Em 1945 surgia em Portugal uma obra destinada a acolher e ser a segunda família de jovens e senhoras “desamparadas”, algumas delas “recusadas” por institutos religiosos. A Obra cresceu e veio a tornar-se Congregação, em 1968.
Serviço doméstico, social e pastoral
na Igreja e no mundo
Tudo começou com o padre Adão Salgado Vaz de Faria (1907-1990), da arquidiocese de Braga, cujo processo de beatificação está a decorrer. Enquanto pregador, confessor, director espiritual e assistente de organismos especializados da Acção Católica, da Pia União das Filhas de Maria e dos Cruzados de Fátima, bem como director da Obra das Vocações e Seminários, teve um contacto atento com a realidade eclesial do seu tempo.
E o que observou foi um cristianismo marcado pela falta de coerência e de autenticidade, sensibilizando-o, em particular, a situação da vida religiosa, em que algumas consagradas tinham de abandonar as congregações por doença e outras eram impedidas de entrar por falta de saúde ou de dote, por analfabetismo ou defeitos de ordem física, por serem filhas únicas ou ilegítimas, pelas dificuldades próprias da velhice, etc. Por outro lado, preocupava-o o alastrar do materialismo, o crescente fenómeno da emigração e a escravatura sexual que atingia algumas mulheres.
Num dos retiros que orientava para a Acção Católica, surge um grupo em que algumas destas pessoas lhe manifestam o desejo de continuar a viver o ambiente que estavam a experimentar. Sentindo essa interpelação como um impulso do Espírito, funda nessa mesma casa, na paróquia de Sande, Guimarães, em 1945, a Obra da Divina Providência e Sagrada Família.
Desde logo, lhe estabeleceu uma tripla finalidade: acolher as jovens e senhoras que tiveram de deixar as congregações a que pertenciam e as que desejavam ser religiosas e se viam impedidas de o ser; resguardar adolescentes e jovens da exploração sexual e do materialismo; e ser a segunda família de todas.
Todo o carisma no nome
O nome da Obra derivava, precisamente, das condições em que surgia e resumia todo o seu programa de vida. Sem quaisquer recursos e completamente confiada à Divina Providência, tendo como frase inspiradora: “Não vos preocupeis quanto à vossa vida, com o que haveis de comer, nem quanto ao vosso corpo, com o que haveis de vestir…” (Lc 12, 22-31). Além das ofertas dos familiares, os membros asseguravam a sua subsistência com o cultivo da terra anexa à casa, a tecelagem, a venda de objectos religiosos, o acolhimento de grupos em retiro e outras remunerações de serviços prestados.
Por outro lado, apontava como ideal de vida o da Sagrada Família de Nazaré: em pobreza, obediência, castidade, modéstia, harmonia, compreensão, acolhimento e amor ao trabalho.
De Obra a Congregação
Pouco tempo depois, surge como anexo à Obra um internato para meninas órfãs ou desamparadas, que frequentavam a escola da freguesia e aprendiam lavores como cozinha, costura, bordados, higiene e decoração da casa.
O rápido crescimento dos membros faz com que o padre Adão procurasse alguém para colaborar na organização do dia a dia e na formação mais sistemática A Divina Providência coloca-lhe no caminho Maria Rosa Campos, uma das que fora forçada a abandonar a ideia da profissão religiosa por motivos de doença. Entra nesse mesmo ano e virá a ter um papel fundamental no crescimento e, em 1968, na passagem definitiva ao estatuto de congregação religiosa. É, por isso, considerada cofundadora.
A sua missão na Igreja e no mundo viria a centrar-se no serviço doméstico, social e pastoral, promovendo a vida familiar em casas de repouso e de retiros, lares de terceira idade, jardins de infância, seminários, paços episcopais, paróquias e outras instituições.
Chamadas pelo Bispo de Leiria-Fátima
D. António Marto conheceu o trabalho da congregação enquanto bispo auxiliar de Braga. Ao chegar à diocese de Leiria-Fátima, pede à superiora geral a vinda de uma comunidade para a casa episcopal. Assim, desde 2007, são três as irmãs que ali cuidam de todas as tarefas domésticas e no atendimento a quem telefona ou bate à porta, fora das horas de serviço da secretaria episcopal.
Como conta a superiora da comunidade, irmã Helena Pereira, fazem-no “à semelhança de Marta e Maria, conjugando os trabalhos domésticos com a contemplação e a oração pessoal e comunitária”.
