A apresentação do relatório sobre os abusos sexuais na igreja deixou-nos, a todos, tristes, magoados e com alguma revolta interior. Para mim que sou padre e para nós cristãos da nossa Igreja Católica isto nos envergonha e nos coloca a todos numa situação desconfortável pela tentação de generalização.
Este relatório veio trazer à luz da verdade e do conhecimento de todos, uma das páginas mais negras da nossa igreja católica em Portugal. Há que assumir duma vez por todas, e por todos, que os abusos sexuais de menores por membros do clero da igreja é uma monstruosidade, um pecado grave e um crime horrível.
Relativamente aos encobridores destes abusos criminosos torna a questão mais grave. E aqui a hierarquia da Igreja, dioceses e seus Bispos devem fazer uma “mea culpa”. Assumirem os erros. Criar mecanismos para que esta política de falsos protecionismos não exista mais.
Todas as denúncias de possíveis casos devem ser escutadas, apuradas e avançarem para a justiça. E em nome da prudência, que sempre caracterizou a Igreja, estes padres devem ser automaticamente suspensos do seu ministério até que se chegue a uma conclusão, de condenação ou não. Caso condenados por práticas de abusos sexuais devem ser expulsos da Igreja.
Quanto às vítimas, a parte mais sofredora e traumática, devem merecer toda a atenção quando partilham abusos causados por membros da Igreja. As escutas atentas e fraternas são fundamentais para recuperar a dignidade dos abusados.
A igreja precisa obviamente de pedir perdão, duma forma pública e ao mesmo tempo, duma forma pessoal, a cada vítima abusada. Deve arranjar uma maneira muito concreta de expressar esse mesmo perdão, em nome de Deus e dos abusadores. Assumir o erro e comprometer-se, em tudo fazer, para que não se repitam casos como estes.
Contudo, não basta pedir perdão. É preciso que se faça justiça a todos os abusadores, depois de provados os actos cometidos. Enviar todos os casos ao Ministério Público para que este faça as suas diligências e respectivo processo judicial. E a Igreja que também tem as suas leis canónicas e o seu tribunal eclesiástico deve proceder da mesma forma, a nível Diocesano e a nível do Vaticano.
O perdão e a justiça devem se feitos ao mesmo tempo e com o duplo objectivo: aliviar o sofrimento das vítimas e a Igreja fazer o seu caminho de purificação e de reparação e, por outro lado, condenar os abusadores.
Neste processo todo faço algumas ressalvas.
Não se pode cair na tentação da generalização, ou seja, de que todos os padres são pedófilos. É uma tentação apetecível à nossa sociedade e aos meios de comunicação social que, infelizmente, têm uma grande dose de denegrir a nossa Igreja. E que é duma injustiça tremenda. Outra tentação é achar-se que todas as queixas feitas, de per si, são suficientes para automaticamente condenar um possível abusador. É preciso também escutar sempre o outro lado. Outro perigo inerente a este processo, é saber valorizar sempre, pela positiva, o grande valor serviçal do sacerdócio ministerial. Os sacerdotes não são uns monstros, mas pessoas humanas que precisam de serem amadas, encorajadas e valorizadas. Outra tentação é achar-se que, com estes abusos, é o fim da igreja católica em Portugal e duma quebra de confiança na mesma. Nada mais errado e antievangélico.
A Igreja é de Jesus Cristo.
A Igreja é Santa e Pecadora.