oração, promovendo o diálogo com os nossos irmãos cristãos ortodoxos, evangélicos ou anglicanos. Se o Senhor nos quer sentar à mesma Mesa, no Reino dos Céus, porque não desejar já aqui na terra a plena unidade? Se tal não for possível, em família, reze-se a oração que Jesus nos ensinou. No mesmo Pai nos reconheceremos como irmãos.
https://bit.ly/2W4uDI6