A doença é a experiência da nossa fragilidade, vulnerabilidade e ameaça da finitude da vida. Por isso, perturba-nos e abala-nos. Além da dor, traz consigo insegurança, incerteza, medo e angústia. Afeta o corpo e a alma, todo o nosso ser, viver e conviver. E também as nossas relações. Costumo dizer que, quando o corpo enfraquece, é preciso fortalecer a alma, para que seja esta a suportar aquele e assim a pessoa humana atravesse a doença com esperança, fortaleza e e confiança. Recordo alguém que vivia a sua doença assim, com grande fé e vigor espiritual, pelo que dizia: “não sou doente, tenho simplesmente um problema e estou a tratá-lo”. E fazia-o com a ajuda dos profissionais e instituições de saúde e igualmente com a oração e uma vivência admirável da fé. Foi nesse sentido, que a certa altura pediu a Santa Unção, que recebeu mais do que uma vez até à sua morte, que encarou como ir ao encontro de Jesus, que tinha estado muito presente na sua vida e na doença. A espiritualidade e a fé são ajudas imprescindíveis na doença. Não a tornam mais fácil, é certo, mas garantem que não se está só na luta pelas melhoras ou na passagem para o “outro lado da vida”, para a “casa do Pai”, como confessam os cristãos.
Entre os apoios para os doentes, além das obras de misericórdia do cuidado, da visita e da oração, a Igreja tem os sacramentos da Santa Unção e da Eucaristia. Esta é muitas vezes participada, através da televisão, em casa, ao domingo, e concluída com a presença de um ministro extraordinário que leva ao doente a comunhão sacramental. A Santa Unção é pedida pela família ou então proposta aos doentes em certas situações. Um dia destes, uma senhora, adolorada e comovida, pediu-me para ir dar a Santa Unção à sua mãe doente, na própria casa. Fui sem demora. A doente quis primeiro receber o sacramento da Reconciliação. Depois, com a participação da própria família, celebrámos a Santa Unção.
O que é este Sacramento?
A Unção dos Enfermos ou Doentes “permite-nos ver concretamente a compaixão de Deus pelo homem”, diz o Papa Francisco. No passado – lembra – era chamado «Extrema Unção», porque se entendia como conforto espiritual na iminência da morte. Atualmente, “ao contrário, falar de «Unção dos enfermos» ajuda-nos a alargar o olhar para a experiência da doença e do sofrimento, no horizonte da misericórdia de Deus.”
Em 2014, na sua catequese sobre este sacramento, que estou a citar, o Papa Francisco incentivou à sua celebração, sem medo e com confiança, pois, através dele, “é o próprio Jesus que se aproxima”. Depois, comenta: “Mas na presença de um doente, por vezes, pensa-se: «chamemos o sacerdote para que venha»; «Não, dá azar, não o chamemos», ou então, «o doente assusta-se». Por que se pensa assim? Porque um pouco há a ideia de que, depois do sacerdote, venha a agência funerária. E isto não é verdade. O sacerdote vem para ajudar o doente ou o idoso; por isso, é tão importante a visita dos sacerdotes aos doentes. É preciso chamar o sacerdote para junto do doente e dizer: «venha, dê-lhe a unção, abençoe-o». É o próprio Jesus que chega para aliviar o doente, para lhe dar força, para lhe dar esperança, para o ajudar; também para lhe perdoar os pecados. E isto é muito bonito! E não se deve pensar que isto seja um tabu, porque é sempre bom saber que no momento da dor e da doença não estamos sós: com efeito, o sacerdote e quantos estão presentes durante a Unção dos enfermos representam toda a comunidade cristã que, como um único corpo se
estreita em volta de quem sofre e dos familiares, alimentando neles a fé e a esperança, e apoiando-os com a oração e com o calor fraterno. Mas o maior conforto provém do facto de que quem está presente no Sacramento é o próprio Senhor Jesus, que nos guia pela mão, nos acaricia como fazia com os doentes e nos recorda que já lhe pertencemos e que nada — nem sequer o mal nem a morte — jamais nos poderá separar d’Ele. Temos este hábito de chamar o sacerdote para que aos nossos doentes — não digo doentes de gripe, uma doença de 3-4 dias, mas quando é uma doença séria — e também para os nossos idosos, venha dar-lhes este Sacramento, este conforto, esta força de Jesus para ir em frente? Façamo-lo!”
A prática da visita dos sacerdotes aos doentes para lhes anunciar a palavra de Deus, impor as mãos, fazer oração e os ungir com o óleo santo – que é azeite benzido – já vem desde o tempo dos Apóstolos. Na Carta de S. Tiago, recomenda-se: «Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da Igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com óleo, em nome do Senhor. E a oração da fé salvará o enfermo, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados» (5, 14-15). Diz anda o Papa: “Jesus ensinou aos seus discípulos a ter a sua mesma predileção pelos doentes e pelos sofredores e transmitiu-lhes a capacidade e a tarefa de continuar a conceder, em seu nome e segundo o seu coração, alívio e paz, através da graça especial deste Sacramento. Mas isto não nos deve fazer cair na busca obstinada do milagre ou na presunção de poder obter sempre e apesar de tudo a cura.”
Quais os efeitos do Sacramento e onde se celebra?
Muitos padres e eu próprio somos testemunhas de melhoras físicas e espirituais que com frequência os doentes experimentam pela graça própria do Sacramento da Santa Unção. Uma senhora confirma: “Sou testemunha disso, durante os meus 38 anos profissionais. Quantos aguardavam que chegasse o sacerdote com a Unção dos Enfermos para partirem para o Pai, outros melhoraram, saíram e continuaram as suas vidas”. Às vezes, uma inesperada recuperação da saúde leva familiares e mesmo profissionais da saúde a pensarem que pode ter acontecido um milagre.
A Unção dos Doentes pode, portanto, ajudá-los a recuperar, dar força espiritual e confiança, que contribuem para uma evolução positiva na saúde, tranquilizar e suscitar paz interior. E também prepara para a morte, quando esta acontece, levando o doente a aceitá-la na fé e na esperança na vida eterna.
Este Sacramento pode ser pedido pelo próprio doente, por familiares, profissionais de saúde ou pessoas amigas. Deve ser sempre apresentado de forma positiva como ajuda espiritual e presença de Jesus junto do doente, como o fazia na Palestina. Pode receber-se no hospital, no lar de idosos, no centro de cuidados paliativos, na própria casa, ou na igreja. Não é preciso estar à beira da morte, basta que se esteja numa doença grave ou que se vá submeter a uma operação de grande risco. Pode receber-se mais do que uma vez na vida e até na mesma doença, especialmente se houve agravamento do próprio estado.
Portanto, não tenhamos medo de falar deste Sacramento aos doentes e de o pedir para nós próprios, quando estivermos em situação de necessidade da graça divina que ele nos dá. E nós, pastores, com outros fiéis, pensemos e discirnamos como melhorar e renovar a pastoral deste sacramento, envolvendo a comunidade na sua celebração.