Homilia da Ordenação Sacerdotal de Fábio Bernardino

 

Homilia da Ordenação Sacerdotal de Fábio Bernardino

 

 

Pastores segundo o coração de Cristo, Bom Pastor

† António Marto

Catedral de Leiria

11 de maio de 2014

Refª: CE2014B-003

Seguindo uma bela tradição da nossa diocese, no domingo do Bom Pastor encontramo-nos todos reunidos na catedral –  bispo,  presbitério e  povo fiel de Deus – para a ordenação de um novo sacerdote. É sempre um grande dom de Deus, graça sua, tão apreciada por nós hoje, após dois anos sem uma ordenação. Por isso é com um sentimento profundo de fé e de ação de graças que queremos viver esta celebração portadora de alegria e esperança para a nossa diocese.

Com o coração cheio de alegria apraz-me saudar todos vós aqui presentes e, com especial afeto, o caro Fábio, candidato ao presbiterado, juntamente com os seus pais, familiares e amigos, os superiores dos seminários, as comunidades paroquiais de origem ou de estágio pastoral.

O ícone de Cristo, o Pastor bom e belo

A liturgia deste domingo põe à nossa contemplação um dos ícones mais belos e sugestivos que, desde os primeiros séculos, representa o Senhor Jesus – o ícone do Bom Pastor – e que, ao mesmo tempo, ilumina a missão e a vida dos presbíteros enquanto pastores da comunidade cristã.

Desde logo, através desta imagem compreendemos que o Senhor ressuscitado não abandona o seu povo. Ele está connosco, a nosso lado. Não fazemos o caminho da vida solitariamente. Por isso, o primeiro anúncio da ressurreição feito por Pedro trespassou, comoveu, tocou intima e profundamente os corações dos ouvintes.(1ª leitura).

O Evangelista João traça o retrato do Pastor verdadeiro, bom e belo, em contraste com a figura do estranho, do mercenário ou do salteador. E carateriza-o pelo laço recíproco de ternura e familiaridade entre o pastor e as ovelhas: ele chama-as e elas reconhecem a sua voz e sentem-se reconhecidas; caminha à sua frente e elas seguem-no e sentem-se orientadas; defende-as e sentem-se protegidas; condu-las às verdadeiras pastagens “para que tenham vida e a tenham em abundância”.

“Ele chama cada uma delas pelo seu nome… e as ovelhas seguem-no porque conhecem a sua voz”. Não se trata de um conhecimento exterior, mas de uma relação pessoal profunda: um conhecimento do coração próprio de quem ama e de quem é amado; um conhecimento de amor em virtude do qual o Pastor convida os seus a confiar e a segui-lo e que se manifesta no dom da vida nova e eterna que lhes oferece.

Pastores segundo o coração de Cristo

O Senhor ressuscitado continua a cuidar do seu povo não através de um exército de infantaria ou cavalaria, mas através de novos pastores por ele  escolhidos e dados aos seu rebanho.

Mas só se pode ser pastor do rebanho de Jesus por meio d’Ele e em íntima comunhão com Ele. É isto que se exprime e realiza no sacramento da Ordem, a fim de que, através de nós, seja Ele que apascenta.

Caro ordinando, o sacramento da Ordem faz-te participante do amor de Cristo pelo seu povo, da sua própria missão: és chamado e enviado por Ele a espalhar a semente da sua Palavra que traz em si o reino de Deus; a oferecer a divina misericórdia que cura as feridas, que perdoa e liberta do pecado, oferece conforto e alívio à dor dos sofredores e feridos da vida; a alimentar os fiéis na mesa da comunhão do Corpo e Sangue do Senhor; a edificar a comunidade fraterna no seu amor e na sua paz que fazem a harmonia da diversidade.

