Decorreu de 21 a 26 de agosto, em Dublin, na Irlanda, o IX Encontro Mundial de Famílias, que juntou várias centenas de milhares de católicos de todo o mundo e contou com a presença do Papa Francisco. A Diocese de Leiria-Fátima esteve presente, com um grupo de 40 pessoas, pais e filhos de 11 famílias, acompanhadas pelo padre José Augusto Rodrigues, diretor do Departamento de Pastoral Familiar.
São eles que nos contam a experiência que viveram e como ser Igreja rima com fé, amor, acolhimento, alegria… e família.
Um congresso rico de conteúdos
O congresso pastoral deste Encontro Mundial de Famílias decorreu nos dias 22 a 24 de agosto, na RDS Arena, perto do centro de Dublin, um complexo com pavilhões de exposições e um estádio. Durante a manhã, decorriam vários painéis e conferências simultaneamente, cabendo aos participantes escolherem os que considerassem mais interessantes. Uma escolha difícil, dada a qualidade e quantidade. Da parte da tarde, havia uma conferência seguida de Missa, no estádio, seguindo-se mais painéis temáticos e espetáculos de música e de dança.
Dois pavilhões estavam reservados para uma exposição onde os mais variados movimentos, congregações, dioceses, associações e empresas tinham as suas bancas, onde se apresentavam e promoviam as suas atividades ou produtos. Havia ainda uma grande área para atividades de crianças e jovens, tendas de oração, etc., e nos intervalos havia sempre grupos de jovens irlandeses a tocar ou a dançar.
O congresso, como todo o encontro, pretendeu refletir sobre a exortação “A Alegria do Amor”: no dia 22, o tema foi “A Família e a Fé”; no dia 23, “A Família e o Amor”; e, no dia 24, “A Família e a Esperança”.
Uma das conferências a que assistimos e que nos marcou foi apresentada pelo cardeal Gualtiero Bassetti, presidente da Conferência Episcopal Italiana. O título era “Acompanhar, Discernir e Integrar: A Fragilidade Humana e A Alegria do Amor”. Durante a sua apresentação, o cardeal defendeu que a posição da Igreja perante as situações de fragilidade não pode ser extremada. Nem laxismo, nem rigorismo. Não se pode apontar tudo como pecado mortal. Por diversas vezes referiu que, ao lidarmos com estas situações, devemos ter sempre presente o ensinamento de Cristo: a misericórdia. No espaço de perguntas e respostas, foi possível constatar que as propostas do Papa Francisco, de acolhimento a quem se encontra em situações de fragilidade, não são bem acolhidas por alguns setores da Igreja.
Como nota final, realçamos o espírito de fé, fraternidade, amizade e animação que reinaram em todos estes espaços.
Elsa e José Machado
Caloroso acolhimento das famílias de Navan
À chegada à paróquia de Navan, esperava-nos um “refresment”, ou seja, umas maravilhosas sandes acompanhadas de chá preto com leite e café. A alegria, o afeto, a simpatia com que nos acolheram, a começar pelo padre Declan, foi inimaginável e ficará para sempre no nosso coração. Uma língua diferente, uma cultura diferente, mas uma mesma fé uniu-nos de imediato.
Cada uma das famílias portuguesas foi distribuída por outra irlandesa, que nos acolheram de braços abertos, como se nos conhecessem desde sempre. A maioria dos casais está já reformado, alguns com bastante idade, outros com muitas limitações físicas, mas disponibilizaram-se de imediato, quando há uns meses foi pedido à paróquia que acolhesse famílias provenientes de Portugal. Gente boa, generosa, com uma vivência religiosa enorme e uma fé impressionantes, não deixaram ninguém indiferente, marcando a todos profundamente.
Levantavam-se cedo, antes de nós (antes das 7 da manhã), preparavam-nos o pequeno almoço, levavam-nos de carro para ir apanhar o autocarro que nos levaria a Dublin para as conferências. E alguns ainda iam buscar-nos ao autocarro, já tarde, davam-nos jantar e dispunham-se a ficar à conversa no serão. Quantas vezes nos questionámos: “Seríamos nós capazes de fazer o mesmo? Seríamos nós capazes de tamanha generosidade e simplicidade?”
