“Abre-te” à Vida Nova
Lectio Divina para o Domingo XXIII do Tempo Comum (Ano B), 5.09.2021
Breve introdução
Neste XXIII Domingo do Tempo Comum, o evangelista S. Marcos convida a fazermo-nos companheiros de Jesus na cura de “um surdo que mal podia falar”. Vamos com Ele para além do território de Israel, para além do mar da Galileia, atravessando o território da Decápole, território helenista, de cultura grega.
O agir de Deus, em Cristo, nunca se delimita a um espaço físico específico, vai sempre para além das fronteiras tidas como razoáveis para a Sua ação. Se Jesus abre um caminho novo para além das fronteiras, a palavra que diz ao “surdo que mal podia falar” só pode ser: “abre-te”.
Também hoje, Ele toca a nossa humanidade com gestos e palavras, com os sacramentos e o Evangelho, que nos comunicam, alimentam e fortificam a vida, que é dom seu para quem a acolhe na fé.
1. Invocação
Jesus Cristo,
Tu que és o Caminho e vens ao nosso encontro,
abre-nos a mente e o coração para entendermos a Tua vontade
e nos abrimos à vida nova em Ti.
Ámen.
2. Escuta da Palavra de Deus
2.1. Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos (Mc 7, 31-37)
Naquele tempo,
Jesus deixou de novo a região de Tiro
e, passando por Sidónia, veio para o mar da Galileia,
atravessando o território da Decápole.
Trouxeram-Lhe então um surdo que mal podia falar
e suplicaram-Lhe que impusesse as mãos sobre ele.
Jesus, afastando-Se com ele da multidão,
meteu-lhe os dedos nos ouvidos
e com saliva tocou-lhe a língua.
Depois, erguendo os olhos ao Céu,
Suspirou e disse-lhe:
«Efatá», que quer dizer «Abre-te».
Imediatamente se abriram os ouvidos do homem,
soltou-se-lhe a prisão da língua
e começou a falar corretamente.
Jesus recomendou que não contassem nada a ninguém.
Mas, quanto mais lho recomendava,
tanto mais intensamente eles o apregoavam.
Cheios de assombro, diziam:
«Tudo o que faz é admirável:
Faz que os surdos oiçam e que os mudos falem».
Palavra da salvação.
(momento de silêncio para interiorizar a Palavra)
2.2. Breve comentário
Se prestarmos atenção, percebemos que Jesus fez um longo percurso desde a região de Tiro, passando por Sidónia, mar da Galileia e, por fim, atravessando a Decápole. Jesus não poupa esforços na sua missão para que o Reino de Seu Pai se manifeste. É a universalidade do Reino de Deus a acontecer para todos. “A fé em Nosso Senhor Jesus Cristo não deve admitir acepção de pessoas” (2ª leitura). Não há limites ao amor de Deus, nem a distância é entrave. Por amor todas as distâncias se encurtam.
É aí mesmo, em território considerado estrangeiro, que trazem a Jesus “um surdo que mal podia falar”. Estes homens que trazem o surdo até Jesus, reconhecem que Ele pode curá-lo. Rapidamente, este gesto de humildade se esvai numa súplica que se torna num manual de instruções de como fazer um milagre com sucesso: impor as mãos sobre ele. Porém, como se pode ver, Jesus faz de forma diferente.
Também na Eucaristia, muitas são as pessoas que apresentamos a Jesus, quer falecidas, quer doentes, ou em outra situação de vida. Muitas vezes, o que pedimos para elas é que seja feito à nossa maneira, tal como pedimos e não que se faça a vontade de Deus, para Sua maior glória. Mas o que devemos fazer é simplesmente apresentá-las diante de Jesus Cristo.
Fica bem patente que a dinâmica do Reino de Deus a acontecer faz-se no silêncio, no escondimento onde o bem opera e se vai revelando e crescendo. A dinâmica do Reino de Deus não é o espetáculo e o entretenimento como se fosse um programa de talentos em horário nobre de televisão. Por isso, Jesus “afasta-se com ele da multidão” e é aí na proximidade e intimidade com ele, no Tu a tu, que Jesus lhe mete os dedos nos ouvidos e com a saliva lhe toca a língua. A divindade e humanidade de Cristo a tocar a nossa humanidade, a nossa condição corpórea, para a dignificar e a colocar no caminho da graça divina. Quando Cristo toca os nossos sentidos, então, vemos, ouvimos, degustamos, cheiramos, tocamos a Vida Nova. O toque de Jesus nas nossas vidas muda tudo. Ele abre-nos a uma vida nova.
O fazer de Jesus é sempre em sintonia com o Pai (“erguendo os olhos ao Céu”) e na força do Espírito Santo (“suspirou”) e assim, diz ao surdo: “Abre-te”. Um novo dizer para uma nova vida, uma vida aberta e recetiva ao dom. Também a cada um de nós, nos diz Jesus: Abre-te à Vida Nova, abre-te à vida do dom. Uma vida fechada em si mesma não vive, no limite sobrevive até definhar. Uma vida que se abre ao dom, cresce, engrandece e agradece.
Neste fazer de Jesus concretiza-se a realização das promessas contidas em Isaías: “Então se desimpedirão os ouvidos dos surdos… e a língua do mudo cantará de alegria” (1ª leitura). Quem consegue calar tão grande abundância de Vida Nova?
3. Silêncio meditativo e diálogo
Trouxeram-Lhe então um surdo que mal podia falar e suplicaram-Lhe que impusesse as mãos sobre ele.
Estamos perante um gesto solidário e uma súplica a Jesus por alguém em necessidade. Que pessoas apresento ao Senhor? Falo dos meus irmãos a Jesus Cristo? O que Lhe peço? Como Lhe peço?
Jesus afastando-se com ele da multidão… Depois, erguendo os olhos ao Céu, suspirou e disse-lhe: «Efatá», que quer dizer «Abre-te».
Jesus não faz milagres para dar nas vistas. Ora ao Pai e toca o corpo humano para manifestar o poder misericordioso de Deus que salva. Também eu me apresento diante de Jesus Cristo? Deixo-me conduzir por Ele? No silêncio e na intimidade, deixo que Jesus toque as minhas feridas? Deixo que Ele me abra à vida nova?
Cheios de assombro, diziam: «Tudo o que faz é admirável».
O milagre deixa as pessoas maravilhadas e leva-as a contar o que viram. Reconheço a ação de Jesus Cristo na minha vida e na vida dos outros? Alegro-me, dou graças a Deus e conto a minha experiência? Surpreendo-me com a novidade de Cristo em cada dia?
4. Gesto e oração final
– Como propósito durante a semana tirar 15 minutos e rezar uma ou mais situações em que reconheço a ação de Cristo na minha vida ou na vida dos outros.
– Na Eucaristia, levar pessoas a Jesus, com nomes e rostos concretos, para que os Senhor as toque com a vida nova no Espírito.
Termino com a oração seguinte:
“Senhor Jesus,
Dá-nos a capacidade de podermos ver a Tua ação
em cada irmão, em cada pessoa,
mesmo que aparentemente distantes de Ti.
Que o nosso entendimento nunca aprisione
o nosso olhar e o nosso coração para ver a Tua misericórdia a agir.
Dá-nos um olhar grato pelo bem que fazes na vida dos irmãos”.
– Pai Nosso.