Nas palavras  e nos gestos de Cristo Bom Pastor está traçado o estilo da nossa missão ou solicitude pastoral de ir ao encontro das pessoas, de conhecer e estar aberto às suas interrogações e necessidades. Não há um verdadeiro conhecimento sem amor, sem aceitação profunda do outro, sem relação pessoal. O pastor não pode contentar-se em saber os nomes e as datas. Há que conhecer as ovelhas com o coração, fazer sentir-lhes próximo o coração de Jesus, levá-las até Ele e criar uma verdadeira comunidade.

Para isso são precisos “pastores próximos das pessoas, pais e irmãos, mansos, pacientes e misericordiosos, com simplicidade e sobriedade de vida. Homens que não têm ‘psicologia de príncipes’. Homens capazes de velar pelo rebanho que lhes foi confiado e cuidando de tudo aquilo que o mantém unido: vigiar pelo seu povo, atentos a eventuais perigos que o ameacem, mas sobretudo para fazer crescer a esperança: que haja sol e luz nos corações! Homens capazes de sustentar com amor e paciência os passos de Deus no seu povo.

E o lugar do Pastor para estar com o seu povo é tríplice: ou à frente para indicar o caminho e sustentar a esperança; ou no meio, com a sua proximidade e misericórdia, para mantê-lo unido e prevenir os desvios; ou à retaguarda para ajudar os atrasados e evitar que nenhum fique para trás, mas também e fundamentalmente porque o próprio rebanho tem o seu olfato para encontrar novos caminhos”( Papa Francisco).

“Mesmo no silêncio da oração, o pastor que adora o Pai está no meio das ovelhas” porque as traz no coração com as suas alegrias e os seus sofrimentos e as confia ao Senhor. Mas a oração faz-nos sair de nós mesmos para estar próximo da vida das pessoas. Nunca podemos esquecer que o Senhor “quer servir-se de nós para chegar cada vez mais perto do seu povo amado”. Aqui está a beleza do sacerdócio e não na sede de protagonismo narcisista, na nostalgia da coleção de antiguidades de museu ou então na busca de novidades da última moda. Tudo isso é mundanismo espiritual. “Deus nos livre de uma Igreja mundana sob vestes espirituais ou pastorais”(EG 97).

Sacudir o clima de  indiferença e cuidar das vocações

Que coisa maior, mais entusiasmante do que cooperar com o Senhor como pastor do seu povo, para que não lhe faltem a Palavra da vida, os sacramentos da ternura e da misericórdia de Deus, a alegria do Evangelho que cura, aquece e transforma os corações e torna mais humano o nosso mundo?

Neste dia mundial de oração pelas vocações de consagração faço um apelo premente à diocese, a cada comunidade, às famílias cristãs, a cada um de nós para ter a ousadia de propor aos jovens e menos jovens o caminho de serviço a Deus e aos homens do nosso tempo, sacudindo porventura a sua indiferença.

“A vocação é um fruto que amadurece no terreno bem cultivado do amor aos outros que se faz serviço recíproco, no contexto de uma vida eclesial autêntica. Nenhuma vocação nasce por si, nem vive para si. A vocação brota do coração de Deus e germina na terra boa do povo fiel e na experiência do amor fraterno”(Mensagem para o Dia de Oração pelas vocações consagrada).

Caros irmãos, neste domingo do Bom Pastor peço-vos, por favor, que estejais próximos dos vossos sacerdotes com o afeto e a oração para que sejam sempre pastores segundo o coração de Deus. Invoquemos também o dom de uma primavera de vocações sacerdotais para a nossa diocese tão carenciada. Aos jovens presentes peço que cada um escute a voz do Senhor e se interrogue: Senhor, que queres de mim? Aonde me chamas? Aonde queres que eu vá? Que queres que faça da minha vida? E responda sem medo, com generosidade de alma e coração.

Confiemos, por fim, o nosso caro Fábio à proteção de Nossa Senhora para que ela o acompanhe e seja Mãe e Estrela do seu sacerdócio.

† António Marto, Bispo de Leiria-Fátima

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