Diocese de Leiria-Fátima celebrou o seu padroeiro com apelo a viver a fé como encontro transformador

A Diocese de Leiria-Fátima celebrou, no dia 28 de agosto, a festa litúrgica de Santo Agostinho, padroeiro principal da Igreja local, juntamente com Nossa Senhora de Fátima. A celebração teve lugar na igreja dedicada ao santo, no centro da cidade de Leiria, e foi presidida pelo bispo diocesano, D. José Ornelas, que sublinhou a importância de olhar para a figura do doutor da Igreja como modelo de vida cristã.

A comunidade foi convidada a participar de forma alargada neste momento de fé e comunhão, com particular apelo aos sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos que colaboram mais diretamente na ação pastoral da Diocese. Na saudação inicial, o bispo recordou que celebrar um padroeiro “significa reconhecer aquele que tomamos como modelo, que foi e continua a ser invocado, e que, ao mesmo tempo, é evocado como exemplo de vida e de pertença à Igreja”.

VÍDEO
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Na homilia, D. José Ornelas desenvolveu uma reflexão sobre a vida e o testemunho de Santo Agostinho, sublinhando a atualidade da sua mensagem. Recordou que o santo africano só conheceu verdadeiramente a Deus aos trinta e dois anos, reconhecendo esse caminho tardio como fonte de dor, mas também de gratidão: “Tarde te conheci, meu Deus”, escreveu Agostinho nas suas Confissões. Para o bispo, esse percurso mostra que a fé não é fruto de um esforço humano, mas resposta ao chamamento de Deus, que se manifesta no amor.

“Agostinho foi uma das mentes mais brilhantes do seu tempo. Era filósofo, advogado, homem de leis, académico versátil em praticamente todo o saber. Mas aquilo que realmente o fascinou e lhe deu sentido foi o amor de Deus”, afirmou D. José Ornelas. Lembrou ainda o papel decisivo de Santa Mónica, mãe de Agostinho, cuja perseverança na oração acompanhou a conversão do filho.

A partir da primeira epístola de São João, proclamada na liturgia, o bispo destacou a centralidade do amor na experiência cristã: “Amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus”. Sublinhou que, para Agostinho, a beleza da fé é precisamente a beleza do amor divino, que dá luz e sentido à vida.

Outro aspeto destacado foi a relação entre fé e inteligência. D. José Ornelas explicou que Agostinho nunca abandonou as suas perguntas, mas aprendeu a iluminá-las pela fé: “O crente não é aquele que fecha os olhos, mas aquele que os abre para compreender tudo. E depois reconhece que afinal nada sabe”. Recordou a célebre história do encontro de Agostinho com uma criança na praia, tentando colocar o mar num pequeno buraco de areia, como imagem da impossibilidade de encerrar o mistério de Deus na mente humana.

“Agostinho liga sempre fé e inteligência. Uma inteligência iluminada pela fé, que dá novo sentido às coisas. Este é também o desafio que ele nos deixa hoje, num tempo marcado pelas novas ciências e tecnologias: não rejeitá-las, mas colocá-las ao serviço da construção de um mundo que não nos desvie do essencial”, afirmou.

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A homilia prosseguiu com uma reflexão sobre o Evangelho proclamado: “Não vos deixeis tratar por mestres”. D. José Ornelas sublinhou que, mesmo sendo um mestre da fé e da inteligência, Agostinho nunca deixou de se considerar discípulo: “Não por falsa humildade, mas porque só assim se abre espaço para aprender mais, para reconhecer que Deus é sempre maior e nos leva mais longe”.

O bispo destacou ainda a dimensão comunitária do ministério de Agostinho, que viveu o seu episcopado como serviço e comunhão, em sintonia com os presbíteros e as comunidades. “É essa a Igreja que Agostinho nos ensina a ser: comunidade de irmãos e discípulos, unidos pelo batismo. Ele próprio dizia: ‘convosco sou cristão, para vós sou bispo’”, citou D. José Ornelas.

A celebração terminou com um apelo a que cada fiel renove a alegria de viver a fé e de construir a Igreja à imagem de Santo Agostinho: “Hoje damos graças a Deus pelo nosso padroeiro e pedimos ao Senhor que também a nós nos faça descobrir, ainda que tarde: tarde te conheci, meu Senhor e meu Deus, mas agora agradeço porque Te revelaste e eu pude conhecer o Teu amor”.

ÁLBUM FOTOGRÁFICO
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Homilia integral

À luz das palavras do Evangelho e do apóstolo São João que hoje proclamámos, quero fazer um pequeno comentário daquilo que esta celebração do nosso padroeiro, Santo Agostinho, nos pode e deve suscitar.

Santo Agostinho é um homem que ele próprio declara só ter conhecido verdadeiramente a Deus tarde na vida. Não era tão tarde, tinha trinta e dois anos, mas ele diz “tarde”, lamenta o tempo que perdeu: “tarde te conheci, meu Deus”.

E hoje, diz ele, a minha alma vive precisamente desse conhecimento. Mas não se trata apenas de um conhecimento intelectual; não é simplesmente saber coisas sobre Deus. Já direi também uma palavra sobre isso.

Certamente que ele foi uma das mentes mais brilhantes do seu tempo, não tenho dúvida. Não é apenas aquele que nos deixou os escritos que fundamentaram a Igreja em tempos de profunda mudança no mundo e na própria Igreja. Poucos anos antes tinha sido dada, pela primeira vez, liberdade à Igreja dentro do Império Romano.

