“Ouro azul”, ou a demanda do – cada vez mais – “precioso líquido”

“Tive sede e deste-Me de beber”. Esta é uma das razões indicadas por Jesus para acolher os eleitos no Reino dos Céus e de onde brota a segunda Obra de Misericórdia corporal: “Dar de beber a quem tem sede”. Nesta edição, apresentamos um conjunto de textos que convidam à reflexão sobre o tema da água, a partir de alguns acontecimentos recentes e de uma realidade há muito em debate, mas cada vez mais alarmante: a escassez deste líquido essencial a todos os seres vivos do planeta.

  

“Dar de beber a quem tem sede”

A referência à água como fonte de vida é constante na Bíblia, logo na história do povo de Israel, no cenário árido do Médio Oriente em que a chuva é marginal e sazona. Fala-se de seca e das suas consequências devastadoras e abundam os relatos à volta dos poços, dos rios e do dever de matar a sede a pede hospitalidade.

Jesus continua essa tradição oral, que era facilmente apreendida por quem O escutava. A água está presente no seu primeiro milagre, no episódio da Samaritana que abre o anúncio ao mundo não-judeu, em diversos dos seus discursos e no próprio momento da morte, quando sente sede e quando o seu corpo é perfurado por uma lança. E uma grande recompensa é prometida “a quem der ainda que seja apenas um copo de água fresca a um dos mais pequeninos”.

Sem precisarmos que saltar para os sentidos possíveis da “sede espiritual” de Deus ou de vida, esta Obra de Misericórdia continua a ser premente nos nossos dias. Ainda hoje – ou talvez hoje mais do que nunca – é nosso dever moral “dar de beber a quem tem sede”, seja lutando para que todos os seres humanos tenham acesso à água necessária para a sua sobrevivência, seja poupando a que temos ao nosso dispor.

Bem essencial e escasso

A água é indispensável à vida humana: representa cerca de 60% do peso de um adulto, que não sobrevive mais de três a cinco dias sem ingerir líquidos. Ela é, também, uma das substâncias mais comuns no nosso planeta: cerca de 75% da superfície da Terra é coberta por água em estado líquido. Parece muito, mas há a considerar que os oceanos são de fina espessura e concentram cerca de 97% da água, que é salgada, e, dos cerca de 3% de água doce, é de apenas 0,3% o volume de total de água potável.

Embora limitada, a reserva de água doce é renovável, tendo-se mantido estável no último século. Mas são vários os estudos que apontam para um possível colapso desse recurso, o que é já uma realidade em alguns países. Entre os motivos, está o aumento da população mundial e o consequente aumento do consumo, aliado a atitudes e comportamentos que vão do desperdício à poluição a um ritmo insustentável.

Nas modernas sociedades ocidentais, com a aparente abundância de água que circula canalizada nas nossas casas, facilmente poderemos esquecer isto, ainda que o assunto não nos seja estranho nas notícias que temos do mundo, ou nas conversas dos nossos pais e avós sobre a “ida à fonte” ou o valor acrescentado de um terreno que tivesse poço, em tempos que já lá vão.

A verdade é que o problema da escassez de água é bem real, afectando atualmente mais de 40% da população do Planeta, especialmente em África. Os dados são da Organização das Nações Unidas (ONU), que prevê que, até 2025, ou seja, em apenas oito anos, 1,8 mil milhões de pessoas viverão em países ou regiões com absoluta escassez de água. Sendo já, em muitos lugares, motivo de dominação, escravidão e conflito, há quem lhe chame o “ouro azul” e considere que será a principal causa de guerras no futuro.

Direito universal

A “Conferência das Nações Unidas para a Água” (1977), a “Década Internacional de Abastecimento de Água Potável e Saneamento” (1981-1990), a “Conferência Internacional sobre Água e Meio Ambiente” (1992), a “Cúpula da Terra” (1992), o “Fórum Mundial da Água” (desde 1997, a cada 3 anos), o “Ano Internacional da Água Potável” e a criação da “ONU Água” (2003) foram iniciativas voltadas para este recurso vital.

Em 2004, a ONU estabeleceu a data anual de 22 de março como Dia Mundial da Água e tem vindo a alertar para este “direito fundamental” e a obrigação moral de garantir a todos água potável e limpa. Declarou-se a Década Internacional de Ação Água para a Vida (2005-2015) e a “ONU Água”, em parcerias com governos e outras entidades internacionais, tem vindo a apresentar anualmente o Relatório de Desenvolvimento Mundial da Água (RDMA), analisando os dados e tendências que afetam os recursos mundiais de água doce.

