A conferência sobre “a atitude de escuta no atendimento social”, no Seminário, no passado dia 24 de março, incluiu uma encenação, análise de erros e indicações para melhorar a comunicação e a relação com as pessoas. A psicóloga Lígia Pedrosa pôs as pessoas a analisar e partilhar experiências e perspetivas. Chamou a atenção para a comunicação verbal e não verbal (gestos, olhares, atitudes…) e para os obstáculos que perturbam ou até impedem a transmissão da mensagem, a sua receção e compreensão: atitudes defensivas ou agressivas, juízos, preconceitos, pressa, distrações, confusão entre a realidade e a perceção que dela tem cada pessoa… Sugeriu estabelecer uma relação empática com as pessoas, “calçar os sapatos do outro”, a fim de perceber os seus quadros de referência. Lembrou que “quem atende tem que ser uma pessoa inteira, ser capaz de entender o outro com uma compreensão empática, não reagir de imediato…” Para isso, é preciso aceitar-nos e compreender-nos uns aos outros, tendo a noção de que sempre pudemos ajudar a pessoa que temos diante de nós e de que estamos sempre a aprender.
Participaram 52 pessoas de 18 instituições, conferências vicentinas e grupos sócio caritativos. A iniciativa foi do Departamento diocesano de Pastoral Social.
Um serão interessante e pedagógico, como testemunha o eco recebido no dia seguinte e que se publica abaixo.
É preciso escutar!
“Parabéns pela realização da conferência de ontem e muito obrigado pela reflexão que me permitiu fazer.
De facto, é preciso escutar.
Quando tudo é tão volátil, tão efémero, tão ilusório, cada vez são mais os que precisam de ser escutados. E como fazer essa escuta?
Saint Exupéry disse-nos que os olhos não conseguem ver o essencial. Nesse mesmo sentido eu atrevo-me a dizer que ter apenas ouvidos não basta. E no serviço de escutar o outro há todo um mundo de especificidades que precisamos de conhecer e cultivar.
Quando somos novos acreditamos que é sempre mais fácil mudar o mundo. Passamos pelos anos e vamo-nos apercebendo da imensidão de diferentes matizes de que é feita a vida. Mudar um país, uma cidade, uma rua, a nossa casa pode ser um feito extraordinário. Mudarmo-nos a nós mesmos sê-lo-á mais ainda. Os anos que passamos pela vida são o diapasão com que vamos afinando cada um dos nossos dias. E são mais serenos os que já não precisam de provar mais nada aos outros ou a si mesmos. Aceitar o bom e o menos, valorizando o que de facto o deve ser não esquecendo a aprendizagem por vezes mais difícil, dá-nos outra perspetiva. A cara que os olhos já salgaram está melhor preparada para enfrentar as curvas do caminho. São mais felizes os que conseguem despejar a taça da espuma de tantos dias. Nesse novo espaço torna-se mais fácil acolher outras realidades. Ficamos prontos para a escuta mais intensa de cada dia.
Sem filtros, sem preconceitos, sem necessidade de barreiras defensivas. Para escutar é preciso descentrar o foco que nos guia. E são mais, cada vez mais, os que precisam de ser escutados. As ruas das cidades estão a abarrotar de gente à deriva. Os lares estão repletos de vidas que precisam de ser partilhadas. Ânsias e sofrimentos que precisam de serenar. Esperanças que não podemos deixar que se desfaçam. Não há solidão mais dolorosa do que aquela que se vive quando são muitos ao redor, mas que nada escutam na pressa fugidia dos momentos que passam. É preciso tempo, serenidade e empatia. E não são apenas as palavras que é preciso escutar. Também os gestos e o que os lábios não dizem. O não se mover, o não falar por vezes dizem muito. Até um olhar vazio pode gritar. Os silêncios também precisam de ser escutados. Se estivermos atentos é nalguns silêncios que se escutam os gritos mais lancinantes. O serviço de verdadeira escuta é um ato libertador que dá vida. E são tantos os que precisam desesperadamente de ser escutados!
Mais que os ouvidos que não se feche o coração porque há muitos que precisam de quem os escute.
Amanhã é domingo.
Luís Vieira da Silva