Ele conta que ainda nas comunidades se viam muitos que tinham sofrido torturas, a quem tinham cortado os pés, a quem tinham infligido suplícios de mártires da fé — mártires vivos. E aqui começa-se realmente a valorizar o testemunho destas pessoas que, com o seu sangue, iam dando vida e confirmando a validade da fé em Jesus Cristo. E Agostinho reconhece também o papel das lágrimas de sua mãe, que foram decisivas e que ele nunca, nunca esquecerá.

A recordação da mãe, que sofria por vê-lo numa vida desregrada, embora fosse um homem de sucesso e muito sério no plano profissional, acompanhou-o sempre. Mas o encontro — ou reencontro — com Cristo, que o chama, teve para ele o mesmo efeito que para São Paulo no caminho de Damasco: compreender que era Deus quem vinha ao seu encontro, que não era uma descoberta dele, mas um chamamento a que respondeu.

Agostinho fala muito da beleza da fé. Mas a beleza de quê? A beleza do amor de Deus. É por isso que lemos a primeira epístola de São João: “amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus”.

Ele, que era fascinado pela ciência, pelo pensamento, filósofo, advogado, homem de leis, académico versátil em praticamente todo o saber do seu tempo, foi exímio em tudo isso. Mas aquilo que realmente o fascinou e lhe deu sentido foi o amor de Deus. O amor que ele vê desde as origens até ao presente da sua vida.

E é por isso que faz uma interpretação, uma releitura da Igreja, de que a Igreja bem precisava naquele tempo, em que surgiam muitas correntes e interpretações. Muitos entraram na Igreja, também pessoas cultas, mas alguns, a certa altura, perderam o sentido das coisas: desde os muito rigoristas, com quem Agostinho chegou a simpatizar, até aos que se deixavam levar pelo sincretismo do mundo.

Agostinho surge como aquele que une. E a primeira coisa é esta: o amor de Deus que vem ao encontro dele. Como em São Paulo. O fascínio de Agostinho é o amor de Deus — o Omnipotente, o Senhor do Universo — mas que se relaciona connosco sobretudo através do amor.

E é essa beleza que faz com que ele dê luz, lógica e alegria ao mundo e à vida de cada um de nós.

A segunda palavra é a inteligência. Agostinho era um homem de muitas questões. Demorou a compreender o chamamento de Deus. Mas, uma vez encontrado o princípio, sentia a necessidade de lhe dar lógica.

A fé, dizia ele, não é de alguém que abandona o saber para crer. Ele levava consigo todas as suas perguntas, mas agora recebiam novas respostas. O crente não é aquele que fecha os olhos, mas aquele que os abre para compreender tudo. E depois reconhece que afinal nada sabe.

A célebre história da praia ilustra isto: Agostinho queria entender o mistério da Santíssima Trindade. Viu um menino a levar água do mar para um pequeno buraco na areia. Perguntou-lhe o que fazia. O menino respondeu: “Estou a pôr o mar aqui dentro”. Ao que Agostinho disse: “Mas tu pensas que consegues pôr o mar aí dentro?”. Então percebeu que também ele não podia colocar Deus dentro da sua pequena cabeça.

A fé não é limitar Deus à medida da razão humana, mesmo a mais genial. É deixar-se guiar por Ele, abrir os olhos para aquilo que se pode compreender e deixar que seja Deus a revelar-se.

Por isso, Agostinho liga sempre fé e inteligência. Uma inteligência iluminada pela fé, que dá novo sentido às coisas.

Este é também o desafio que ele nos deixa hoje, no nosso tempo, com novas ciências e tecnologias. Não se trata de rejeitá-las, mas de as colocar ao serviço da construção de um mundo que não nos desvie do essencial.

O terceiro elemento surge no Evangelho: “Não vos deixeis tratar por mestres”. Se alguém podia ser chamado mestre, era Agostinho. E havia outros grandes mestres do seu tempo, como Santo Ambrósio. Mas Agostinho lembra que, antes de mais, somos discípulos. Não por falsa humildade, mas porque só assim se abre espaço para aprender mais, para reconhecer que Deus é sempre maior e nos leva mais longe.

A nossa vida é sempre apenas uma etapa. Somos sempre um projeto lançado para diante, dentro do horizonte do amor de Deus. Mesmo quando parece que tudo termina, na morte, abre-se apenas o caminho para um mundo novo onde Ele nos chama.

Por isso digo: não vos deixeis chamar mestres. Permanecei discípulos e discípulas, guiados pelo amor de Deus, pela santidade do seu Espírito, pela força que Ele dá para vencer todas as dificuldades.

É essa a Igreja que Agostinho nos ensina a ser: comunidade de irmãos e discípulos, unidos pelo batismo. Ele próprio dizia: “convosco sou cristão, para vós sou bispo”. Serviço e comunhão andam juntos.

Foi também isso que procurou viver, formando comunidades com os seus presbíteros. E é esse também o nosso projeto, quando hoje falamos de unidades pastorais: comunidades onde experimentamos a grandeza do amor de Deus, que cria laços novos entre nós e nos faz participar na sua beleza.

Hoje damos graças a Deus pelo nosso padroeiro e pedimos ao Senhor que também a nós nos faça descobrir, ainda que tarde: “tarde te conheci, meu Senhor e meu Deus, mas agora agradeço porque Te revelaste e eu pude conhecer o Teu amor”.

A alegria de viver contigo. A alegria de participar e construir a Tua Igreja. Que o Senhor nos ajude a viver um pouco daquilo que viveu Santo Agostinho, que nos deixou como herança e desafio.

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18 de Outubro
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