É este o título de um ensaio da teóloga alemã Jutta Burggraf. Aí analisa as reacções normais do homem perante a ofensa, esclarece-nos e aconselha-nos.
O primeiro facto que aponta refere-se à nossa capacidade de perdoar com um sorriso a pisadela sofrida num autocarro. Isso deve-se à certeza de que não havia intenção de magoar e de o agressor ser um desconhecido: o episódio, provavelmente, não se repetirá. Por outras palavras, não há nestes casos uma ofensa real. Ela só existe se há intenção de ferir. Só perante uma verdadeira ofensa é lícito falar-se em perdão.
As torturas, materiais ou espirituais, podem aparecer diariamente nas prisões, hospitais, trabalho e até na própria família. Muitas vezes, o sofrimento é ampliado por incompreensão, troça ou desprezo, porque os padecimentos alheios são fáceis de suportar. Ninguém nos consegue fazer sofrer mais do que aqueles que deviam amar-nos. Jutta cita um dito árabe: “A única dor que destrói mais do que o ferro é a injustiça que procede dos nossos familiares.”
Pode reagir-se de modos diferentes face às injúrias recebidas. Uma consiste na vingança (dente por dente…), outra no endurecimento do coração para não sofrer mais e a terceira no perdão.
A vingança pode comparar-se ao comportamento da pessoa que, mordida por uma víbora, corre atrás dela para a matar. Enquanto o faz, o veneno vai-se espalhando pelo seu corpo até lhe causar a morte. Vingou-se, evitou que essa víbora voltasse a ferir, mas sucumbiu ao veneno. A metáfora ainda fica aquém da realidade porque, consumada a vingança, fecha-se mais uma porta no caminho para a reconciliação e abrem-se muitas mais, de amigos e familiares do agressor, a novas vinganças. Assim começam as guerras.
O endurecimento do coração impede a aproximação de pessoas generosas e amáveis. A desconfiança geral atinge todos sem discriminação. É, portanto, uma forma de injustiça, uma agressão a qualquer que tenta aproximar-se.
O perdão consiste em renunciar à vingança e em desejar, apesar de tudo, o melhor para o outro. Esta atitude, sim, é a única capaz de romper um elo na cadeia das vinganças e permitir que volte a paz. É um trabalho árduo e, talvez, moroso. Fundamenta-se na maior qualidade do homem, a de exercer a sua livre vontade, contrariando os seus sentimentos. Seguindo a metáfora anterior, pode comparar-se à pessoa que, picada pela víbora, chupa a ferida cuspindo o veneno. A boca poderá inchar e algum resto do veneno espalhar-se pelo organismo, mas como este tem defesas suficientes para o combater, ficará fortalecido e enriquecido como se tivesse recebido um antídoto.
No Natal, somos convidados a adorar o Deus que, para perdoar todos os homens, se fez homem também, e se dispôs a sofrer e morrer por eles. Como Deus, é impassível por não ter corpo; como é um espírito puríssimo, sofre como um pai que vê o filho encaminhar-se para uma vida de mentira, perigo e sofrimento.
Estão guerras a decorrer e teme-se que algumas delas arrastem países, e até continentes, para uma destruidora guerra mundial. Durante o Advento, estas quatro semanas anteriores ao Natal, devemos encorajar-nos a perdoar às pessoas que nos ofenderam e a pedir perdão a este Deus que todos nós temos ofendido e sempre nos tem perdoado em cada confissão. É um bom Professor na difícil disciplina do perdão.
A paz e união nas famílias leva à paz e união entre os povos. A confissão leva à paz com Deus.