Os paroquianos organizaram um passeio para nós, ofereceram-nos almoço, celebraram connosco na igreja de Navan o início do Encontro Mundial das Famílias e outras Eucaristias, prepararam e fizeram uma noite festiva, com “barbecue” e um grupo de música irlandesa.
Mas, além de tudo isto, o que mais nos impressionou foi a forma como estes cristãos prepararam, acolheram e rezaram o Encontro Mundial das Famílias, em Dublin, na Irlanda. Com uma profundidade e fé tão grandes que nos encheram o coração e a alma e por isso foi tão difícil a despedida… Agradecemos a Deus todas estas bênçãos e como as gentes de Navan foram um belo exemplo de fé e também de devoção a Nossa Senhora, para todos nós!
Família Talefe Lopes
Festival das Famílias e Missa de encerramento
A manhã de sábado começava com sol e a chegada do Papa Francisco era acompanhada com entusiamo pela rádio e pela televisão. Quando chegámos a Mountjoy Square, o Papa visitava ali perto a pró-catedral de Santa Maria. Entrámos no Estádio Croke Park, onde iria decorrer o Festival das Famílias, pelas 16h30. O tempo passou rapidamente entre fotos e conversas nos nossos lugares, no relvado.
No início do espetáculo, vimos emocionados passar a nossa bandeira no cortejo de outras centenas de estandartes de todos os países e cores, ao ritmo irlandês dado pelo tema de abertura. As canções foram sempre acompanhadas por coreografias variadas e ninguém ficou sentado quando 500 alunos das escolas de dança espalhados pela plateia acompanharam os Riverdance. Cantámos temas conhecidos, como Everybody hurts (REM), e vimos o estádio iluminar-se com as lanternas dos telemóveis, enquanto se ouvia High hopes (Kodaine) pelas vozes do coro de ex-sem-abrigo, ou Ave Maria, por Andrea Bocelli e Celine Byrne.
A chegada do Papa ao recinto foi calorosamente aplaudida. Uma das crianças do nosso grupo, depois de furar a multidão, disse nunca ter pensado sentir tanta alegria por estar tão próximo de Francisco.
As palavras do Sumo Pontífice destacaram os sete testemunhos de famílias de todo o mundo. Sublinhou a importância do perdão quotidiano e pediu que ninguém adormeça sem que os problemas sejam resolvidos. “Perdão”, “por favor” e “obrigado” foram as palavras que fez a multidão repetir três vezes entusiasticamente. Sublinhou, ainda, a boa utilização da tecnologia como ponte de união e apontou a família como o farol que ilumina o mundo à luz do Evangelho.
No domingo, acordámos de madrugada para a Missa de encerramento, no Phoenix Park. A chuva, o vento e o frio não demoveram os quarenta leirienses, nem uma multidão a perder de vista. Fizemos mais de 5 km a pé. À medida que caminhávamos, juntavam-se famílias de todas as condições e partes do mundo. Cadeiras de rodas, carrinhos de bebé, novos e velhos caminhavam movidos pela mesma fé entre as barreiras de segurança. Desfraldámos as bandeiras das quinas e instalámo-nos com vista para uma campina imensa, povoada de gente com capas plásticas. Num dos muitos ecrãs gigantes, podíamos ver o altar. À chegada, o Papa voltou a passar ao nosso lado e corremos a saudá-lo.
No ato penitencial, em castelhano, Francisco pediu perdão pelos crimes e desvios que envergonham a Igreja e rogou a Deus que nunca mais sucedam e se faça justiça.
A homilia foi inspirada no Evangelho do dia. As famílias deverão ser testemunho das palavras de vida eterna de Jesus num mundo hostil que esquece os mais fracos. Defendeu que a Igreja é também uma grande família de famílias, com a missão de espalhar a alegria do amor e do Evangelho. Terminou anunciando o próximo encontro mundial, em Roma, em 2021.
