“Avança para águas mais profundas” (Lc 5,4). As palavras de Cristo chegam até nós como uma brisa leve e, ao mesmo tempo, como um vento forte que impele à travessia. São convite e promessa, são porto e horizonte. Ele diz-nos que a vida da fé não se vive à superfície, mas no mistério das águas profundas, onde só quem arrisca o passo ousado da confiança pode verdadeiramente encontrar-se.
A barca que parte e a que chega são a mesma, porque a vida é feita de despedidas e reencontros, de raízes e de voo. “O vento sopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem nem para onde vai” (Jo 3,8). Assim também é a nossa caminhada: uma peregrinação do coração, um ir que é também um regressar, um caminho onde o passado se torna gratidão e o futuro, esperança. A Igreja é esse grande espaço de travessia, esse lugar de todos os começos, essa casa onde os passos se fazem uns com os outros.
Às comunidades: Vós sois o rosto visível do amor de Deus. Nos gestos simples do dia a dia — no acolhimento silencioso, na palavra que reconforta, na escuta sem pressa — pulsa o Evangelho. “Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se tornar insípido, com que se há de salgar?” (Mt 5,13). Sede esse sal que dá sabor à vida, essa luz discreta que ilumina sem ofuscar. Que sejais comunidades onde há lugar para todos, onde ninguém se sinta estrangeiro, onde cada abraço seja um regresso a casa.
Ser comunidade é também aprender a deixar partir e a acolher. Há sempre um pedaço de nós que fica com aqueles que seguem novos rumos, e há sempre um espaço em nós para aqueles que chegam. “Sede hospitaleiros uns com os outros, sem murmuração” (1Pe 4,9). A Igreja é este abraço contínuo entre o deixar ir e o receber, entre a gratidão por quem partiu e a esperança por quem chega. Que os que chegam sintam os nossos braços abertos, sem reservas, sem hesitação, pois em cada rosto novo há uma história de fé que se entrelaça na nossa.
A Igreja não se ergue sobre pedras, mas sobre encontros. Não é feita de muros, mas de pontes. Não é um espaço de pertença fechada, mas um lugar onde cada um descobre, aos poucos, que já pertence.
Aos sacerdotes que deixam as suas casas por um novo destino: Partir é sempre um desafio. Implica deixar paisagens conhecidas e aprender a escutar de novo os passos sobre um chão diferente. Mas a vida da fé é este caminho que nos desinstala, este partir sem saber muito bem onde chegaremos. “Se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os que a constroem” (Sl 127,1).
Que, ao cruzardes o vosso olhar com o nosso, sintais que pertencemos uns aos outros. Que os rostos que encontrardes sejam casa e que cada gesto vos faça sentir que aqui também é lar. Deus já vos esperava nesta terra nova, como esperou Abraão quando lhe disse: “Sai da tua terra e vai para o lugar que Eu te mostrar” (Gn 12,1).
Sobre as unidades pastorais: O caminho da comunhão faz-se devagar, passo a passo, na escuta paciente e no serviço generoso. Há momentos em que parece que falamos línguas diferentes e outros em que descobrimos que o que nos une é muito maior do que o que nos separa. “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mt 18,20).
As unidades pastorais não são apenas uma reorganização; são um apelo à escuta e ao encontro. São um convite a um novo modo de ser Igreja: não cada um no seu canto, mas juntos, em sinfonia.
Aos sacerdotes que partem: A vossa presença não se apaga com a distância. O que construístes continua a dar fruto. “Aquele que começou em vós a boa obra há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus” (Fl 1,6). A vossa passagem é memória que se entranha na história desta terra, como uma raiz que, mesmo invisível, continua a sustentar a árvore da fé.
Levai-nos convosco, porque também ficamos em vós. Que a vossa missão continue a ser luz para muitos, que os vossos passos levem sempre a ternura de Deus onde for mais necessária.
Ao nosso bispo: A vossa presença é sinal de unidade, o vosso pastoreio é farol no caminho. “Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,17). A vossa palavra fortalece-nos, a vossa proximidade encoraja-nos, o vosso testemunho inspira-nos a viver a fé com mais profundidade.
Obrigado por nos recordardes que a Igreja se constrói na escuta e no dom de si, no serviço humilde e na alegria de quem sabe que o Reino cresce, mesmo quando não se vê. Rezamos por vós, porque a missão nunca é solitária, mas sempre um caminho partilhado.
Aos que continuam a caminhar juntos: A fé não se vive na espera, mas na travessia. Não basta abrir as portas das igrejas, é preciso abrir o coração. “Não ardia cá dentro o nosso coração quando Ele nos falava pelo caminho?” (Lc 24,32).
Sermos comunidade é aprendermos a viver uns com os outros, sem pressa, sem medo, sem reservas. É partilharmos o pão e a vida, os dias de festa e os dias de silêncio, a certeza e a busca.
Agora é tempo: tempo de confiar, de lançar sementes, de permanecer disponíveis. “Os que semeiam entre lágrimas, recolhem com alegria” (Sl 126,5). Tempo de recomeçar, de ir mais longe, de se deixar transformar pelo Evangelho.
Vamos ao largo: com a confiança de quem sabe que Deus nos conduz, com a gratidão de quem recebeu muito, com a esperança de quem acredita que cada passo dado na fé transforma o mundo à nossa volta.
“O Senhor é minha luz e minha salvação; a quem temerei?” (Sl 27,1).
O Mestre está no leme e diz-nos: “Não tenhais medo” (Mt 14,27).
Caminhemos juntos, com leveza e profundidade, com silêncio e com canto, com fé e com vida. Que cada desafio seja um novo começo, que cada chegada nos torne mais próximos, que cada rosto seja um reflexo da ternura de Deus. Unidos, seremos sempre uma Igreja que é casa, caminho e missão.
E que possamos abraçar esta transformação e, pelo Batismo, ser uma Igreja viva e peregrina, audaz na fé, firme na esperança e incansável no amor.