Maria Manuel Fonseca é superiora da comunidade das Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena e diretora do colégio Nossa Senhora de Fátima, em Leiria.
Nasceu na paróquia do Olival, Ourém, no berço de uma família “muito afetuosa”, que estimulou desde cedo o seu interesse pela Igreja. Foi ministra extraordinária da comunhão, catequista, visitou doentes e trabalhou na pastoral vocacional. Está há 45 anos no referido Colégio, uma obra da congregação dominicana. Foi lá que nos recebeu para falar sobre o seu percurso de vida, marcado pelo júbilo da fé.
Conversámos com a irmã Maria Manuel numa sala cimeira do edifício do Colégio Nossa Senhora de Fátima (CNSF). Uma vidraça recorta a parede que dá para o exterior e oferece uma panorâmica que conduz o olhar da colina do castelo até à cidade, sobre o topo do casario da zona histórica. Quando ali chegou, em 1969, aquela instituição limitava-se a um pequeno edifício, na rua do Padre António, onde existia o primeiro bairro social da cidade e onde estudavam cerca de cem alunas. Hoje, tem mais de quinhentos alunos e compreende um espaço que foi sendo construído “com muito sacrifício”. Naquela altura, os diferentes cargos exigidos pela prática do ensino eram garantidos, maioritariamente, pelas irmãs da congregação. Este espírito versátil de entrega caracterizava também o dia a dia sobrecarregado da irmã Maria Manuel que, três anos após a sua chegada, assumiu as funções de diretora do colégio. Entre as aulas que dava, história ou português e Educação Moral e Religiosa Católica, assumiu e acompanhou de perto a remodelação total do colégio, que veio substituir o antigo edifício em degradação. Em 2010, deixou o cargo de diretora pedagógica e continuou com a responsabilidade de diretora geral.
A disponibilidade é, para quem conhece a sua entrega à ação do CNSF, o termo que melhor se adequa à sua pessoa. Reconhece que é exigente consigo própria e, por extensão, com os que a rodeiam, mas sempre com “alguma flexibilidade”.
O entusiasmo por Jesus
A irmã Maria Manuel é a mais nova de seis filhos, de uma família “muito afetuosa”. “A minha mãe, quando eu nasci, já tinha 42 anos e os meus irmãos já eram todos muito crescidos: a mais nova tinha 10 anos e o mais velho 21.” Apesar da diferença geracional, todos a acolheram com ansiedade, conta. “Fui muito mimada!”
Até entrar para a Congregação, passou grande parte do seu tempo com duas das suas irmãs, que integravam ativamente, diversas dinâmicas na paróquia. A ligação próxima com as irmãs manteve-se, ao longo da infância, que dividiu entre a casa delas e a dos pais. A prática de fé da família estimulou, desde cedo, uma vivência profundamente religiosa. “O meu pai orientava a oração à noite, a minha mãe e as minhas irmãs ensinaram-me a catequese com muito carinho, o que me deu um grande entusiasmo por Jesus!” Ainda muito nova, insistiu para fazer a Primeira Comunhão. Disse a doutrina ao padre, confessou-se e recebeu o Sacramento. O interesse por Jesus e pelo transcendente ocupava, já na infância, a atenção da irmã Maria Manuel que, aos seis anos, fez no seu quarto um pequeno oratório com Nossa Senhora e o Crucifixo, onde meditava em silêncio.
A vocação
Neste ambiente, profundamente religioso, a opção por uma vida de consagração a Deus surgiu de um modo natural. Lembra-se que, desde muito cedo, teve a consciência do seu caminho vocacional. O primeiro contacto com a Ordem Dominicana, na qual está radicada a Congregação das Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena (CIDSCS), foi numa formação feita por um padre, na paróquia, recorda. “Achei muito interessante o ideal dominicano de verdade, de estudo, de pregação, de pobreza e dedicação aos mais pobres.”