Testemunho vocacional
“…amava aquele jovem e sentia-me amada por ele”
O amor não é vivido apenas nas grandes obras. Também na vida quotidiana se pode praticar de modo admirável. O importante é que seja gratuito, dedicado e faça bem ao próximo. Vivê-lo assim torna-se possível a quem deixou entrar no seu coração o fogo do amor de Jesus Cristo e dele se alimenta. Quem o encontrou na sua vida de modo ardente e a Ele se entregou torna-se audaz e capaz de deixar tudo para viver um tal amor. Assim aconteceu comigo há 30 anos, quando entrei na Congregação da Divina Providencia e Sagrada Família.
Nasci em 1958 como a oitava de quinze filhos de António Pereira e Camila da Silva, em Pedome, concelho de Famalicão. Durante nove anos trabalhei como operária da indústria têxtil.
Na paróquia, fui catequista. Num encontro de formação orientado por uma religiosa, senti o chamamento de Cristo a consagrar-me totalmente a Ele. Aos 23 anos, deixei a fábrica, o namorado e a família para seguir a minha vocação. Fiz a profissão religiosa em 1986. Desde então, a minha missão de serviço aos irmãos por amor de Cristo levou-me, sucessivamente, às dioceses de Braga, Torres Vedras, Algarve, Póvoa de Varzim, Vila Real e Leiria-Fátima, onde estou agora a trabalhar na casa episcopal.
A decisão para seguir a minha vocação não foi nada fácil. O amor de Cristo e o chamamento foi como um fogo que se acendeu no meu coração. Vivi uma luta interior: sentia que Deus me chamava a segui-l’O, mas também amava aquele jovem e sentia-me amada por ele. Na oração, pedia ao Senhor que me iluminasse para eu ver e fazer a sua vontade. Foi nessa intimidade prolongada com Cristo, na adoração eucarística, que percebi com clareza o caminho a seguir, decidindo-me pela vida consagrada. Desde então, comecei a sentir uma paz interior inexplicável. E mais: sentia que tinha um coração universal para amar toda a gente e não podia ficar só ligada a uma família, aos amigos, à paróquia.
Encontrei resistência e mesmo oposição na família, pois os meus pais e irmãos julgavam-me iludida. Apesar de tudo, não desisti, fui em frente e perseverei. Na profissão religiosa, os meus familiares estiveram presentes e pediram-me desculpa por me terem feito sofrer, pois ainda não tinham entendido que essa era a vontade de Deus a meu respeito. Hoje, dizem que eu sou a filha e irmã mais feliz que têm. Eu senti mais uma vez a força e valor da oração e que, quando Deus chama, também nos dá força para ultrapassar todas as dificuldades, se nós formos fiéis ao seu chamamento.
Desde a minha entrega a Jesus Cristo na vida religiosa, passaram-se 30 anos. Ao longo de todo este tempo, conforme o carisma da minha congregação, tenho procurado ser apoio concreto à vida e vocação de todo o ser humano, em ambiente de família, vivendo ao jeito da Sagrada Família de Nazaré, modelo diário da minha especial consagração. Procuro crescer cada dia na confiança e no abandono à Divina Providencia, que sempre e em todas as circunstâncias cuida de cada pessoa com amor eterno.
Obrigada, Senhor, porque tomaste a iniciativa de me seduzir e, apesar das resistências e medos, fostes o vencedor; porque a tua sedução atrai e enche todo o meu ser e me envolve como um abraço que abraça a minha vida toda; porque tudo o que sou, nas minhas capacidades e fragilidades, está contemplado na resposta que dou e na entrega que faço; porque hoje de novo me convidas a fazer oferta de mim como hóstia viva e agradável ao Pai; porque seguir-Te é fazer minha a tua vontade; porque é a certeza do teu amor que me anima a renunciar a tudo o que não és Tu e me faz desejar perder a vida para encontrá-la; porque tenho crescido na família religiosa que me acolheu e aprendido em cada dia a confiar mais em Ti.
Irmã Helena Pereira, superiora da comunidade de Leiria
Números…
…em Portugal
Casas: 16
Irmãs: 105
…em Angola
Casas: 2
Irmãs: 6
…na Diocese
Casas: 1
Irmãs: 3
Mais nova: 56 anos
Mais velha: 66 anos