Quando recebemos uma visita ilustre, é de bom tom oferecer um presente ou lembrança ao convidado. Qual a prenda indicada para o País oferecer ao Papa Francisco em maio? A resposta foi dada em Leiria, no passado fim de semana.
Drama dos refugiados debatido em Leiria
O Centro Pastoral Diocesano de Leiria-Fátima acolheu, nos passados dias 13 a 15 de janeiro, os cerca de 70 participantes no 17.º Encontro Nacional de Animadores Sócio-Pastorais das Migrações, sob o tema “Refugiados: euros ou pessoas?”.
Organizado pela Obra Católica Portuguesa de Migrações, a Cáritas Portuguesa, o Departamento Nacional da Pastoral Juvenil e a Agência Ecclesia, com a colaboração do Secretariado Diocesano de Migrações e da Cáritas Diocesana de Leiria-Fátima, o encontro inseriu-se no contexto do Dia do Migrante e do Refugiado, assinalado pela Igreja universal a 15 de janeiro.
Na sessão de abertura, D. Joaquim Mendes, bispo auxiliar de Lisboa, lembrou a Mensagem do Papa para este dia, centrada nas crianças que são vítimas deste flagelo, e referiu que, ainda que Portugal seja “exemplo da solidariedade europeia”, também é verdade que “não podemos parar”. Eugénio Fonseca, da Cáritas Portuguesa, recordou os 17 anos deste encontro, onde já se falou de imigrantes, de emigrantes e agora do problema mais grave da migração, não pela melhoria da vida, mas pela mera garantia da vida. Apontou uma Europa “tímida” e “desorientada”, mas lançou o repto a encaramos o problema “com espírito vencedor”, de quem está disposto a resolver, apelando à “reanimação das paróquias”. Também o padre Sílvio Litvinczuk, da pastoral de migrações diocesana, fez uma viagem pela Europa a “necessitar de alma e de Deus”, apontando a sua matriz cristã fundadora como “resposta às crises que a assolam”, entre as quais, “talvez atualmente a mais grave, a dos refugiados” que lhe batem à porta e lhe entram pela casa.
Privilegiar o fraco
Logo na primeira conferência, o padre José Manuel Almeida apontou os diversos dilemas entre “pensar e agir” e mostrou como “as coisas têm um preço, mas as pessoas têm uma dignidade”. Defendeu que é preciso “privilegiar o fraco”, neste caso os refugiados, “por uma questão de justiça” e porque “todos somos responsáveis por todos”. Agindo com e como Cristo, partindo da mesa da Eucaristia para a partilha da mesa do mundo – “onde está a salvação” –, devemos procurar “onde está hoje o frágil e oferecer-lhe, não a caridade, mas o que lhe pertence por direito e justiça”.
Foi nessa procura que o debate seguiu num painel sobre a Europa como “família de povos”, na manhã de sábado. A eurodeputada Ana Gomes, o economista João Ferreira do Amaral e o alto-comissário para as Migrações Pedro Calado demonstraram como o potencial da Europa para acolher refugiados é muito superior ao que se apregoa. Numa Europa cada vez mais envelhecida, fechada em si e egoísta, acolher refugiados pode até ser uma resposta à crise demográfica, económica e, até, sociocultural. É “possível”, “viável” e “útil”, concluiu-se.
Foi também nessa demanda que decorreram os trabalhos de grupos, apresentados com o comentário do ex-ministro e comissário europeu António Vitorino. “A Europa prometeu mundos e fundos e não cumpriu”, disse, referindo-se aos apenas 7 mil refugiados realojados, dos 160 mil que tinham sido assumidos. São “fracos resultados” que “minam a credibilidade” dos países mais ricos, corresponsáveis pelo problema.
Uma família por comunidade
O último painel, sobre o compromisso a assumir pela Igreja, contou com os testemunhos de Rui Marques, Helena Vaz e Margarida Neto, da PAR – Plataforma de Apoio aos Refugiados. Os números da realidade, os casos concretos e os nomes das famílias acolhidas deram uma “cor” especial ao debate. “Parece que já fazemos muito, mas poderemos ter vergonha de nós”, quando verificamos que 70% dos refugiados estão nos países mais pobres e que só o Líbano, com 4 milhões de habitantes, acolheu 1,5 milhões de refugiados, quase o dobro dos que aceitou a Europa, com os seus 500 milhões de cidadãos.
É urgente que os portugueses deixem de lado uma “indignação de sofá”, estimulada pelos picos de informação e a exploração de casos dramáticos, para agirem numa indignação plena que leve ao verdadeiro compromisso. Somo um “exemplo anão”, em que apenas 1 por cada 80 paróquias disse “sim” ao convite do Papa Francisco a que cada comunidade acolhesse uma família. “Neste momento, há famílias a querer vir para Portugal, mas a capacidade de resposta está quase esgotada, por não haver quem queira acolhê-las”, referiu a PAR.
Essa seria, então, a melhor prenda a dar ao Santo Padre, em maio deste ano: que ninguém estivesse à espera de ser acolhido em Portugal. E é para chegar aí que será lançada, no próximo mês, uma ação de sensibilização a nível nacional.