Paróquia: a Igreja concretizada

Neste mês de setembro, a intenção proposta pelo Papa para a oração dos cristãos é a paróquia. Estamos prestes a iniciar um ano pastoral dedicado à restauração da Diocese, conjunto de paróquias com um mesmo Pastor, tema que, aliás, D. António Marto aborda na sua carta pastoral “A alegria de ser Igreja em Missão”.

Na proximidade de mais uma Assembleia Diocesana, apresentamos algumas reflexões sobre o conceito de paróquia e recolhemos testemunhos de fiéis sobre a sua experiência neste tipo de relação comunitária.

Por Luís Miguel Ferraz

 2017-09-20 paroquia

Comunidade local aberta ao mundo

Todo o cristão nasce, pelo Batismo, no seio de uma comunidade. Em sentido lato e universal, essa comunidade chama-se Igreja, fundada por Cristo e animada pelo Espírito, que junta todos os filhos de Deus, de todos os tempos e lugares, de todas as gerações que passaram, que existem e que hão de vir. No entanto, essa comunidade, ou esse corpo, torna-se visível e concreto na paróquia, cuja pia batismal é o primeiro sinal de identidade e de pertença a uma mesma família de irmãos na fé.

É nessa comunidade próxima e concreta que cada um, depois, cresce na fé, na instrução cristã e na prática de uma vida pautada pelo Evangelho. Para muitos, falar de pertença à Igreja significa, basicamente, essa referência de identidade e ligação umbilical à sua paróquia. É caso para perguntar se isso é suficiente e, sobretudo, o que isso significa. Afinal, o que é a paróquia?

 

Definição oficial

O Código de Direito Canónico determina que “toda a diocese ou outra Igreja particular seja dividida em partes distintas ou paróquias” (C. 374) e indica que “paróquia é uma determinada comunidade de fiéis, constituída estavelmente na Igreja particular [diocese], e o seu cuidado pastoral é confiado ao pároco como seu pastor próprio, sob a autoridade do Bispo diocesano” (C. 515). Por norma, as paróquias são, então, circunscrições eclesiásticas territoriais que compreendem todos os fiéis de um determinado território, embora existam as chamadas paróquias pessoais, constituídas em razão do rito, da língua ou da nacionalidade dos fiéis de um território (cf. C. 518).

Na exortação apostólica pós-sinodal “Christifideles Laici”, do Papa São João Paulo II, sobre a vocação e a missão dos leigos na Igreja e no mundo, refere-se que “a comunhão eclesial, embora possua sempre uma dimensão universal, encontra a sua expressão mais imediata e visível na Paróquia: esta é a última localização da Igreja; é, em certo sentido, a própria Igreja que vive no meio das casas dos seus filhos e das suas filhas”.  (CL, 26).

Esta noção de proximidade resulta logo do nome “paróquia”. Utilizada desde há muitos séculos, nos escritos dos Santos Padres e dos Concílios, esta palavra provém do grego “pará-oikía” ou “paroikia”. Ora, “oikos” significa casa, termo com que as comunidades cristãs designavam a igreja e, em sentido mais teológico, a morada definitiva, o Céu. Já a preposição “pará”, acrescenta-lhe a ideia de “preparação para”, bem como de “proximidade” e de “vizinhança”. Assim, a paróquia é o lugar onde a Igreja estabelece a sua casa, na relação de contiguidade entre irmãos que vivem juntos, e, ao mesmo tempo, a morada “temporária” que prepara para a vida plena na casa definitiva, o Reino de Deus.

Unindo estes sentidos, a paróquia não é apenas um grupo ou associação aleatória de pessoas que residem numa determinada área, mas uma verdadeira família espiritual que vive a fé em comum, onde cada um é responsável por si e pelos irmãos da mesma comunidade.

 

Intenção do Papa Francisco

Todos os meses, o Papa Francisco apresenta uma intenção pela qual pede aos cristãos que se unam a ele em oração. Esse pedido é divulgado pela Rede Mundial de Oração do Papa (Apostolado da Oração) e pode ser consultado em www.oracaodopapa.net  ou em vídeo, no sítio www.ovideodopapa.org

Neste mês de setembro, o Santo Padre pede-nos que rezemos “pelas nossas paróquias, para que não sejam escritórios, mas que, animadas pelo espírito missionário, sejam lugares de transmissão da fé e testemunho da caridade”. Ora, esta intenção resume, ela própria, um conceito muito concreto do que deve ser a paróquia.

