TER OU NÃO TER CARIDADE

Penso que ninguém me levará a mal que tome como ponto de partida para as minhas reflexões, na manhã de um dia em que me inunda a gratidão, pelos dons que recebi de Deus, desde o seio materno, e quantos me ajudaram a valorizá-los, ninguém me levará mal que tome como ponto de partida um texto da pessoa que directa e indirectamente, marcou tão profundamente a minha vida espiritual.

Infelizmente, também o castelhano se empobreceu quanto à língua, tornando-a incapaz de traduzir a profundidade do texto de São Paulo (1 Cor 13, 1-13) que São Josemaria tem em mente e constitui a primeira leitura da missa desta quarta-feira.

Mas as palavras do santo Fundador do Opus Dei são suficientemente claras para nos darmos conta de que traduzir o latim “charitas”/ grego “charis”, por amor, ainda que não seja de todo incorrecto, dado o uso que hoje se dá à palavra “amor”, pode induzir as pessoas num erro muito grave, que não se corrige apenas evitando a palavra “caridade”, como fazem alguns tradutores.

Aí está o meu texto de apoio:

“O nosso amor não se confunde com uma atitude sentimental, nem com a simples camaradagem, nem com o afã pouco claro de ajudar os outros para demonstrarmos a nós mesmos que somos superiores. O nosso amor exprime-se em conviver com o próximo, em venerar – insisto – a imagem de Deus que há em cada homem, procurando que também ele a contemple, para que saiba dirigir-se a Cristo”. (Texto que pertence ao capítulo ‘Com a força do amor’ do livro ‘Amigos de Deus’ de Josemaria Escrivá de Balaguer [nº 230]).

Na minha interpretação de um texto que tem alimentado a vida espiritual e apostólica de muitas centenas de milhar, se não milhões de pessoas de ambos os sexos, jovens e menos jovens, casados e solteiros, sacerdotes e leigos, trabalhadores de todas as categorias profissionais… a minha interpretação diz-me que o amor, que continua e bem a apresentar-se como a essência do cristianismo, é algo que se recebe, que não se tem senão como dom de Deus, eu diria, será o próprio Deus, ou o seu Amor em nós.

O texto de São Paulo, tão citado nas últimas décadas, obrigando muitas vezes o Apóstolo a dizer o que ele não poderia nuca ter dito, só não é mais claro, porque as nossas línguas perderam o vocabulário adequado a uma tradução correcta.

Afinal, o texto não fala de ser, mas de ter: “agape”, que normalmente, em latim, se traduz por “dilectio”, de “diligere” e não “amor”, de “amare”.

Assim se entende que o Apóstolo possa dizer, sem atenuantes:

“Ainda que distribua todos os meus bens aos famintos e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver caridade, de nada me aproveita”.

Ao ver, não apenas a desatenção, mas, muito pior ainda, as caricaturas que, nas últimas décadas se foram divulgando sobre o tema da caridade e do amor, sinto como é actual e premente o que, depois de tantos santos, ao longo da história, diz São Josemaria:

“O nosso amor exprime-se em conviver com o próximo, em venerar – insisto – a imagem de Deus que há em cada homem, procurando que também ele a contemple, para que saiba dirigir-se a Cristo”.

Não. Não é tão fácil como poderia pensar-se: porque não se trata de camaradagem ou amizade de tempos livres, para aproveitar o gozo das instâncias de férias.

Conviver com o próximo, porque se ama a Deus, cuja imagem está impressa em cada um, a pedir a nossa veneração; de modo que também ele a descubra e através do seu respeito, se aperceba do que faz dele outro Cristo.

“Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos. se não tiver caridade, sou como bronze que ressoa ou como címbalo que retine”.

Poliglotas de todos os sectores da cultura, especialistas de futurologia, topamos com eles em cada canto das nossas praças, na primeira página dos jornais que se exibem despudoradamente nas nossas bancas, ao percorrer os canais das nossas televisões…

Como foi grande a lucidez do Apóstolo que denunciou tudo isto, porque o viu já a germinar e crescer como ameaça, no seio das comunidades cristãs!

Real e inconfundível modelo de caridade, é a daquele galileu, a caminho de Jerusalém, que, cansado da viagem, espera com respeito a mulher explorada, que vem, pelo calor, procurar água ao poço da longínqua lembrança do verdadeiro Israel, ultrajado e sumido nas guerras da fome de poder.

Por isso me atrevo a terminar com um belíssimo texto de Santo Agostinho, outro dos meus guias na vida espiritual. Comenta, o santo bispo de Hipona, a frase do Evangelho de João 4, 6, que nos informa de que Jesus, à volta do meio dia, cansado do caminho se sentou â beira do poço:

“Queres ver quão forte é este Filho de Deus? Por Ele foram feitas todas as coisas e nada se fez sem Ele; e sem esforço foram feitas. Que há de mais forte que aquele por quem sem esforço tudo foi feito?

Queres conhecer o fraco? O Verbo fez-se carne e habitou entre nós.

A força de Cristo criou-te; a fraqueza de Cristo recriou-te.

A força de Cristo fez que o que não existia existisse; a fraqueza de Cristo fez com que que que existia não perecesse.

Construiu-nos com o seu poder; procurou-nos com a sua fraqueza” (In Ev Io 15,6).

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