A COISA PIOR

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Não peques mais, para que não te suceda coisa ainda pior (Jo 5, 14).

Não é necessário insistir: se até as coisas boas são tantas vezes apontadas como más, e a verdade dos outros inserida em discursos mentirosos ou manipuladores…

Não será necessário insistir: mas é preciso não esquecer, fechar os olhos e os ouvidos e distrair-se, como se não tivéssemos nada a ver com o assunto

Todos ouvem, todos vêem e sentem; mas poucos, muito poucos pensam e assumem que são culpados! Que acima de tudo têm de fazer como nos indica a figura do verdadeiro orante, segundo a parábola de Jesus: “mantendo-se à distância, nem sequer ousava levantar os olhos ao céu; mas batia no peito, dizendo: Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador” (Lc 18, 13).

No cântico de meditação com que respondemos ao texto belíssimo de Isaías, dizemos, quase como quem comenta:

O Senhor é clemente e compassivo, paciente e cheio de bondade.

O Senhor é bom para com todos, e a sua misericórdia se estende a todas as criaturas.

O Senhor é fiel à sua palavra e perfeito em todas as suas obras.

O Senhor ampara os que vacilam e levanta todos os oprimidos (Sl 144[145] 8-9).

Não é fácil, perante o que vemos com os olhos da carne, irromper assim, em cânticos de louvor; de facto, às vezes apetece-nos, antes, perguntar, com o espanto com que aquele grande papa que, como teólogo, nos deixou as análises mais lúcidas e profundas sobre o mundo que Deus ama quer salvar: desabafar, com o tom de espanto com que, na sua visita a um dos campos de extermínio da Europa nazi, ele exclamou: Meu Deus, onde estáveis Vós?!

E rezou, em silêncio e palavras de esperança, porque a fé faz ouvir a resposta clara, como em Isaías e no Salmo.

Santo Agostinho, o inultrapassável comentador do Saltério, no seu discurso sobre este salmo, desenvolve o tema do louvor a Deus, porque, no meio das tribulações, Ele está presente, não só para acolher os atribulados, mas sobretudo para conceder-lhes o dom de participarem do louvor eterno. Quem O não louvar no tempo, também não O louvará na eternidade.

É um apelo à Esperança, que não é possível sem a Fé, que nos mostra a infinita Misericórdia divina, cuja revelação se completa em Jesus Cristo.

Jesus Cristo, que, depois de ter feito ao miraculado da piscina a recomendação que apontava para o significado mais profundo do sinal da cura de um homem que há 38 anos jazia numa enxerga à espera que alguém olhasse para ele, depara com a oportunidade, oferecida pelos que estranhavam o Seu gesto, para fazer uma das revelações mais profundas da Sua absoluta identidade com o Pai.

Infelizmente, nem os Seus ouvintes perceberam tudo quanto Jesus quis dizer: perceberam que pretendia ser igual ao Pai; mas não entenderam, como hoje muita gente, mesmo entre cristãos fervorosos, não entende que, quando alguém, como Ele, se debruça assim sobre os esquecidos, abandonados e perseguidos por qualquer tragédia, incluindo a inimizade e o ódio dos outros, é o próprio Deus que para isso mesmo Se fez um de nós.

Sejamos optimistas e semeemos a alegrai à nossa volta, ajudando os que andam de olhos fechados e não reparam nos milhares – apetecia-me dizer milhões – de orações, cada um à sua maneira, muitas vezes arriscando tudo, menos a sua liberdade de amar com o amor de Deus, para acudir a tantas vítimas do pecado.

O pecado, sim. Porque a “coisa pior” que poderia acontecer ao curado da piscina, seria tornar a pecar. Isso seria um mal muito acima da paralisia física.

Reparo agora no nome de uma mulher dos nossos dias – nasceu em 1914, faleceu em 1992 e foi canonizada há pouco mais de quatro anos -, que no Brasil, do qual na comunicação social portuguesa se fala quase só pelas piores razões, se consumou a trabalhar e a reunir quem estivesse disposto a trabalhar, com o mesmo espírito de gratuitidade absoluta, junto dos pobres mais pobres, como os habitantes das favelas, daquela nação imensa.

Refiro-me a Santa Dulce (Maria Rita) Lopes Pontes de Sousa Brito, que, no seu leito de dor, mereceu receber a visita de São João Paulo II, um ano antes da sua morte, ocorrida a 13 de Março de 1992. O povo brasileiro, agradecido pela sua vida e intercessão, designa a basílica onde repousam os seus restos mortais, como Santuário da Bem-aventurada Dulce dos Pobres.

Ninguém me diga que Deus não ouve nem vê o sofrimento da humanidade!

Surdos e cegos estamos nós, estão todos aqueles que, além de não O escutarem, lutam acirradamente por construir um munido à medida das suas ambições.

Perdidos nessa coisa pior, que é desrespeito permanente da Verdade, pela qual Deus morreu na Cruz e ressuscitou, para que os que crêem n’Ele tenham a vida e a tenhamos em abundância (Cfr Jo 10, 10).

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Captura de ecrã 2024-04-17, às 12.19.04

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