O papa explica: “As paróquias têm de estar em contato com os lares, com a vida das pessoas, com a vida do povo”. Isto é, são lugares concretos da vida da Igreja, onde vivemos também a nossa vida em sociedade. No entanto, não são guetos ou parcelas fechadas sobre si mesmas, mas “devem ser casas onde a porta esteja sempre aberta para ir ao encontro dos demais”. Daqui resulta a ligação da paróquia ao mundo e à Igreja universal e também a dimensão missionária que deve estar presente na vida das comunidades paroquiais. Francisco reforça: “É importante que a saída ofereça uma clara proposta de fé. Trata-se de abrir as portas e deixar que Jesus saia com toda a alegria de sua mensagem”.

 

A paróquia numa Diocese em festa

Neste ano pastoral que iniciaremos na Assembleia Diocesana do próximo dia 8 de outubro, celebraremos o centenário da restauração da Diocese. Isto é, a data em que foi recuperado como corpo animado por um bispo este conjunto de paróquias, sensivelmente com a configuração da atual Diocese de Leiria-Fátima.

Na carta pastoral que dá a orientação para este ano, o Bispo diocesano lembra que “o mistério da Igreja, para se tornar mais concreto e incarnado, realiza-se também nas comunidades locais mais pequenas, a que chamamos paróquias”. E acrescenta que “é uma comunidade de fiéis onde se gera a fé no dia a dia da vida das pessoas, onde se vive a alegria da comunhão e da participação na vitalidade da comunidade cristã. É a Igreja enraizada num lugar, presente no meio das casas dos homens, mais próxima à vida das pessoas”.

No entanto, tal como faz o Papa na sua oração, D. António Marto sublinha que “não é uma ilha ou feudo isolado e autossuficiente”, mas sim “uma célula viva da Igreja diocesana” que “só encontra a sua plena realização na comunhão com ela”. Por outro lado, a Igreja diocesana, presidida pelo bispo, é muito mais do que a simples soma das paróquias, pois nela se inclui a diversidade de outras formas de organização, como “movimentos eclesiais, associações de fiéis, comunidades religiosas e novas comunidades, que a enriquecem com os seus carismas e dinamismos espirituais e apostólicos”.

Assim, este ano de celebração da Diocese, será oportunidade para pensar mais profundamente na vida cristã destas comunidades paroquiais e na relação de abertura que devem promover entre si, com a Igreja universal e, mesmo, com o mundo. Só assim cumprirão a sua plena realização, na vocação missionária de que fala o Papa Francisco e que D. António Marto sublinha na sua carta pastoral.

No final deste ano, espera-se que já não faça sentido a observação do Bispo: “Verificamos, contudo, que grande parte dos fiéis valoriza mais uma comunidade de proximidade: a paróquia, o movimento, o grupo, a congregação religiosa e esquecem ou até ignoram a sua pertença afetiva e efetiva à Igreja diocesana”.

 

2017-09-20 paroquia2

Como vivo e sinto a paróquia…

Para mim, a paróquia é a comunidade onde estou inserida. Como católica, tenho o dever de me integrar nela e ajudá-la a viver em Cristo. Tenho a obrigação de crescer e ajudar a crescer espiritualmente todos os membros da minha comunidade, quer sejam cristãos ou não. O amor de Deus é para todos.

Conseguimos ter vários grupos que dinamizam o dever de um cristão: a catequese tem cerca de 700 crianças e adolescentes, que são repartidos por vários centros de catequese, mas a maioria, cerca de 350, inserem-se no centro paroquial. Temos alguns grupos socio-caritativos que são dinâmicos e que contemplam algum voluntariado. O agrupamento de escuteiros também já desempenha um papel bastante importante para o crescimento espiritual dos jovens. Considero que somos uma paróquia em constante crescimento e dinâmica, mas há sempre muito a fazer…

Mercês Santos, Batalha

 

Este mês pede o Santo Padre que nos unamos às suas orações para que “as paróquias, animadas pelo espírito missionário, sejam lugares de comunicação de fé e testemunho de caridade”.

