Ao raiar do sol, na manhã domingueira de 17 de maio, a Marinha Grande começa a registar um movimento fora do usual. Convergindo para o Parque da Cerca, centenas de viaturas parecem procurar o destino das praias, natural para o calor que já se adivinhava para este dia. Mas não, o estacionamento faz-se mesmo ali, esgotando rapidamente nas redondezas do parque. Era a grande Festa das Famílias, organizada pela diocese de Leiria-Fátima como culminar de dois anos dedicados a este tema pastoral.
Multidão de adolescentes à procura da família
A maioria dos madrugadores são adolescentes, entre os 14 e os 16 anos, frequentadores do 7.º ao 10.º ano de catequese. Vindos de 40 das 75 paróquias da Diocese, são ao todo cerca de 1.270 os que participam no ENDIAD – Encontro Diocesano de Adolescentes, acompanhados por 250 catequistas e animadores. O tema “G’anda Família” diz o principal do que se vai passar.
Feito o registo dos 159 grupos, pelas 10h00, é o Bispo diocesano, D. António Marto, quem dá as boas-vindas a todos: “É uma alegria ver-vos aqui”. Como o dia soalheiro, o sorriso do Pastor aponta o ambiente de festa que deseja para esta jornada e sublinha que “a alegria e a beleza da família” é um valor humano, mas também cristão, que é preciso celebrar. Porque, “apesar das notícias destacarem os maus exemplos, a maioria das crianças, jovens e adultos das nossas famílias são bons e belos, como prova a vossa presença numerosa neste parque”.
Uma cena no palco, pelo TASE – Teatro de Animação de Santa Eufémia, dá o mote para a atividade. Jesus, pelos seus 12 anos, foi em peregrinação ao templo de Jerusalém com a família. Na confusão das multidões, perdeu-se por lá e só ao fim de três dias os pais O encontraram. Estava à conversa com os doutores da lei, a aprender e a surpreendê-los com a sua sabedoria.
Como Jesus, também estes adolescentes iriam “perder-se” entre a multidão, à procura da família, ou melhor, dos problemas e dificuldades, dos valores e riquezas, das respostas a dar para a construção de famílias felizes. Pelo parque, dez “doutores da lei” – campos de jogos temáticos – estavam à sua espera, organizados pelas nove vigararias e pelo Departamento Diocesano de Pastoral Familiar. Em cada um, o convite à experiência e à descoberta de saber, para responder à questão “o que vivi e aprendi”.
Mas Jesus encontrou a família e voltou com ela para casa, em Nazaré, continuando o seu crescimento em “estatura, sabedoria e graça”. Também aqui, o almoço foi o momento de encontro e convívio com a família, com muitos pais e irmãos a juntarem-se à festa. A tarde seria para um jogo de pistas pela cidade vidreira, à procura de respostas sobre como crescer em todas as vertentes da vida humana e espiritual, como Jesus.
Multidão de famílias à procura de Deus
Não foram só os adolescentes que madrugaram. Desde os primeiros raios do sol escaldante, crianças, pais, avós foram enchendo o coração da Marinha Grande. Talvez pelo calor, não foram mais de duas dezenas os que optaram pelo passeio de bicicleta, enquanto uma centena assistia ao filme “Um sonho possível”, no fresquinho do Teatro Stephens. Muitos mais eram os que aproveitavam, no mesmo edifício, para a visita gratuita ao Museu do Vidro, ou passeavam pelos jardins da cidade. Com o aproximar do meio-dia, a tarefa comum foi encontrar uma sombra onde estender a manta, que o clima não estava convidativo a aproveitar as mesas no centro do parque.
Enquanto os mais novos “cresciam em estatura, sabedoria e graça” no jogo da tarde, foi a vez dos restantes irem aos “doutores da lei” espalhados pelo parque, testar os seus conhecimentos e vivências familiares. Até que chegou o ponto alto do dia, a celebração eucarística, onde se terá registado a maior multidão, calculada em cerca de 4.000 pessoas.
“Todos nós somos a festa, vós é que fizestes a festa”, repetiu o Bispo diocesano na homilia, com emocionada alegria. E também Jesus, cuja ascensão ao céu era relatada no Evangelho deste domingo: “Ele não fica separado de nós, permanece no seu amor, na sua Palavra, acompanha-nos no caminho, levanta-nos quando caímos, está também como convidado de honra nesta festa!”.
