Nas últimas semanas de janeiro, no Turcifal, decorreram dois turnos da formação permanente do clero de Leiria-Fátima, em que participaram 64 padres e o Bispo diocesano. O PRESENTE foi saber mais sobre esta proposta formativa e traz na edição desta semana (13.02.2014) aos seus leitores o testemunho de quem participou. A atualização de conhecimentos e o convívio fraterno são os aspetos mais sublinhados.
Podemos dizer que desde sempre os padres procuraram meios de atualizar a sua formação teológica e pastoral. Há muitas décadas, uma das propostas é organizada de forma sistemática e regular, no início de cada ano, procurando envolver todo o clero. “Desde que me lembro, sempre se realizou”, refere o padre Adelino Guarda, de 51 anos, ordenado há 25 e responsável pelo Serviço de Apoio ao Clero, que coordena esta formação permanente. “É um momento importante em cada ano, com o qual todos os padres já contam e a que só faltam por motivos de saúde ou de força maior”, adianta.
Já se chamou “reciclagem do clero” e realizou-se durante muito tempo no Seminário de Leiria ou em Fátima. Nos últimos anos, optou-se pela deslocação para longe da Diocese, “para permitir uma dedicação exclusiva dos participantes”, acrescenta o padre Adelino Guarda, explicando que “os dois turnos servem precisamente para possibilitar a ida de todos, ficando uns a assegurar o trabalho nas respetivas vigararias enquanto os outros estão ausentes”.
“Aprender até morrer”
“Este é um momento fundamental para a formação teológica e, sobretudo, para retomar, aprofundar e tornar operacional o tema pastoral do ano”, refere D. António Marto, que faz questão de acompanhar ambos os turnos.
Na mesma linha, o padre Adelino Guarda aponta a necessidade da formação dos padres ao longo de toda a vida, dando como referência as indicações do Papa João Paulo II na Exortação Apostólica “Pastores davo vobis”, de 1992. “Mais ainda no mundo de hoje, em que toda a gente destaca a importância da formação atualizada em todos os domínios, para que se possa acompanhar a rápida e constante evolução das sociedades”, refere este responsável, explicando que “é preciso saber conjugar a formação inicial com a prática do exercício do ministério num mundo que não parou e nos confronta com realidades diversas e novos desafios”.
“Aprender até morrer” é a frase com que resume esta ideia e que é retomada pelo padre Benevenuto Morgado, um dos anciãos, com 81 anos de idade e 57 de sacerdócio: “Sempre fui à formação permanente e considero-a importantíssima, porque há aspetos que não lemos nos livros e não vemos de imediato, mas vamos aprendendo com a vida e a partilha de outros mestres”. E, embora já não seja pároco, continua a defender que “não podemos ficar para trás”.
O padre Fernando Varela, de 52 anos e que celebra as suas bodas de prata sacerdotais no próximo dia 12 de março, concorda: “Considero muito importante, não só pelo conhecimento recebido dos conferencistas, mas também porque nos dá uma visão mais global daquilo que na vida da Igreja está a ser discutido e refletido, transformando-se numa mais-valia para acompanharmos e ajudarmos as pessoas e as comunidades paroquiais”.
Comunhão do presbitério
De uma geração mais recente, com 35 anos e padre há nove, Manuel Henrique de Jesus confirma a sua necessidade de atualizar conhecimentos e aponta de imediato a “oportunidade que é de pararmos para estudar, rezar e convivermos uns com os outros e com o Bispo”.
Essa é outra das prioridades, aponta o padre Adelino Guarda: “A formação também resulta do próprio ambiente que se cria, do convívio entre os padres fora do seu ambiente normal de trabalho, em que a comunhão em presbitério se desenvolve e torna mais viva”. E sublinha: “É uma semana em que estamos para isto, sem outras preocupações, e o facto de estarmos juntos é já formação do presbitério, em ambos os sentidos, é formação em ato, é tomarmos mais consciência da nossa missão enquanto corpo e membros desta Igreja particular de Leiria-Fátima”.
O padre Fernando Varela ainda pondera se “com tantos afazeres que temos, não será demais uma semana inteira”. Mas é precisamente pelo convívio que proporciona com os colegas que considera “justificar-se mais esse tempo, sempre rico de experiências de comunhão”. “Vemo-nos sempre a correr e não temos tempo para conversar”, aponta também o padre Benevenuto Morgado, defendendo a importância do “convívio e da partilha da família sacerdotal”.
