A busca pelo sentido da vida é uma travessia silenciosa, onde cada passo é uma oração e cada pausa, um momento de reflexão. Desde os primórdios, a humanidade ergue os olhos para o céu, tentando encontrar respostas para os seus enigmas. Na jornada dos Reis Magos, vemos o reflexo dessa procura: homens que deixam para trás o conforto do conhecido e seguem uma luz que desafia as suas certezas. A estrela, esse sinal divino no céu, é a metáfora da Revelação, que, como sublinha o Concílio Vaticano II, é um “convite ao encontro com Deus, que deseja comunicar-se a Si mesmo” (Dei Verbum, 2).
Os Magos não são apenas viajantes, são peregrinos. A sua caminhada lembra-nos que a fé é um movimento constante: não se guarda, vive-se. Como Abraão, que partiu sem mapas ou garantias, os Magos avançam confiando numa promessa que só os olhos do coração conseguem enxergar. Santo Agostinho descreve esta inquietação humana: “Fizeste-nos, Senhor, para Vós, e o nosso coração está inquieto enquanto não repousar em Vós” (Confissões, I, 1).
Os presentes dos Magos são carregados de significado. O ouro simboliza a realeza de Cristo, o incenso destaca a sua divindade e a mirra aponta para a sua entrega até à morte. Mais do que simples ofertas materiais, são expressões de uma fé que se entrega por completo. Esses dons representam a vida humana oferecida inteiramente a Cristo, como um presente sem reservas.
A caminhada da fé nem sempre é reta. No percurso, os Magos encontram Herodes, símbolo do poder fechado em si mesmo, que teme a luz e prefere a escuridão. O Papa Francisco, na Evangelii Gaudium, fala do mundanismo espiritual, que pode esconder-se por trás de aparências religiosas, mas procura mais o reconhecimento humano do que a glória de Deus: “Como vos é possível acreditar, se andais à procura da glória uns dos outros, e não procurais a glória que vem do Deus único?” (Jo 5, 44).
Guiados por um Espírito que supera as limitações humanas, os Magos escolhem um caminho diferente. Francisco alerta: “Hoje em dia, tornou-se particularmente necessária a capacidade de discernimento, porque a vida atual oferece enormes possibilidades de ação e distração, sendo-nos apresentadas pelo mundo como se fossem todas válidas e boas” (Gaudete et Exsultate, 167).
A atitude dos Magos reflete humildade. Eles curvam-se diante do Menino, reconhecendo na sua simplicidade a grandeza de Deus. São Paulo diz: “Por isso me alegro nas fraquezas, nas afrontas, nas necessidades, nas perseguições e nas angústias, por Cristo. Pois quando sou fraco, então é porque sou forte” (2 Cor 12, 10). Esta cena convida-nos a despirmo-nos do supérfluo e a aprender a adorar no essencial.
Quando regressam, os Magos seguem por outro caminho. Essa mudança não é apenas geográfica, mas espiritual. Encontrar Cristo é sempre um convite à conversão, a seguir em frente por novos caminhos. Isaías proclama: “Levanta-te, resplandece, Jerusalém, que está a chegar a tua luz! A glória do Senhor amanhece sobre ti!” (Is 60, 1). Assim, na travessia, acontece o renascimento.
A Igreja, em processo sinodal, é chamada a aprender com os Magos. “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje são também as alegrias e esperanças, as tristezas e angústias dos discípulos de Cristo” (Gaudium et Spes, 1). Precisamos de comunidades abertas, que acolham, promovam o encontro e respeitem o mistério da fé. “Vós sois todos irmãos” (Mt 23, 8) (Fratelli Tutti, 95).
A encíclica Lumen Fidei recorda que a fé não só olha para Jesus, mas também vê com os olhos de Jesus: “Precisamos também de alguém que seja fiável e perito nas coisas de Deus: Jesus, seu Filho, apresenta-Se como Aquele que nos explica Deus” (cf. Jo 1, 18) (LF, 18).
“A alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus” (Evangelii Gaudium, 1). O Papa Francisco lembra-nos em Fratelli Tutti: “Ninguém pode enfrentar a vida isoladamente (…); precisamos duma comunidade que nos apoie, que nos auxilie e dentro da qual nos ajudemos mutuamente a olhar em frente. Sonhemos como uma única humanidade, como caminhantes da mesma carne humana, como filhos desta mesma terra que nos alberga a todos” (FT, 8).
Que esta peregrinação nos inspire a ser buscadores da verdade, portadores da luz e artesãos da esperança. E que, como os Magos, possamos seguir por novos caminhos, levando connosco a estrela que aponta para um horizonte de comunhão e justiça.