A fé que professo assenta na relação com a pessoa de Jesus Cristo, que se completa na relação que estabeleço com os outros, particularmente, com os que professam a mesma fé. A vivência da fé católica tem esta dimensão comunitária, pelo que ninguém pode ser cristão sozinho.

A paróquia é uma organização básica da comunidade. É na paróquia que se celebra a fé e aí também se criam laços de afeto, e é, de facto, de afeto que a nossa fé é feita. É na paróquia que uns passam aos outros o testemunho da sua vivência da fé. É na paróquia que se acodem necessidades, materiais (alimentos, roupas) ou emocionais (acolhimentos, atenção), e sempre necessidades espirituais.

A paróquia, uma vez constituída, recebe um pároco, designado pelo bispo, que os paroquianos devem acolher, por um lado, enquanto, por outro, o pároco, sempre exercendo a sua prática sacerdotal, deve, ao assumir a missão “paróquia”, fazer como qualquer missionário: “estar”: sentar e escutar os que vai servir. A paróquia vive do esforço no caminho comum para Deus, ao jeito de Jesus.

Porquê então a oração pelas paróquias? Possivelmente para reforçar o que está entre vírgulas: “animadas pelo espírito missionário”: viver a paróquia, viver em comunidade com espírito de missão. Fica o desafio.

Helena Espírito Santo, Marrazes

 

A paróquia, para mim, é como um espaço vivo de caminhada com uma meta à vista que é saborear o dom que é Deus. Mas, quanto mais faço a experiência deste caminho, mais Deus me faz sentir o quanto tenho de me esforçar, pois, ao mesmo tempo que O saboreio, vou – na companhia daqueles que comigo são comunidade – atingindo e concluindo etapas que me animam e desafiam, que me dão força e entusiamo para os novos desafios.

São estes desafios que tornam mais atraente e irresistivelmente desafiante a conquista do troféu desejado e esperado, na convicção de que será alcançado, não apenas pelos meus méritos pessoais, mas também e principalmente através da Misericórdia Divina, na qual ponho toda a minha esperança e certeza de que não me faltará o seu apoio nesta caminhada que, graças a Deus, já dura há mais de 70 anos. Ao meu lado caminham os meus irmãos na fé, tantos ao longo da vida que, com a sua ajuda fraterna, manifestada de tantas formas, mas sobretudo pela palavra e pela vida, renovam cada dia, em mim, o desejo de me deixar cativar pelos novos desafios e pelos novos horizontes que me vão surgindo, com os quais vou, na minha pequenez, servindo Deus nos outros que, em qualquer esquina, em qualquer irmão, me esperam.

Sinto a paróquia como um meio de encontro com Deus e com os irmãos, onde nos unimos no estudo da sua Palavra, na partilha de bens e, muito especialmente, nas celebrações. É o local onde melhor vivo a fraternidade, onde busco o perdão e é ponto de encontro para a paz. O ponto forte, de que só por força maior abro mão, é a Missa dominical participada e vivida na minha comunidade paroquial, é o meu Domingo, é o Dia do Senhor. Partilho a minha fé nalgumas atividades em que participo e através das quais, enquanto fisicamente o Senhor mo permitir, continuarei a dar a minha ajuda, como ser portador do Evangelho de Jesus Cristo e da Sagrada Eucaristia aos mais fragilizados fisicamente, como ministro extraordinário da Comunhão. Também o serviço do altar, quando necessário, nas celebrações e atividades pastorais é outro meio da minha realização pessoal ao serviço da minha comunidade paroquial, permitindo-me assim um encontro mais íntimo com Cristo Ressuscitado.

Manuel Gonçalves da Silva, Atouguia

 

Ninguém é santo sozinho, começo assim esta minha pequena dissertação sobre o que entendo ser uma paróquia.

Vejo o espaço paroquial como um coração que, de pulsação em pulsação, enquanto alimenta a fé, cria simultaneamente espaço e oportunidade de um cristão empenhado ser sal e luz no meio da sua comunidade.

O amor que emana da minha fé, primeiro age no mais profundo do meu ser: no recato da privacidade do encontro com Deus, proporcionado pelas distintas dinâmicas paroquiais e pelo acesso ao sacrário, nasce a semente da conversão do meu coração. Assim, a paróquia cumpre, para mim, a função de, por um lado, alimentar a fé, proporcionando a intimidade com o Deus vivo, e, por outro, abre a cancela do campo onde se pode lançar essa semente que apareceu.

