Homilia da Missa Crismal 2017
Nossa Senhora, Mãe dos Sacerdotes
† António Marto
Catedral de Leiria
Missa Crismal, 13 de abril de 2017
Refª: CE2017B-003
É belo e rico este momento que hoje, nesta Quinta feira santa, nos reúne à volta do altar do Senhor como Igreja com o seu presbitério e o seu bispo, para dar graças pelo dom do sacerdócio ministerial e pelos jubileus de ordenação sacerdotal de alguns presbíteros. Desde já quero saudar todos os presentes (presbitério, consagrados, seminaristas, demais fiéis) e exprimir a minha viva congratulação com os jubilários.
Celebramos este dia do sacerdócio no contexto do biénio pastoral dedicado a Maria, Mãe de Ternura e de Misericórdia, e no centenário das Aparições. Desejaria por isso falar-vos da relação entre Nossa Senhora, o sacerdócio e os sacerdotes. De facto, embora a título diverso, tanto Maria como os sacerdotes participam, de maneira específica e autêntica, da unção e da missão de Cristo proclamadas no evangelho: “O Espírito do Senhor está sobre mim porque ele me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres. Ele me enviou a proclamar a redenção aos cativos…”
A Senhora do “sim” sem reservas no mistério da Incarnação
A relação de Maria ao sacerdócio de Cristo está profundamente enraizada no mistério da Incarnação. Quando Deus decidiu fazer-se homem no seu Filho, tinha necessidade do “sim” livre de uma criatura que Ele mesmo escolhera e interpelara. São Bernardo de Claraval, numa das suas homilias, explica de modo dramático este momento decisivo da história em que a terra e o próprio Deus esperam o que dirá esta criatura.
O “sim” de Maria é, pois, a porta através da qual o Filho de Deus pôde entrar no mundo, fazer-se homem para realizar a obra da redenção na sua doação inteira de amor para a vida do mundo. Assim sacrifício (de entrega), sacerdócio e Incarnação estão unidos e Maria está no centro deste mistério com o seu sim. Ela abraçou com todo o coração a vontade salvífica de Deus e consagrou-se totalmente, sem reservas, como serva e servidora do Senhor, à pessoa e à obra do Filho. De ora em diante, a existência de Maria muda radicalmente ao ficar vinculada à do Filho.
A contemplação e a relação pessoal com Maria ensinam-nos a dizer um sim unido ao seu sim, sem reservas nem sombras, à vontade do Senhor. Assim seremos servos e servidores humildes e fiéis do projeto de salvação e a consagramo-nos, com todas as energias, à pessoa e obra redentora do seu Filho, na dedicação ao cuidado pastoral dos irmãos e na realização da missão da Igreja no mundo.
A Mãe junto à Cruz
Vamos agora até à Cruz. Aí Maria “associou-se com ânimo materno à entrega de Cristo” (LG): uniu-se e uniu o próprio sofrimento materno à oferta sacerdotal de Cristo pela redenção de todos.
Jesus vê a Mãe junto à Cruz e vê também o discípulo amado que é uma prefiguração de todos os discípulos amados e, de modo particular, dos apóstolos e dos sacerdotes. Precisamente, nesta ocasião, Jesus deixa em testamento um dom precioso: “Mulher, eis o teu filho”! – confia o discípulo à solicitude do amor materno de Maria. Mas diz também ao discípulo: “Eis a tua mãe”! O evangelho acrescenta que, desde aquela hora, o discípulo predileto acolheu a mãe Maria como sua, isto é, acolheu-a na profundidade do seu ser, no dinamismo de toda a sua existência, no horizonte do próprio apostolado. Não se trata, pois, de algo meramente exterior.
Aqui podemos ver a particular relação de maternidade entre Maria e os presbíteros e compreender como essa relação é o motivo fundamental da predileção que Ela tem por cada um. Sim, Nossa Senhora tem uma predileção pelos sacerdotes porque também eles, como Ela, estão consagrados para a missão de proclamar, testemunhar e dar Cristo ao mundo. Cada sacerdote pode e deve sentir-se filho predileto desta bendita, humilde e santa Mãe!
Unidos a Maria junto à cruz e seus filhos, saberemos imitá-la na compaixão e no cuidado por quem sofre, pelos doentes, os pobres, os idosos e todos os abandonados. Tendo-a como mãe de misericórdia, saímos ao encontro dos crucificados para lhes darmos conforto e esperança, especialmente mediante a visita, a oração e os sacramentos.
Maria no Pentecostes da Igreja nascente
Maria também acompanhou maternalmente os primeiros passos da Igreja nascente. Estava presente no cenáculo em oração quando os discípulos receberam o Espírito Santo no Pentecostes. A sua presença aí lembra-nos que é o Espírito Santo a construir a Igreja, a guiar os discípulos e a infundir a caridade pastoral. Ela ajuda-nos a contemplar a beleza da comunhão e da missão da Igreja, a beleza da fraternidade sacerdotal, de ser padres não isoladamente, cada um por si só, mas unidos na diversidade dos dons e das personalidades para enriquecimento mútuo e de todo o povo de Deus. Peçamos à Mãe da Igreja que nos obtenha uma renovada efusão do Espírito Santo que acenda e reavive em nós o amor à nossa Igreja diocesana, a ousadia e a criatividade apostólica, o ardor missionário.
O santo Cura d’Ars gostava de repetir: “Jesus Cristo, depois de nos ter dado tudo o que nos podia dar, quer ainda fazer-nos herdeiros de quanto tem de mais precioso, isto é, a sua Santa Mãe”. Isto vale para cada cristão, mas de modo especial para os sacerdotes.
O Concílio Vaticano II convida os sacerdotes a olhar para Maria como o modelo perfeito da própria existência e a “venerá-la e amá-la com devoção e culto filial” (PO 18).
Acolhamo-la na nossa vida e no nosso apostolado como mãe e mestra. “Na escola de Maria podemos entender com o coração aquilo que nem os olhos nem a mente conseguem por si sós perceber ou conter” (Bento XVI).
Durante o biénio pastoral dedicado a Nossa Senhora e, particularmente, na visita da sua imagem peregrina e nas peregrinações vicariais a Fátima, o nosso povo deu-nos provas –até com alguma surpresa – de que o coração da Mãe continua a falar ao coração dos filhos, a tocá-lo no íntimo, a mostrar-se caminho que conduz até Deus e ajuda a descobrir o mistério de Deus no mundo, na história e na vida diária de cada um e de todos. Por isso, o Papa Francisco nos fala de “um estilo mariano na atividade evangelizadora da Igreja” (EG 288): “nesta imagem materna, o povo lê todos os mistérios do Evangelho” (EG 285).
Como Maria, nas suas aparições em Fátima, desceu até à humanidade atormentada pela guerra e ferida pelo pecado para trazer graça, misericórdia e paz, assim nós, sacerdotes, sejamos seus imitadores levando a todos a luz, o conforto, a esperança e a alegria do Evangelho.