Isabel e Pedro Alves
Experiência de uma família numerosa
Embarcámos nesta “aventura” cheios de expetativas e alguns receios. A opção foi viver esta experiência em família, com os nossos três filhos, de 9, 5 e 4 anos de idade. Eles estavam entusiasmados, esperando um reforço de férias… iam andar de avião e conhecer um país novo. Havia o receio da língua, mas os pais estavam ali. Para nós, as inquietações eram maiores, para além do desconhecido relativamente a como seria a experiência na família de acolhimento, pois levar três crianças pequenas era um desafio logístico em vários aspetos: gerir a sua e a nossa participação em diferentes dinâmicas, a alimentação, as caminhadas, o receio de que algum ficasse doente. Mas tudo correu bem e foi uma experiência familiar muito significativa, em que a alegria do amor se manifestou em diferentes momentos e contextos.
Gostaríamos de testemunhar a riqueza e a maravilha de ser acolhido de braços abertos por uma família desconhecida e que, em comum, à partida, só partilhava a mesma fé em Deus. Uma família que tudo fez para nos receber bem e que nos fez sentir em casa. Para além disso, pudemos testemunhar a sua alegria em ser família, também numerosa, e partilhar com eles momentos de convívio, de fé, de alegria.
Sentimos, ainda, um apoio enorme de todas as famílias portuguesas que estiveram connosco durante esta semana. Estabeleceram-se laços e houve partilha e ajuda. Houve sempre alguém a oferecer uma mão para empurrar os carrinhos dos pequenos, houve crianças, jovens e adultos que ficaram com eles nas suas atividades para que nós, os pais, pudéssemos participar noutros momentos do encontro. No final, foi lindo ver as relações que os nossos filhos estabeleceram com as outras crianças e jovens do grupo, envolvendo brincadeiras, carinho, atenção e cumplicidade.
Tal como esperávamos, esta participação foi uma oportunidade de crescimento conjunto, onde escutámos, vimos e vivemos testemunhos da beleza do matrimónio e das suas bênçãos na vida de cada um.
Família Menino
Ambiente de família com todos
Há uns meses, quando os meus pais me disseram que íamos a Dublin (Irlanda), a minha primeira reação foi de felicidade, porque nunca tinha andado de avião e nunca tinha ido ao estrangeiro. Pensei que ia de férias… Quando me disseram que íamos em grupo ao Encontro Mundial das Famílias e ficaríamos hospedados em famílias irlandesas, fiquei na dúvida. Tive receio de que aquela semana não tivesse qualquer interesse para mim. Com o passar do tempo e o aproximar da viagem, as expectativas foram crescendo, até porque o grupo ia aumentando com pessoas conhecidas e algumas até da minha idade.
Agora, de novo em casa, acho que a experiencia foi fantástica, foi a melhor da minha vida. Conheci um novo país, outra cultura e famílias irlandesas. Convivi com uma família em especial, onde estive hospedada durante uma semana. A Nuala e o William acolheram-nos como se fossemos familiares. Foi isso que senti: estava em família, apesar de haver alguma dificuldade de comunicação (toda em inglês). Consegui criar laços e despedir-me deles com beijinhos, o que não é hábito naquele país.
No grupo com que viajámos, houve sempre um excelente ambiente. Consegui criar laços com as pessoas da minha idade, com as crianças mais pequenas, com os adolescentes e com os adultos. Passámos uma semana juntos e também senti que estava em família.
Relativamente ao encontro, participei especialmente em dois momentos: o Festival das Famílias no sábado e a Missa com a Papa no domingo. No sábado, o festival foi num estádio enorme e cheio de pessoas. O tempo ameno ajudou a proporcionar um ambiente fantástico. Fiquei feliz porque vi o Papa de muito perto. No domingo, vi-o outra vez. Apesar do temporal, fiquei espantada com a quantidade de pessoas e o tamanho do parque onde decorreu a Missa. Tivemos que andar vários quilómetros a pé, foi muito cansativo, mas valeu a pena.