A paróquia como lugar de encontro da comunidade, de gente que procura o mesmo, anula o sentimento de solidão, potencia as virtudes que a fé me dá e exalta a diferença que o Deus vivo tem na minha vida.

Em suma, a paróquia é um lugar físico, por ser de encontro com as gentes da minha terra, mas também é um lugar sagrado, pela comunhão com Cristo nessa vivência comunitária.

Sérgio Bregieira, Fátima

 

É bom “viver” em paróquia. Não viver por estar fisicamente, mas porque nos faz sentir e existir espiritualmente. Aqui é fácil a nossa caminhada de fé.

Num mundo em que tantos estão desprovidos de motivação, de desânimo, é bom sentir que nesta comunidade tudo é possível, ver a participação dos diversos grupos e movimentos que se entreajudam em torno de uma Igreja que se mantêm viva e unida, mesmo na diversidade. Aqui somos Igreja onde se vive uma vida cristã equilibrada e espiritualidade contagiante. Para isso, é de salientar o empenho e dinamismo do pároco.

Vivo a simplicidade da vida, dia a dia, rodeada de pessoas com o coração do tamanho do mundo, sempre com amor aos deveres quotidianos, com o verdadeiro sentido de missão.

Deus não exige impossíveis! Na paróquia, todos juntos em comunidade, com humildade e caridade, sei que tudo é possível.

Paula Costa, Pousos

 

Segundo o dicionário, paróquia é a divisão de uma diocese ou um conjunto de paroquianos. Mas, no meu entender, paróquia será mais do que isso. Trata-se de uma divisão da diocese, como refere o dicionário, mas deverá ser um corpo dinâmico que acompanha os bons ofícios de quem o dirige, neste caso o pároco e seus vigários, no caso de os haver, sendo que haverá ainda os conselheiros leigos, também eles membros ativos. Todos os paroquianos são responsáveis, embora alguns tenham cargos de chefia, pela vida cristã comum, numa caminhada com o mesmo rumo.

Dou só um exemplo: na paróquia deverão ser respeitadas as decisões dos responsáveis, sobretudo no que toca aos bens e património, e não deveria haver divisões que levem alguns a ir contra as normas por eles definidas, como acontece com algumas comissões de festas.

Armindo Vieira, Pedreiras

 

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Traços da paróquia numa Igreja em saída

Em 16 de junho de 2014, num discurso aos participantes na Assembleia Pastoral Diocesana de Roma, o Papa Francisco desenhou em traços largos uma paróquia que viva em todos os modos possíveis a proximidade às pessoas, de modo especial aos mais necessitados de todo o género. Eis, em síntese, os traços da paróquia de uma Igreja em saída e próxima dos homens. Será uma comunidade que:
– saiba acolher com sentimentos maternos,
– mostre sempre ternura com todos,
– cultive a memória de povo de Deus,
– saiba olhar o futuro com esperança,
– trate os homens com a paciência que permite suportar-se um ao outro,
– tenha um coração de imensa abertura,
– possua a doçura do olhar de Jesus,
– tenha maternalmente a porta sempre aberta a todos,
– seja capaz de falar as linguagens dos jovens,
– se empenhe em estar próxima das crianças e dos jovens que sofrem a orfandade, que não têm um modelo de família,
– esteja em condições de captar nos diversos ambientes de vida (desporto, novas tecnologias, etc.) as possibilidades de anunciar o Evangelho,
– seja audaciosa em explorar sempre novos caminhos, novas linguagens e abordagens para difundir o anúncio da salvação,
– tenha párocos próximos da gente, dispostos a responder e a fazer-se próximos em qualquer momento de necessidade,
– crie, dentro de si e para além de si, o sentido da gratuidade.

Estes traços podem constituir um autêntico programa para concretizar um estilo de vida cristã e de ação apostólica e pastoral de uma Igreja em saída animada pela “alegria do Evangelho”, empenhada em testemunhá-la e oferecê-la a todos. Vale para a paróquia e também para a diocese com os seus múltiplos movimentos, comunidades, serviços e instituições.

D. António Marto, Carta Pastoral “A alegria de ser Igreja em Missão”, n.º 15

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