Aos 14 anos, foi estudar para o Colégio do Ramalhão, em Sintra, que pertence à CIDSCS. O contacto com as irmãs dominicanas, caracterizado pela alegria, a serenidade, o ambiente de oração e meditação aprofundaram o seu desejo de pertencer à Congregação. Durante o tempo que ali esteve, conheceu a história de vida de Teresa de Saldanha, fundadora da Congregação e uma das suas referências. A vivência centrada em Jesus, o seu ideal pedagógico e o espírito de doação aos outros, incentivou, ainda mais, a irmã Maria Manuel. Este entusiasmo materializou-se em 2004, num livro que escreveu: “Teresa: Sonho e Ousadia”, sobre a vida de Teresa de Saldanha.
Foi no colégio do Ramalhão que fez a sua formação para a vida religiosa, tendo professado aos 19 anos e feito os votos perpétuos três anos mais tarde. Na altura, já era muito exigente e crítica em relação ao modo de viver a sua vida, servindo-se dos exemplos da vida dos santos que procurava conhecer, pautando a sua vida com base nos testemunhos que a tocavam.
Terminados os estudos em Sintra, entrou em História, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. O final do curso, coincidiu com as revoltas estudantis de 1969 e a greve aos exames. Apesar de achar que a situação política do país precisava de mudar com urgência, achou mais sensato, sendo já religiosa, não participar naquele género de manifestação. “Eu estava ali para estudar, queria seguir a minha vida e a minha missão. Fiz os exames e ninguém me perturbou”.
Terminado o curso, veio para Leiria, para o Colégio Nossa Senhora de Fátima (CNSF), uma obra da Congregação, onde ainda se encontra.
O Colégio
Atualmente, uma das coisas que lhe dá mais prazer, é rever os antigos alunos do colégio e perceber que, para além de “triunfarem na vida” e cumprirem a sua vocação, muitos deles dão o seu testemunho de cristãos, com uma participação ativa na comunidade paroquial onde estão inseridos. “Nós educamo-los aqui, na fé, para a felicidade, vivendo os valores e para a doação e é bom saber que muitos estão integrados e empenhados na Igreja.” A dedicação e entrega àquela instituição são evidentes pelo tom afetuoso com que fala dos que por ali passaram. A agenda diária é, quase exclusivamente, dedicada ao colégio.
O dia começa às 5h45, altura em que se prepara para a oração em comunidade. Depois do pequeno-almoço, vai para o gabinete preparar o dia. Quem conhece a irmã Maria Manuel, sabe que não é uma pessoa de ficar muito tempo sentada e, logo pela manhã, faz questão de acolher as crianças e os encarregados de educação, na receção da escola. Após os toques que anunciam a entrada para as salas de aula, ainda percorre os corredores. Durante a tarde, tenta acorrer às situações que exigem a sua presença. À noite, antes de se deitar e, ainda tem tempo para a leitura.
Todos estes anos à frente do CNSF, exigiram da sua pessoa uma adaptação aos tempos que resultou na vasta experiência que hoje acumula. Exemplo disso, foram as aulas de educação sexual que dinamizou há 35 anos no CNSF, numa altura em que a sexualidade ainda era considerada tabu. Percebendo a pertinência desta abordagem, foi até Paris, onde frequentou um curso de educação afetiva e sexual.
A alegria do testemunho
Quando perguntamos se houve algum momento mais complicado, a irmã Maria Manuel diz não se recordar de nenhum em particular. A dedicação com que assumiu as responsabilidades que lhe foram pedidas comprovam a forma determinada com que encara a vida e os desafios. Perguntamos sobre a fronteira que existe entre a irmã e a instituição que dirige há 45 anos. “É um trabalho de equipa. O CNSF não sou eu, mas as irmãs dominicanas e todas as pessoas que aqui trabalham e, sem os outros, nada somos. Não há vida religiosa sem comunidade”, responde.
A espelhar a humildade das suas palavras está o testemunho da sua liderança diligente, atenta e disponível, acompanhado pelo sorriso da alegria de quem se faz anúncio do Evangelho.