Agora, de regresso à vida normal, já tenho saudades desta viagem e de todas as pessoas. Quero divulgar na minha escola a experiência que tive, para que em 2021, em Roma, mais famílias portuguesas possam participar.
Leonor Domingues, 10 anos
Agradecimento com Nossa Senhora de Fátima
Caros padres Declan, Robert e Kevin, caras famílias de acolhimento, cara paróquia de Navan, “A Alegria do Amor” (“The Joy of Love” foi o título do Encontro) trouxe 40 pessoas de Fátima até Navan. Um país novo, uma língua diferente, uma cultura desconhecida. Ao chegar, encontrámos uma comunidade cristã movida pela fé, de braços e corações abertos para nos receber. Isto é “A Alegria do Amor!”
Durante a semana, as famílias portuguesas foram sendo constantemente “mimadas” por gestos simples e belos por parte das famílias de acolhimento. O pequeno-almoço preparado ainda de madrugada, as conversas à volta da mesa a acompanhar uma boa chávena de chá, um passeio pelas redondezas, entre muitas outras coisas. Isto é “A Alegria do Amor!”
Aprendemos muitas cosias nos três dias de Congresso e foi um privilégio ter vivido a alegria e a beleza do Festival das Famílias, sábado à noite. Ontem (domingo) sentimos o que significa ser parte de uma Igreja universal, unida à volta do Papa Francisco, a celebrar a Eucaristia. Isto é “A Alegria do Amor!”
Mas a verdadeira e mais significativa “Alegria do Amor” que vamos levar connosco para Portugal é cada um de vós, esta comunidade e as suas famílias, tudo aquilo que nos deram e permitiram viver.
Queremos agradecer-vos. Por isso, trouxemos uma Senhora connosco. É uma Senhora muito especial, porque é Mãe. É uma Mãe que é peregrina, pois deseja estar sempre próxima de todos os seus filhos, a quem muito ama. Em sinal de reconhecimento por tudo o que recebemos, deixamo-vos uma réplica da imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima. Que ela vos proteja a todos. Muito obrigado, Navan!
Texto lido na Missa de despedida, em Navan
Desafios para a pastoral familiar na Diocese
A representação da Diocese de Leiria-Fátima no Encontro Mundial de Famílias *(ver reportagem nas páginas centrais)* deixa-nos vários desafios pastorais. De facto, a participação de 40 pessoas, originárias de 11 famílias, precisa de ir além de uma bela experiência vivida durante oito dias em Dublin.
Em primeiro lugar, fica o desafio de promover atividades que envolvam a família toda, pais e filhos, de modo que eles possam experimentar ser família em contextos e ambientes diferentes, os incentive a reforçar os laços da sua união e lhes permitam recuperar forças para as exigências do dia a dia.
Em segundo lugar, este encontro ajudou-nos a perceber mais uma vez o papel fundamental da família na construção de uma sociedade mais justa, fraterna e solidária, onde quem verdadeiramente conta são as pessoas. É na família que nos tornamos pessoas, é aí que experimentamos as mais importantes vivências da nossa história e nos são dadas as ferramentas indispensáveis para nos tornarmos construtores de um mundo melhor.
Em terceiro lugar, viemos com a consciência de que a Pastoral Familiar não pode continuar a ser o parente pobre na orgânica das nossas comunidades. Sendo a Igreja uma família de famílias, como afirmou o Papa Francisco, devemos dar passos significativos para que a pastoral diocesana e paroquial tenha cada vez mais em conta a riqueza que são as Igrejas domésticas.
Por último, fica um sublinhado particular para dois campos específicos da Pastoral Familiar: o primeiro é a preparação para o Matrimónio, que precisa de ser melhorada e encarada pelas comunidades cristãs como responsabilidade sua; em segundo lugar, as famílias em situação de crise, rutura ou a viver em segunda união necessitam do nosso esforço e empenho, para que nunca lhes faltem as mãos de que necessitam para se reerguerem e cumprirem a missão a que Deus as chama.
P. José Augusto Rodrigues