O Sumo Pontífice Leão XIII cometeu ao cardeal D. Américo, bispo do Porto, a execução da sua bula Gravissimum Christi Ecclesiam regendi et gubernandi munus (Gravíssimo é o múnus de reger e governar a Igreja de Cristo), de 30 de setembro de 1881, pela qual se aprovava o novo mapa diocesano de Portugal continental.
Dessa reforma eclesiástica resultou a extinção, como se sabe, das dioceses de Aveiro, Castelo Branco, Elvas, Leiria e Pinhel. Tanto Roma como o Governo português entenderam dever-se implementar esta reforma eclesiástica diocesana rápida e imperativamente.
A 15 de setembro de 1882, era publicada, no Diário do Governo n.º 208, a sentença de execução da extinção das ditas dioceses. O prelado portuense, D. Américo Ferreira dos Santos Silva, com o título e dignidade de Cardeal dos Quatro Santos Coroados, encontrava-se em posição hierárquica privilegiada para, face a qualquer oposição passível de surgir – mormente do arcebispo de Braga, D. João Crisóstomo de Amorim Pessoa (1810-1888), cuja antipatia pela reforma em causa, pelas perdas que acarretava à Arquidiocese primaz, era pública – e perante a acomodação reticente da generalidade dos demais prelados, impor a efetiva aceitação do decreto pontifício da extinção das dioceses mencionadas.
O cardeal D. Américo fora nomeado executor da bula de instituição das novas circunscrições episcopais de Portugal continental no próprio decreto de redução das dioceses, assinado, como se sabe, por Leão XIII. O próprio Governo de Sua Majestade, D. Luís, então chefiado pelo progressista António Maria de Fontes Pereira de Melo (terceira vez chefe de governo, entre 14 de novembro de 1881 e 20 de fevereiro de 1886), dirigira imediato aviso régio ao Cardeal, para que procedesse à efetiva execução da bula papal.
Na sua sentença, lavrada no paço episcopal do Porto, a 4 de setembro desse ano de 1882, D. Américo enunciou os principais passos legais que a reforma e extinção dos bispados portugueses seguira até esse momento: a Lei de 20 de abril de 1876 – que autorizava o Governo, chefiado segunda vez por António Maria de Fontes Pereira de Melo, a proceder, de acordo com a Santa Sé, à anexação, redução e nova divisão das dioceses do Reino –, a carta enviada ao Santo Padre, pelo rei D. Luís, sobre o assunto, assim como a ata da reunião dos prelados do Reino com o ministro dos Negócios Eclesiásticos, Adriano de Abreu Cardoso Machado, celebrada em Lisboa, entre 15 e 21 de novembro de 1880, ata essa assinada precisamente no dia 20 desse mês, em que havia sido aceite e votada a redução de 17 para 12 dioceses. Nesta reunião compareceram os prelados seguintes: o Cardeal D. Américo, bispo do Porto, D. João Crisóstomo, arcebispo de Braga, D. António Honorato, vigário geral de Lisboa, D. António da Trindade, bispo de Lamego, D. Manuel Bastos Pina, bispo de Coimbra e D. José Carvalho Martens, bispo de Bragança, tendo faltado D. Inácio, patriarca de Lisboa, e D. António Martins, bispo de Viseu. Avocava-se, ainda, na sentença executória da extinção das cinco dioceses, a Carta de Lei de 27 de julho de 1882, a informação governamental contendo o censo de habitantes e o número preciso das paroquiais que integravam as novas circunscrições episcopais, assim como a anuência do bispo de Orense, em Espanha, quanto à passagem para Braga das freguesias de S. Pedro de Tourém e de Santa Maria de Lama de Arcos.
A sentença de D. Américo, que extingue também as prelazias dos isentos de Tomar e do Grão-Priorado do Hospital em Portugal, recapitula os parágrafos essenciais da bula do Papa Leão XIII, elogiosa para o Portugal que expandira pelos quatro cantos do Mundo a Boa Nova, reservada quanto aos novos tempos e às vicissitudes que vinham fazendo decair o catolicismo lusitano, esperançosa em que a supressão das dioceses que decretava fosse um mal menor face à promessa do Governo português, acordada tácita e diplomaticamente com a Santa Sé, por mediação do Marquês de Tomar, embaixador junto da Santa Sé, em concorrer para a melhoria do exercício pastoral dos fiéis diocesanos, da dignidade do clero e da sua instrução, para a qual havia o compromisso da criação e dotação de seminários capazes.
Extinta a Diocese de Leira, a catedral, o seminário e 25 das suas paróquias, situadas nos concelhos de Leiria e de Pombal, foram integradas no Bispado de Coimbra. As demais paróquias do extinto Bispado de Leiria, por outro lado, foram integradas no Patriarcado de Lisboa. A sé de Leiria, todavia, ficou, durante largos meses, sem qualquer dotação para prover à sua conservação e celebração decente do culto divino, precaridade que o Governo português só em 1884 mostrava querer resolver, atribuindo então à junta de paróquia da Sé de Leiria os bens mobiliários que haviam pertencido à fábrica da antiga catedral.
Saul António Gomes
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