Em tempos de corona vírus que se pode fazer em quarentena? Refletir, ler, escrever, partilhar reflexões, e rezar. A reflexão depara-se com múltiplas surpresas. Caro amigo, (comecei esta reflexão no dia 17 com um amigo da web) estou num quarto da casa do clero da catedral de Westminster. Estou bem, mas dizem a toda a hora na BBC e nos jornais: não sair, não se juntar… Dou por mim a pensar que nunca houve tantos unidos e separados. Nunca tantas pessoas falaram do mesmo, tantos governos, jornais, rádios, tvs, redes sociais da internet, emails, twitters, facebooks, especialistas, pessoas dos serviços de saúde, bispos, padres e religiões…E tantos ignorantes e cientistas, povo e alta sociedade. Todos a falar do mesmo! Um espanto! Tantas famílias, juntas ou à distância, escritores e analfabetos, comerciantes e economistas, ricos, pobres e banqueiros. Todos unidos e separados, tantos a lavar as mãos ao mesmo tempo, pela mesma razão, tantos a adiar, e em quarentena, sem pressas, como antes. Nunca tantos cinemas, estádios, igrejas e templos, hotéis, estações, lojas e ruas fechadas e sem quase ninguém. Restaurantes sem gente sentada, tantos a comprar coisas de mais para comer e se lavar. Globalidade, desta vez!
Tantos a descobrirem o bem comum com que alguns não se preocupavam. E até a aceitar que lhes limitem a liberdade em tempos de tantos liberalismos e individualismos egoístas. Nunca tantos, a enfrentarem uma guerra contra o mesmo inimigo, quase invisível, e a tornarem-se menos inimigos. Não é espantoso que tantos políticos e líderes tentem serem menos corruptos e mais dignos e responsáveis da sua posição; e tantos a reconhecerem que é impossível fazer o que todos desejam. Nunca tanta unidade política e solidária e tanta separação e distância pela mesma razão; e que nunca tantas tropas combatam pela saúde e vida. Que vírus tão pequeno e tão poderoso! As exceções dos corruptos, sempre haverá, claro; e muitos vão dando sinal nas ruas e nas redes.
Um vírus de nada a obrigar a Ciência (com maiúscula) e a Religião a aceitarem que a finalidade de ambas é colaborar para o bem comum, terreno e ultraterreno, de todos. E afinal, colaboram no bem comum, que abranja todas as dimensões da pessoa na vida, saúde e força de trabalho, na doença, invalidez física, (não de pessoa), e na morte até à vida eterna. Bem, repete-se a toda a hora que os idosos, como este, estão em maior risco, mas não é só o risco do vírus daninho mas também, do dragão do Apocalipse. Será que nunca tantos rezaram como agora, será que tantos rezam mesmo sem igrejas e templos, sem missas e serviços religiosos? Bem, será melhor ir fazer oração e lectio divina e continuar depois. Aqui na tv à minha frente Boris Johnson, acolitado pelo ministro das finanças e o cientista mor do reino, continuam na sua conferência de imprensa, até que venha o Arcebispo de Cantuária, Justin Welby e o cardeal Vicent dizerem, na linha do Papa e de D. Manuel Clemente, que é tempo para invocar mais a Cristo e fazer o que cada um pode para vencer o (s) inimigo (s). Sem medo da morte evita-se mais o pânico contagioso. Não será que o coronavírus ameaça ter mais poder que todos os políticos e cientistas? Terá isto a ver com tantos segredos que têm sido revelados sobre este período crucial da história? Será que o vírus tem mais poder que Jesus Cristo? Difícil é dizer se este vírus poderá trazer bem à humanidade. Quem sabe? Só um Noé, um Moisés perante o Faraó, um Daniel, um Jonas, a quem o Senhor dos segredos revelava o sentido das calamidades e pragas desses tempos bíblicos? São 17h50, dia de S. Patrício, 2020. No dia seguinte continuou-se a reflexão em resposta a um colega. Caro irmão no sacerdócio, faço minhas muitas das suas perguntas. Penso em muitas maneiras de celebrar a missa com menos povo, mantendo distâncias uns dos outros e com todos os cuidados de prevenção. Assim se fez estes dias na catedral de Westminster. Contudo, hoje os bispos católicos decidiram que a partir do dia 20 as missas seriam à distância como decidiram os de outros países. Apesar de tudo penso que nunca tanta gente no mundo, de todas as fés e credos, fez tanta oração. Nossa fé cristã tem duas frentes: pai, afasta este cálice…ajuda-nos a evitá-lo…mas a tua vontade está primeiro. Quem sabe o sentido de toda esta epidemia em relação com a fé cristã? Penso, faço o que posso, espero e rezo para que este fenómeno global (o mais) pode ser uma graça de Deus? Para um padre católico é grande risco dizer isto, num mundo em que muitos são os seus deuses. Tenho esperança que o Senhor dos vírus e dos homens, mesmo dos que se julgam deuses, ajuda a discernir em que medida, deste mal poderá vir um bem maior. Um abraço amigo, mas se estivesse perto só poderia ser uma cotovelada cordial como estamos a ser treinados há duas semanas e eu agora a fazer quarentena no Funchal, desde ontem dia de S. José, patrono da Igreja.