Liberdade religiosa: um direito, não um privilégio nas sociedades ocidentais

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O panorama apresentado pelo recente relatório da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre sobre a liberdade religiosa é, de facto, preocupante pela radicalização de opostos mais ou menos identificados que acabam por nos atingir onde quer que vivamos no mundo. Se os principais fatores que condicionam a prática religiosa são o autoritarismo, com as leis à medida destinadas a limitar movimentos e encontro de pessoas, e o extremismo, muitas vezes escondendo interesses económicos e políticos, percebemos também como os meios persecutórios pretendem abolir por completo a e os discriminatórios procuram torná-la um mero adorno sem expressão humana.

Também não deixa de ser confrangedor reparar como nas sociedades ocidentais se olha para este triste fenómeno ao longe, como se isso lhes fosse alheio, começando por não darem valor à enorme coragem de populações que arriscam a vida para manterem o vínculo com o que de mais humano existe no homem. A crença numa plenitude à medida de toda a perfeição que o envolve na terra e nos céus. E depois por, de forma tão despercebida, ao jeito do politicamente correto, promoverem precisamente o descrédito e os preconceitos sobre quem professa uma religião e vive de acordo com esse compromisso.

Portanto, não é de descartar situações nas sociedades ocidentais onde o autoritarismo e o extremismo são substituídos por cenários com ídolos e influencers a precisarem de atenção para manipularem espetadores desprevenidos, usando os media para difundir depreciações e estigmas que resultam em dissimuladas discriminações e perseguições. Claro que estaríamos aqui a insinuar complots ou conspirações obscuras, mas basta estar atento aos media para perceber como, de forma tão cínica, se tenta vender banha da cobra em telenovelas onde ainda se insiste numa interpretação psicopata da Bíblia para justificar enredos criminosos. Figuras públicas a dizerem que a justiça de Deus ainda é mais lenta que a dos homens. Opiniões de personagens televisivos que denunciam a inutilidade de Deus perante cataclismos. Isto não considerando as ofensas à quando, a pretexto de humores, se abusa dos nomes sagrados. Tudo isto funciona como ideologia de pop up mediático, destinada a influenciar escolhas e opiniões a partir de um atrevimento primário e necessidade de afirmação que depois ditam a tal discriminação e perseguição. Como é o caso de se montarem situações destinadas a gerar comportamentos logo chamados fundamentalistas. Forçam-se mesmo conversas só para ouvir aquela palavra do vocabulário religioso para tão grosseiramente se diagnosticar uma obsessão religiosa. Reparamos ainda quando se tenta inibir alguém publicamente, identificando-o com a Igreja ou a simples leitura da Bíblia.

Se o senso comum já sabia da perturbação conhecida como mania da perseguição, passou a achar-se também habilitado a identificar supostos casos de distúrbio religioso, nunca sendo tarde para se pôr em prática os comentários divulgados por figuras mediáticas, afinal também se fica no retrato.

Ainda que no mapa não surja nenhum país dito desenvolvido, é de recear um recuo nessas sociedades cuja crença está antes em tudo o que brilha pequenino nas mãos onde cabe uma ténue existência ligeiramente descolada do pó da terra. Percebemos como um homem cada vez mais rodeado por tecnologia se torna tão vulnerável, acreditando em tudo o que lhe mostram, como se ainda criança deixa-se levar pelas primeiras impressões, reduzindo a vida a uma breve sensação. A religião torna-se um estorvo, apresentando referenciais elevados em sintonia com a necessidade do homem em completar-se. Ora, é isto que vemos ser cada vez menos possível nas sociedades atuais e por isso a liberdade religiosa, apesar de ditada em lei, torna-se letra morta nos meios protocolares e discursivos.

A indiferença nas nossas sociedades esvazia a liberdade religiosa e a AIS não deixa escapar esta realidade: “Este relatório regista um amplo espectro de violações da liberdade religiosa, refletindo a diversidade e a complexidade do contexto global. Em vários países, estas violações manifestam-se como violência explícita (…) Noutros surgem sob formas mais discretas, mas igualmente prejudiciais, como obstáculos burocráticos, censura, proibições à educação religiosa e vários tipos de discriminação social”.

Por este motivo, o lema da petição apresentada pela Fundação AIS vem mesmo a propósito: “A liberdade religiosa é um direito, não um privilégio”. Mas podíamos reforçar a sua urgência, dizendo que, mais do que um direito, a liberdade religiosa é a única via para manter no homem traços de humanidade. Sem acreditar que ele é criado para dimensões muito além da materialidade do mundo, ele nunca realiza plenamente o que o distingue como único e irrepetível em tudo o que existe.

Este relatório da Fundação AIS mostra-nos como a religião é indispensável para conhecer o homem. Negá-la é diminuí-lo, fechar-lhe horizontes de crescimento infinito, é confiná-lo na lógica produtiva destinado ao consumo e a desaparecer como tudo o resto.

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