Este era um dos “Objectivos do Milénio” e continua a ser um dos 17 objectivos consagrados no tratado “Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”, assinado pelos 169 Estados-membros da ONU em 2015: cuidar dos recursos hídricos e trabalhar para que toda a humanidade a eles tenha acesso. E há tanto, ainda, para fazer…

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Laudato si’, a Encíclica da água

A palavra ‘água’ aparece 43 vezes na Carta Encíclica Laudato Si’ (LS), do Papa Francisco, duas delas logo no segundo parágrafo. Versando o tema da ecologia, ou do “cuidado da casa comum”, esta bem pode também ser apelidada de “Encíclica da Água”, em que o Papa defende que “o acesso à água potável e segura é um direito humano essencial, fundamental e universal, porque determina a sobrevivência das pessoas e, portanto, é condição para o exercício dos outros direitos humanos”.

Sobretudo nos números 28 a 31, a Encíclica refere que “a água potável e limpa constitui uma questão de primordial importância” e indica problemas como o uso excessivo, o desperdício e a poluição, que afectam “a qualidade da água disponível para os pobres, que diariamente ceifa muitas vidas”. Nomeadamente, porque leva ao aparecimento de epidemias como a diarreia e a cólera, que “constituem um factor significativo de sofrimento e mortalidade infantil”.

A solução não está apenas nos governos ou nas empresas, mas na profunda “conversão interior” e “conversão ecológica” de todos nós. “É, em parte, uma questão educativa e cultural”, escreve o Papa, lembrando questões como os “detergentes e produtos químicos que a população utiliza” ou “a tendência para se privatizar este recurso escasso, tornando-se uma mercadoria sujeita às leis do mercado”.

O aviso é claro: “Este mundo tem uma grave dívida social para com os pobres que não têm acesso à água potável, porque isto é negar-lhes o direito à vida radicado na sua dignidade inalienável”.

 

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Vaticano fala na ONU: “grave dívida social”

Na 33.ª sessão do Conselho da ONU para os Direitos Humanos, no passado dia 16 de Setembro, em Genebra, o Vaticano manifestou a sua preocupação pelos quase 800 milhões de pessoas que se debatem no mundo com a falta de água potável e que não têm acesso a condições sanitárias básicas. “O nosso mundo tem hoje uma grave dívida social para com os mais pobres, a quem é negado o direito a viver com inalienável dignidade”, disse em Genebra o observador permanente da Santa Sé para a ONU e outras instituições internacionais com sede naquela cidade suíça.

D. Ivan Jurkovic defendeu que “o desenvolvimento sustentável e os direitos humanos são duas perspetivas que têm de trabalhar em conjunto na redução das desigualdades e na eliminação de disparidades, quanto ao acesso a serviços básicos”. Entre eles está a escassez de água potável que causa subnutrição crónica em mais de 160 milhões de crianças em todo o mundo. “Neste contexto, a gestão sustentável deste recurso transforma-se num desafio social, económico, ambiental e ético, que deve envolver não só as instituições mas também toda a sociedade”, salientou o arcebispo esloveno.

“Isto só se consegue através da educação dos nossos jovens para a solidariedade, o altruísmo e a responsabilidade. Uma pirâmide de virtudes que os ajudará a ser administradores e políticos de confiança”, concluiu. | Fonte: Ecclesia

 

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Cenário negro até 2050

A escassez de água afectará dois terços da população mundial em 2050, devido ao uso excessivo de recursos hídricos para a produção de alimentos. A conclusão é do relatório “Para um futuro com segurança hídrica e alimentícia”, apresentado pela FAO no VII Fórum Mundial da Água, realizado na Coreia do Sul em Abril deste ano.

Atualmente, 40% da população do planeta já sofre com a escassez de água e o aumento deste número deve-se ao maior uso de água subterrânea, com menor capacidade de reposição natural. Segundo o relatório, em 2050 serão necessários mais 60% de alimentos para sustentar a população mundial, o que levará ao incremento da agricultura, o maior consumidor de água a nível mundial, bem como da urbanização e da indústria.