Durante o dia, todos procuraram respostas para a felicidade da vida em família. D. António Marto resumiu a solução: “O amor é o segredo; se falta o amor, falta a alegria, falta a festa. E Jesus é a fonte inesgotável do amor que alimenta o nosso viver humano”. Nessa linha, “a família mais bela é a que sabe comunicar a beleza e a riqueza do amor de Cristo no quotidiano, no concreto da vida”.
E porque não há “famílias perfeitas”, temos todos o “imperativo de cuidar delas”, pois isso é “cuidar do futuro”, tal como é imperativo “testemunhar e levar a todos o Evangelho da família feliz”.
Na celebração participaram e renovaram os seus votos os casais, religiosos e padres jubilários (ver abaixo). A eles, o Bispo diocesano agradeceu o testemunho de fidelidade à vocação, sublinhando a importância desse exemplo para os mais novos se abrirem sem medo ao chamamento de Deus, cada um conforme a sua vocação, pois “é belo constituir família, é belo ser padre, é belo ser irmã ou irmão consagrado”.
E como em qualquer festa, não faltou o bolo. Mais precisamente, 50 quilos de pão-de-ló oferecidos por padarias e pastelarias de toda a Diocese, que serviram para uma despedida doce daquele final de tarde quente.
Jubileu das Vocações
Uma das iniciativas que integrou a Festa das Famílias foi o Jubileu das Vocações, para o qual o Bispo diocesano tem convidado, anualmente, os casais, religiosos e padres que celebram os 25, 50 e 60 anos de matrimónio, consagração ou sacerdócio. Este ano, de 19 paróquias, vieram 40 casais, 6 religiosas, duas consagradas seculares e 3 padres diocesanos. Um dos casais e uma das religiosas, a celebrarem os 75 anos de vocação!
Um momento de “alegria e partilha de vida rica”, como considerou D. António Marto, na abertura da sessão, no Teatro Stephens, ao início da tarde. Cada vocação é chamamento e dom de Deus e é na sua diversidade que se manifesta a “beleza da Igreja”, pelo que os parabéns aos jubilários são também os “parabéns a Deus”. Os testemunhos que se seguiram manifestaram isso mesmo: a diversidade de respostas e o factor comum de gratidão a Deus pelos dons recebidos.
Elisa e João casaram há 50 anos. Recordam ainda vivamente o momento em que se conheceram e se enamoraram. A fé em comum ajudou a consolidar o amor e é um dos segredos para a felicidade que se manteve durante meio século. “Conversamos regularmente sobre o que gostamos e não gostamos em nós e rezamos juntos”, referiu o casal de “eternos namorados” que se afirma “alegre e feliz na ternura dos 70”.
Também a irmã Maria da Trindade Machado, a consagrada secular Maria José Carvalho e o padre Augusto Gonçalves testemunharam a importância da fé vivida em família, desde a infância, como um dos factores que contribuíram para a decisão de dizerem “sim” ao chamamento de Deus. E, claro, a certeza de que “é Deus que chama e que nos prende”, para poderem afirmar-se “felizes” hoje, após todos estes anos de fidelidade a essa vocação, na diversidade de serviços que têm prestado à sua Igreja e na sociedade.
Receção ao Bispo na Câmara
À margem do programa, o Município da Marinha Grande ofereceu uma receção ao Bispo diocesano, nos Paços do Concelho, ao início da manhã.
Álvaro Pereira, presidente da autarquia, manifestou o seu contentamento pela escolha do local para a Festa das Famílias, acolhendo-a “de braços abertos”. Apontando o dedo a diversas “políticas contra as famílias, que não ajudam a construir uma sociedade saudável”, o autarca reconheceu o papel da Igreja, nomeadamente, pela ação das suas paróquias e instituições de solidariedade social – que convidou para a sessão. “Sem essa ajuda, muitas realidades seriam bem mais dramáticas”, enfatizou, defendendo a “união de todos na defesa das famílias, independentemente das motivações, das cores políticas ou das crenças religiosas”.
Também D. António Marto lembrou que “a família é um bem público para toda a sociedade” e “demonstrou isso mesmo na solidariedade inter-familiar e inter-geracional no contexto de crise que vivemos”. Referindo que “se a família dá tanto à sociedade, também esta lhe é devedora, como primeira escola de humanidade, de virtudes sociais e de fraternidade que é”, terminou a concordar com o anfitrião da edilidade: “dêmos as mãos na defesa das famílias, para garantia de uma sociedade mais justa, humana e bela”.
No final, Álvaro Pereira ofereceu a D. António duas belas peças feitas do vidro da sua cidade, um cálice e uma taça. O Bispo agradeceu e garantiu que seriam estreadas na Missa dessa tarde. E foram.