O GPS de Deus 

Participei há uns dias numa celebração de entrega da Bíblia a alunos do 4.º ano de escolaridade. Celebravam a sua Festa da Palavra. Durante a homilia, o celebrante questionou a assembleia sobre o que era a Bíblia e de como poderíamos explicar, nos nossos dias, o que era esse livro. Uma das crianças tomou a palavra e disse: a Bíblia é «uma espécie de GPS que nos guia até Deus». A palavra e a sabedoria dos mais novos deram uma boa definição. A Bíblia tem o mapa, dá a localização e oferece as orientações para encontrar o caminho da felicidade até Deus através do amor a todos os seres humanos. 

Escrevo sobre este assunto porque o Papa Francisco, desde há seis anos, instituiu a celebração do Domingo da Palavra de Deus, perto ou durante a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos que se assinala sempre de 18 a 25 de janeiro. Este ano o tema é «Espero na Tua Palavra (Salmo 119, 74). 

A Bíblia é uma das obras matrizes da nossa cultura. Muitos de nós, mesmo não crentes ou praticantes, citamo-la sem saber, em expressões e provérbios. A Bíblia, para quem a lê e conhece, é uma fonte de inspiração inesgotável. Escritores, músicos, poetas, argumentistas, e artistas de tantas áreas e de várias eras foram e continuam a ir até aos textos bíblicos para beber lá inspiração para as suas obras.

Quando leciono aos meus alunos o capítulo «Arte Cristã», no ensino secundário, todos os anos vejo a mesma reação de como é possível a Bíblia estar tão presente na nossa cultura e nós nem nos apercebemos. A conclusão pode ser simples – não nos apercebemos porque nunca lemos ou desconhecemos os textos bíblicos. 

Quando lhes revelo que obras literárias ou cinematográficas que eles conhecem têm inspiração bíblica, como as trilogias e sagas do Senhor dos Anéis e Hobbit, as Crónicas de Nárnia, Guerra das Estrelas. Super-heróis como a Mulher Maravilha e Super-Homem, ou poetas como Sophia de Mello Breyner, Miguel Torga e Saramago, entre tantos outros, foram buscar à Bíblia a inspiração para aquilo que escreveram, mesmo até, por vezes, contra a fé estabelecida. 

Não nos podemos esquecer de que a Bíblia foi o primeiro livro a ser impresso, no século XV; é o livro mais traduzido em todo o mundo – mais de 650 línguas atingindo quase 6 mil milhões de pessoas; é o livro mais vendido e o único que tem uma passagem sua na superfície lunar levada pela missão Apollo 11 em 1969. 

Ler a Bíblia é mergulhar na história da Humanidade, conhecendo mais de 40 autores de todas as condições sociais e que, ao longo de 1600 anos, nos transmitiram a sabedoria do berço da civilização humana ocidental, a partir do Crescente Fértil e do Mediterrâneo. 

Em Portugal, a Bíblia continua a ser obra de interesse, veja-se o exemplo do Professor Frederico Lourenço que traduziu recentemente para português toda a Bíblia, a partir da Bíblia em grego dos LXX e a Conferência Episcopal Portuguesa que há vários meses, publica, no primeiro dia de cada mês, a proposta de tradução de um livro da Bíblia para português contemporâneo. Serão 73 meses de publicação, tantos quantos o cânone católico de livros bíblicos.

Há que mergulhar nas páginas da Bíblia, conhecendo a sua História e histórias, aprender a entendê-la e interpretá-la segundo a exegese e as regras gramaticais e lexicais. Saber que ela possuiu vários géneros literários: narrativas, poemas, canções, ficção, e por aí adiante. Se, como dizia, um ex-presidiário, dessem e lessem as Bíblias na infância e juventude, e não apenas quando já estão na prisão, o mundo poderia ser um pouco melhor.

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