A este propósito, a FAO pede aos governos de todo o mundo que atuem “para assegurar que a produção agrícola, criadora de gado e pesqueira seja realizada de forma sustentável e contemple ao mesmo tempo a salvaguarda dos recursos hídricos”. | Fonte: Agência Brasil

 

Portuguesa recebe Prémio Água Global

2016-09-27 agua3A antiga relatora especial das Nações Unidas para a Água, a portuguesa Catarina Albuquerque, foi este mês distinguida com o Prémio IWA Água Global de 2016, atribuído pela Associação Internacional de Água [IWA, na sigla inglesa]. O prémio reconhece o “papel excepcional que ela desempenhou como a força motriz por detrás do reconhecimento dos Direitos Humanos à Água e ao Saneamento”, refere-se num comunicado da maior organização internacional de profissionais do sector da água, incluindo empresas e reguladores de mais de 130 países.

A jurista portuguesa referiu que este é o resultado de um trabalho que vem a fazer desde 2008, quando a professora de Direito assumiu as funções de especialista independente com mandato estabelecido pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas para sobre a Água. “Iniciei um diálogo institucional com a IWA onde tentei explicar que o trabalho deles é mais do que engenharia, de torneiras e canos, mas de direitos de humanos e de garantir o acesso à água pelos mais pobres e marginalizados”, afirmou.

O diretor da IWA, Ger Bergkamp, elogiou Catarina Albuquerque pelo papel fundamental no reconhecimento, em 2010, da inclusão dos direitos à água e saneamento no documento formal dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável 2015-2030 aprovado pela Assembleia Geral da ONU em 2010.

O prémio será entregue a 9 de Outubro, durante a cerimónia de abertura do Congresso Mundial da Água da IWA, em Brisbane, na Austrália, que acolherá mais de 5.500 participantes ligados ao sector da água e ambiente e onde será lançado um Manual dos Direitos Humanos à Água Potável e Saneamento para Profissionais. | Fonte: Lusa

 

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Águas contaminadas

O programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) divulgou em Agosto passado um relatório em que alerta que até 323 milhões de pessoas na África, na Ásia e na América Latina estão a correr risco de contrair doenças devido à crescente contaminação da água nessas regiões do planeta. A presença de micro-organismos patógenos e de poluentes aumentou em mais de 50% nos rios destes três continentes. O cólera e a febre tifoide são algumas das doenças mortais que milhões de pessoas correm risco de contrair pela falta de tratamento das águas superficiais nessas áreas do planeta. | Fonte: terra.com.br

 

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Sistema de alerta para agricultores

A FAO – Organização para a Alimentação e a Agricultura da ONU e a Organização Meteorológica Mundial estão a criar um sistema de alerta que pretendem “fazer chegar a todos os governos e aos próprios fazendeiros através dos seus telemóveis”. A informação foi dada à Rádio ONU, esta segunda-feira 26 de setembro, pelo secretário-geral da FAO, José Graziano da Silva, adiantando que “isso vai-nos permitir, três meses antes, saber se vai chover, se vai ter seca e colocar medidas preventivas”.

Na linha do assunto que destacamos nesta edição, o dirigente brasileiro disse que a ideia é evitar a repetição da crise alimentar que o fenómeno El Niño provocou este ano em África, onde dezenas de milhões de pessoas estão em risco de fome devido à pior seca dos últimos 35 anos. O planeamento prévio, explicou, ajuda a reduzir o impacto dos fenómenos extremos e a proteger colheitas, evitando assim a insegurança alimentar.

De facto, dois anos consecutivos de seca estão a deixar quase 40 milhões de pessoas na África austral em risco de insegurança alimentar até ao início do próximo ano. Botsuana, Lesoto, Malaui, Namíbia, Suazilândia e Zimbabué são os seis Estados que já declararam emergências nacionais devido à seca, enquanto a África do Sul declarou o estado de emergência em oito das suas nove províncias e Moçambique declarou um alerta vermelho de 90 dias em algumas zonas do sul e do centro do país.

Além dos danos na agricultura, que exacerbaram a malnutrição crónica na região, a seca matou mais de 640 mil cabeças de gado, devido a falta de pasto, falta de água ou surtos de doenças.

Segundo a FAO, os efeitos do El Niño deverão atingir o nível máximo entre janeiro e março de 2017. Teme-se que no final deste ano ocorra o contra fenómeno do El Niño, o La Niña, que deverá trazer chuvas abundantes, o que poderá ser positivo para a agricultura, mas também comporta o risco de cheias, que poderiam destruir a produção e ameaçar o gado. | Fonte: Lusa

 

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