Observei numa obra recente a gravação de uma ferradura. Há, ainda hoje, entre nós quem a use em obras, carros, na casa e outros sítios, crendo ser “proteção contra as desgraças” e sinal que “traz boa sorte”. Como este, há vários objetos que a crendice popular julga poder defender do azar e dar sorte na vida: figa, corno, trevo… Outros são vistos como portadores de má sorte ou azar: gato preto, passar por baixo de uma escada, o número 13, a sexta-feira dia 13, sapo morto… São superstições que enganam e tornam prisioneiro quem as deixa entrar na sua mente. Algumas delas provocam muito sofrimento, medo e angústia. Outras, pura e simplesmente iludem quem confia nelas.
O dicionário define a superstição como a “crença ou noção sem base na razão ou no conhecimento, que leva a criar falsas obrigações, a temer coisas inócuas, a depositar confiança em coisas absurdas”; ou ainda a“crença em presságios e sinais, originada por acontecimentos ou coincidências fortuitos”. Trata-se de crendices, pois não têm base na razão humana nem na verdadeira fé. São usadas na tentativa de obter uma certa confiança e segurança, mas não passam de falsas e perigosas ilusões. Há quem diga não acreditar nisso, mas na realidade tem medo que essas coisas tenham realmente algum efeito.
As crendices são incompatíveis com a fé cristã, pois põem em causa a confiança em Deus e no seu poder sobre o mundo e a vida humana. O “Youcat, catecismo jovem da Igreja Católica” entende a superstição como “a admissão irracional de que determinadas palavras, ações, acontecimentos e objetos, contêm em si forças mágicas ou as desenvolvem a partir de si mesmos”. Ser supersticioso significa então temer e viver condicionado ou até prisioneiro da influência desse tipo de coisas, em vez de “crer no poder, na orientação e na bênção de Deus” (n. 355). De facto, Ele é quem governa o mundo e orienta tudo para o bem, para o nosso bem, como ensina S. Paulo: “Tudo contribui para o bem dos que amam a Deus” (Rm 8, 28). Depois, pergunta: “Se Deus está por nós, quem pode estar contra nós?”(Rm 8, 31). Por fim, afirma e testemunha: “Estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem a altura, nem o abismo, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus que está em Cristo Jesus, Senhor nosso” (Rm 8, 38-39). Esta é a verdadeira fé em Deus, que nos defende de qualquer crendice ou superstição.
É certo que a fé pode também perverter-se e algumas manifestações perderem o verdadeiro sentido e orientação para Deus. Por isso, o Catecismo da Igreja Católica ensina e adverte: “A superstição é um desvio do sentimento religioso e das práticas que ele impõe. Também pode afetar o culto que prestamos ao verdadeiro Deus: por exemplo, quando atribuímos uma importância de algum modo mágica a certas práticas, aliás legítimas ou necessárias. Atribuir só à materialidade das orações ou aos sinais sacramentais a respetiva eficácia, independentemente das disposições interiores que exigem, é cair na superstição” (n. 2111). E ainda: “A superstição é um desvio do culto que prestamos ao verdadeiro Deus. Manifesta-se na idolatria, bem como nas diferentes formas de adivinhação e magia.” (n. 2138). A superstição é assim um ato contra o primeiro mandamento de Deus, que diz. “Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua mente” (Mt 22,37) ou “…com todas as tuas forças” (Lc 10,27).
O conhecimento de Deus e da sua Palavra, a formação catequética estudando o Catecismo da Igreja Católica ou outros, o cuidado e crescimento da vida espiritual, a participação “ativa, consciente e frutuosa” nas celebrações litúrgicas da própria comunidade cristã e o convívio, diálogo e partilha com outros irmãos na fé, são meios para viver uma fé firme e enfrentar com confiança, fortaleza e esperança as múltiplas vicissitudes da vida. Na verdade, quanto menos uma pessoa conhece e vive a verdadeira fé cristã mais fica sujeita ao pavor de superstições e ao domínio de crendices. Devemos livrar-nos dessas coisas, vivendo sem medo do azar nem iludidos com a sorte. A nossa vida em nada depende disso. “Estais enganados, porque desconheceis as Escrituras e o poder de Deus”, dizia Jesus (Mt 22,29). A fé leva-nos a confiar em Deus e a invocar a sua bênção, graça e proteção em todas as circunstâncias.