Foi com muito agrado que li os dois artigos publicados na REDE sobre a proteção de menores e adultos vulneráveis vítimas de abusos sexuais. O foco era a proteção em relação a abusadores / violadores que exerçam atividade na Igreja Católica.
Coincidências ou “deuscidências”, há três semanas chegou até mim o livro Proteção de menores e adultos vulneráveis – diretrizes, da autoria da Conferência Episcopal Portuguesa … e pensei é agora! Há algum tempo que queria escrever sobre o assunto impelida por ser um tema cada vez mais exposto pelas pessoas em consultas de saúde mental. Fico grata por poder ajudá-las a exporem este “fantasma” à luz de uma conversa franca e sem julgamentos. Fantasma que tem um nome – sofri abusos sexuais.
Percebi também, mas já os livros me diziam, que o contexto em que as pessoas (menores) são vítimas foi / é num contexto familiar ou de grande proximidade. Dito de uma forma crua, são traídas pelas pessoas mais significativas que as fingem amar. Na maioria das situações, segundo os livros da área e coincidente com a minha experiência, as vítimas são abusadas por familiares.
A questão é, como se processa tudo isto?
Para começar levantar a impunidade, neste caso louvo a atitude do Papa Francisco (no seguimento das orientações de Bento XVI).
Depois há que voltar a confiar, neste caso aconselho profissionais da área da saúde mental ou ligadas à proteção de vítimas. Expor o seu fantasma, chamá-lo pelo nome.
Num terceiro passo, saber que uma pessoa não se resume só a um papel de vítima, somos mais do que um trauma!
Num quarto passo apurar o que se sente face ao abuso. Raiva? Mágoa? Autopunição? Culpa? Revolta? Autoabandono?… E aceitar ajuda especializada tanto na área da saúde mental como na ajuda espiritual, pois faz parte do caminho resignificar a dor.
Um último passo, mais demorado é perdoar!
O perdão é um ato psicológico e espiritual, é uma fonte de crescimento e fortalecimento. Cada vez mais se fala na psicologia do perdão como fonte de resolução de traumas e recalcamentos. O perdão implica numa primeira fase um processo interno de trabalho árduo, mas frutífero. Depois vem a exteriorização desta reconstrução pessoal em que dizemos para nós próprios – já não quero a dor do passado no meu presente! Tenho que me libertar deste “fardo de dor”, deste fantasma que me atormenta. O melhor exemplo que poderei dar é quando Sua Santidade João Paulo II decide encontrar-se com o seu “quase assassino” Ali Agca e lhe dá o seu perdão. S. João Paulo II não o libertou da sua prisão física, mas libertou-se e libertou-o do ódio.