DE BETÂNIA A JERUSALÉM

Não é preciso ser muito versado nos estudos bíblicos para saber que os termos referentes a refeições com especial significado humano e teológico, são dos mais frequentes em todos os livros, sobretudo no Antigo Testamento.

A importância que tinha para o povo hebreu a refeição familiar e a sua função como parte dos hábitos de colhimento e encontro de amigos, está na base do uso que dela faz o Novo Testamento, para figurar, quer as reuniões da comunidade cristã, quer do gozo eterno, na comunhão da glória com Deus.

É pensando nisto que tomo a liberdade de ler em conjunto, como partes do mesmo todo, dois passos do quarto evangelho, que são, como é óbvio, uma profunda meditação do “discípulo que Jesus amava”, sobre os gestos com que, ainda antes da Cruz, Deus revela a profundidade, eu diria mesmo, a extrema loucura do seu amor pelos homens, com os quais se identifica para os salvar.

Primeiro, Betânia:

Seis dias antes da Páscoa, Jesus foi a Betânia, onde vivia Lázaro, que Ele tinha ressuscitado dos mortos. Ofereceram-lhe lá um jantar. Marta servia e Lázaro era um dos que estavam com Ele à mesa. Então, Maria ungiu os pés de Jesus com uma libra de perfume de nardo puro, de alto preço, e enxugou-lhos com os seus cabelos. A casa encheu-se com a fragrância do perfume” (Jo 12, 1-3).

Depois, Jerusalém:

Antes da festa da Páscoa, Jesus, sabendo bem que tinha chegado a sua hora da passagem deste mundo para o Pai, Ele, que amara os seus que estavam no mundo, levou o seu amor por eles até ao extremo. (…)

Enquanto celebravam a ceia, sabendo perfeitamente que o Pai tudo lhe pusera nas mãos, e que saíra de Deus e para Deus voltava, levantou-se da mesa, tirou o manto, tomou uma toalha e atou-a à cintura. Depois deitou água na bacia e começou a lavar os pés aos discípulos e a enxugá-los com a toalha que atara à cintura. (…)

Depois de lhes ter lavado os pés e de ter posto o manto, voltou a sentar-se à mesa e disse-lhes: «Compreendeis o que vos fiz? Vós chamais-me ‘o Mestre’ e ‘o Senhor’, e dizeis bem, porque o sou.

Ora, se eu, o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns aos outros. Na verdade, dei-vos exemplo para que, assim como eu fiz, vós façais também. Em verdade, em verdade vos digo, não é o servo mais do que o senhor, nem o enviado mais do que aquele que o envia. Uma vez que sabeis isto, sereis felizes se o puserdes em prática” (Cfr Jo, 13, 2-17).

Omitimos os pormenores, apesar da sua importância, para nos fixarmos no gesto central da lavagem dos pés:

No tempo de Jesus, de modo habitual, era função do escravo lavar os pés do senhor, quando este regressava do trabalho, ou de uma viagem, antes de se inicia a refeição. Mais raramente fazia-o também o hospedeiro quando recebia um amigo que convidara para comer com ele.

Sinal de deferência, no caso ado amigo, de serviço humilde, no caso do escravo.

O Evangelho, quanto a mim intencionalmente, aponta para um progresso espantoso, na revelação do mistério do homem e da sua relação com Deus: utiliza-se o sinal da lavagem dos pés, pela riqueza do respectivo simbolismo, na cultura do tempo.

E não será por caso, sobretudo tendo em conta a estrutura narrativa de João, que é uma mulher que inicia a construção do sinal, com elementos tão chamativos para as características da identidade feminina, sobretudo a coragem e a generosidade; lamentável o esvaziamento que se produziu, quando se começou a fazer dele quase um espectáculo que pouco ou nada tem a ver com sua intimidade original.

Sies dias antes da Páscoa, como diz o Evangelho, é uma mulher que nos vem dizer de que modo Deus quer que o amemos: com o perfume de um amor tão cheio de coragem e generosidade, que escandalize quem só sabe fazer contas para arrebatar e guardar para si, o mais possível.

E a revelação termina, quando Deus, com o mesmo gesto, ainda mais chocante, numa só penada diz o que é para nós e quer que sejamos uns para os outros.

Pessoalmente, confesso que não preciso de mais nada para compreender a atracção que, segundo a profecia do próprio Jesus, há mais de dois mil anos, exerce sobre tantos milhares de homens e mulheres, o Crucifixo.

Claro. Também o desprezo, o escárnio e a perseguição, como nos banquetes que estão assim, ligados como sinal do único amor verdadeiro.

Talvez, nos nossos dias, fosse mais oportuno e eficaz, do ponto de vista pastoral e da evangelização dos povos, dar um maior espaço à catequese sobre o conteúdo dos sinais, do que à sua reconstituição histórica.

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