Nesta época que atravessamos repetimos muitas vezes a expressão popular “Ano novo, vida nova”. Este adágio traduz o desejo de melhoria que em todos existe, o desejo de evoluir num sentido positivo, o desejo de mudar para melhor. Sendo um desejo, indubitavelmente bem-intencionado, sucede que no dia 2 de Janeiro provavelmente já o vento o levou, precisamente porque é apenas um desejo. Falta-lhe, talvez, a consistência de uma rocha onde possa ser alicerçado, a referência para um caminho a seguir, a força interior que o concretiza na vida.
No título que começa este artigo podemos entrever também um desejo semelhante, que a todos envolve nas nossas comunidades paroquiais, onde se sente a necessidade de melhorar, de evoluir num sentido positivo, de concretizar na vida a fé professada.
Só que, no caso deste título, não se trata simplesmente de um desejo, porque está construído sobre rocha sólida, a Palavra de Deus, tem uma referência a quem seguimos, Cristo Jesus, e recebe uma força, a do Espírito Santo, que a todos repassa e envolve quando O pedimos. Isso significa que, não sendo apenas um desejo, é já uma realidade que está sendo construída mas ainda não concluída.
Apesar de muitas vezes sentirmos desânimo porque “cada vez são menos os que praticam” ou “há cada vez menos padres” ou “são sempre os mesmos”, o que sucede é que há sinais fortes diante dos nossos olhos, existem realidades a florescer mesmo ao nosso lado e vemos pessoas que sentem o chamamento à missão baptismal de anunciar a todos (todos, todos) a alegria de caminhar com Jesus em Igreja, a riqueza da vida nova oferecida por Deus, a necessidade de proclamar ao mundo a novidade do Amor revelado na Cruz. Pessoas que se sentem chamadas a mudar de vida e a sair das suas seguranças, num imperativo que surge de onde menos se espera, que testemunhamos, que temos a felicidade de presenciar e no qual temos o privilégio de poder participar.
Há poucos meses tivemos um acontecimento histórico no nosso país, que transformou muitas vidas, que foi um sinal claro da força do Evangelho e um estímulo para todos nós: a Jornada Mundial da Juventude, incluindo a pré-jornada e o tempo da preparação, bem como as ressonâncias e consequências posteriores.
Outro acontecimento relevante, que acontecerá dentro de poucos meses, é a conclusão do Sínodo dos Bispos, actualmente em curso, que teve desde a sua convocatória a participação activa de todas as dioceses no mundo inteiro e das paróquias da nossa diocese. Essa participação, que continua a convidar-nos a uma atitude de escuta uns dos outros e de todos escutando o Espírito Santo, prossegue ainda e desenvolver-se-á com renovada vitalidade após a publicação da Exortação Apostólica do Santo Padre.
Sinal de renovação profunda é também o novo “Itinerário de Iniciação à Vida Cristã das Crianças e dos Adolescentes com as Famílias”, aprovado pela Conferência Episcopal Portuguesa em Abril de 2022, que irá mudar profundamente o método da acção pastoral com as famílias em termos de catequese. Esse processo é encarado de diferentes maneiras por todas as pessoas que dele já têm conhecimento: com reservas, com esperanças, com receios, alguns com sentimento de rejeição, outros com a certeza de que é uma mudança desafiante mas que produzirá frutos abundantes, os quais ajudarão a concretizar o grande desejo de paróquias renovadas. Certeza essa que advém do facto de nalgumas delas, onde esses passos hesitantes começaram a ser dados há alguns anos, se colherem já frutos surpreendentes e admiráveis.
Convergindo nesta necessidade de renovação, de abertura ao Espírito Santo, de saída em atitude missionária, de escuta mútua, de acolhimento e de serviço ao próximo, temos também nas nossas mãos a Carta Pastoral 2023-2026 do nosso Bispo, D. José Ornelas, que sintetiza no seu título esta necessidade, esta urgência de nos levantarmos e sairmos apressadamente: “Pelo Baptismo somos Igreja Viva e Peregrina”.
A sua leitura é fundamental neste momento. Desafios importantes nos são colocados. Deles devemos tomar conhecimento, bem como das dificuldades e oportunidades que existem, das ideias que nos são propostas, das responsabilidades que nos são pedidas. Participar na reflexão e debate em torno desta Carta Pastoral é uma recomendação, uma necessidade, um imperativo para todos os diocesanos. Na escuta uns dos outros, todos atentos aos sinais do Espírito Santo, numa atitude de acolhimento, de participação, de co-responsabilidade, de intensificação da nossa oração.
Trabalhando apoiados na rocha que é a Palavra de Deus, acompanhados no caminho com Cristo ressuscitado, iluminados e movidos pelo Espírito Santo, viveremos certamente a alegria de termos paróquias renovadas, num contínuo espírito de Advento, festejando a incarnação e o Natal de Deus connosco, na certeza de uma Vida eterna a partir de um Pentecostes que aconteça em todos nós.
A promessa de Isaías, “pois vou realizar algo de novo, que já está a aparecer: Não o notais?” (Is 43, 19a) confirma-se no salmo 22 (23), 31.32, que Jesus começou a rezar no alto da Cruz (“Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?”) e que culmina naqueles versículos: “Uma nova geração o servirá e narrará aos vindouros as maravilhas do Senhor; ao povo que vai nascer dará a conhecer a sua justiça, contará o que Ele fez.”
Saibamos nós corresponder ao novo Pentecostes que nos chama a sair em Missão.