Esse é, aliás, um dos motivos da presença do Bispo em ambos os turnos. “É um momento particular e muito belo de comunhão do presbitério, com tempo, com ocasiões de convívio e de laser, de vida espiritual e de oração em comum”, refere D. António Marto, apostado em “mostrar que o Bispo faz parte do presbitério e está disponível para conversar com os padres que queiram aproveitar esta ocasião de maior disponibilidade”.
Tema da família
Este ano, o tema foi “Viver e pensar a família. Olhares a partir do diálogo fé e cultura”, apresentado em seis sessões por Juan Ambrosio, pai de família e professor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. Também alguns membros do Departamento de Pastoral Familiar e dos movimentos das Equipas de Nossa Senhora e dos Centros de Preparação para o Matrimónio falaram dos “desafios e oportunidades” da pastoral pré-matrimonial e familiar”.
“Na sua avaliação final, os padres gostaram da temática proposta e do modo como foi desenvolvida”, adianta o padre Adelino. O padre Manuel Henrique confirma que achou o tema “adequado, oportuno e interessante, levando-nos a equacionar algumas formas de fazer pastoral e a ter uma noção mais clara dos reais problemas das famílias”.
O padre Benevenuto gostou do tema “premente e de acordo com a corrente discussão em toda a Igreja”, mesmo confessando: “não entendi tudo, pois há novidades que já me custa acompanhar”. Impressionou-o, sobretudo, “a atual necessidade de uma preparação para o casamento com formação e acompanhamento logo desde a infância e a adolescência, dados os novos conceitos de namoro e os tipos de relação entre os mais jovens”.
Mais habituado a conviver com estas realidades, dado ser o vigário judicial, o padre Fernando Varela foi convidado a uma intervenção no final de ambos os turnos, sobre “sugestões na preparação do Matrimónio e pistas para discernir sobre casamentos nulos”. Partindo da sua experiência no Tribunal Eclesiástico, sublinhou que “as pessoas que namoraram, fizeram um projeto de vida a dois, casaram e depois viram o matrimónio fracassar estão em grande sofrimento e não podemos falar delas de forma ligeira, mas com muita delicadeza e oferecendo-lhes um acolhimento fraterno”. Sendo evidente que “muitos não estão preparados e não conhecem todas as implicações do casamento, a nossa principal obrigação é prevenir esses fracassos, informando os noivos sobre a realidade do sacramento, o modo de o celebrar e as suas normas jurídicas”, afirmou. Colocando os serviço do Tribunal à disposição dos padres para “uma maior colaboração neste trabalho”, o vigário judicial defendeu que “caso seja clara a falta de preparação, mais vale aconselhar os noivos a pensarem melhor ante de decidirem casar e oferecer-lhes meios de os ajudar nessa ponderação”.
Na mesma linha, o padre Fernando Varela faz uma avaliação positiva desta formação, como ajuda para um olhar diferente sobre o assunto, menos linear e mais pastoral. “Hoje, temos de acompanhar as famílias no contexto real em que vivem, muitas numa crise socioeconómica que se repercute noutras dimensões”, defende, apontando para a necessidade de “as olharmos com o olhar de Cristo, isto é, não de uma forma mística, autoritária ou desenraizada da realidade, mas com a atitude de acolhimento, cordialidade, compreensão e disponibilidade para as ouvir, partilhar as suas alegrias e angústias e ajudar a ultrapassar os desafios”.
Também D. António Marto sublinha esta vertente pastoral. “É sempre importante a formação doutrinal, que foi numa linha antropológica, de valorização da dimensão afetiva e vocacional da família, mas mais ainda é a sua aplicação prática, seja na preparação para o Matrimónio, seja no apoio pastoral contínuo aos casais e às famílias que procuram na pessoa de Cristo uma luz para a sua vida concreta”, conclui o Bispo de Leiria-Fátima.
Cuidar o património cultural
Um tema paralelo desta formação permanente foi o dos riscos e perigos que obrigam ao “olhar vigilante sobre o património cultural na Diocese”. O arquiteto Humberto Dias foi um dos membros da equipa multidisciplinar do Departamento Diocesano do Património Cultural que ali se deslocou. “Fomos apresentar a nossa missão de auxiliar o Bispo e os padres, que estão no terreno, a cuidar o património do passado, que pertence a todos, Diocese, paróquias e fiéis”, resume.
Sendo muitos os perigos e riscos que podem contribuir para a sua degradação ou desaparecimento, “é cada vez mais importantes conhecê-los e olhar o património como algo a valorizar e proteger, de forma atenta e informada”, defendeu este responsável.
Vários exemplos foram apresentados para que essa atenção contínua venha a evitar perdas irreparáveis ou intervenções muito dispendiosas, sendo notório por parte dos padres “o interesse e a manifestação de preocupação”, considera positivamente Humberto Dias.