No passado dia 17 de outubro comemorou-se o dia internacional para a erradicação da pobreza. No combate a este flagelo social, a Igreja continua a ter um papel preponderante e insubstituível.
No nosso país, uma parte da ação social é garantida por serviços e movimentos diocesanos e paroquiais. Na Diocese de Leiria-Fátima, Cáritas, Conferências de São Vicente de Paulo (CSVP), grupos sócio caritativos e centros sociais paroquiais estão no terreno, na luta pela erradicação da pobreza, oferecendo não só bens materiais, mas também apoio psicológico e social.
Com a crise económica, a pobreza, exclusão social e desigualdades alcançaram níveis nunca antes vistos. Para Barbara Helfferich, diretora da Rede Europeia Anti Pobreza, “as medidas de austeridade têm vindo a agudizar este cenário de pobreza, desmantelando os Estados sociais e a obrigando as pessoas a pagar a crise”.
Desde o início do seu pontificado que o Papa Francisco assumiu o combate à pobreza como uma prioridade. De tanto defender os pobres, chegou a ser apelidado de marxista, rótulo que rapidamente rejeitou, afirmando que “a bandeira dos pobres é cristã” e que “a pobreza está no centro do Evangelho”. Numa audiência, em maio passado, com o secretário-geral das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-Moon, o Papa apelou a um maior empenho a favor dos mais pobres e excluídos, alertando para o facto de que “uma parte significativa da humanidade permanece excluída dos benefícios retirados do progresso”.
Nesse sentido, o Papa exortava para o desenvolvimento de propostas que tragam “melhorias substanciais em termos da preservação do meio ambiente, que garantam trabalho digno e útil para todos e que assegurem proteção adequada às famílias”.
A realidade nacional
Segundo dados revelados na semana passada pela Pordata, uma base de dados tutelada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, Portugal é o nono país mais pobre da Europa. A contribuir para esta situação, está a conjuntura mundial e europeia de crise, que se tem vindo a piorar nos últimos anos. Em março deste ano, um inquérito publicado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) sobre as condições de vida e rendimento dos portugueses identificava quase 2 milhões de pessoas no limiar da pobreza, representando 19 por cento da população do país. Esta situação “agravou-se nos últimos nove anos, atingindo principalmente os desempregados, as famílias com filhos a cargo e os jovens menores de 18 anos”, refere-se nas conclusões do inquérito.
Apesar de apontar para um panorama de “crescimento económico”, o Orçamento de Estado (OE) para 2015 “manteve cortes aos que mais precisam”, lamenta Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas Portuguesa. Este responsável estranha que, apesar dos “indicadores positivos” apresentados, tenham sido mantidos os cortes nas prestações sociais.
Para Eugénio Fonseca, era fundamental que o OE para 2015 tivesse inscritas medidas de apoio à “criação de novos postos de trabalho” e à “formação profissional” de todos quantos não conseguem encontrar vaga no mercado. No âmbito do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, Eugénio Fonseca deixou um apelo ao Governo, para que “aproveite nas devidas condições” os fundos europeus que vão ser canalizados para esta área, cerca de 20 por cento do Fundo Social Europeu até 2020.
Um trabalho local
Em Portugal, uma parte considerável da atividade sócio-caritativa é garantida por serviços, movimentos e instituições eclesiais. Na génese da ação da Igreja está o mandamento evangélico do amor ao próximo e da caridade mútua.
Na nossa Diocese, a ação solidária eclesial é garantida, na maior parte das vezes, pela Cáritas Diocesana de Leiria-Fátima, Conferências de São Vicente de Paulo (CSVP), grupos sócio caritativos e centros sociais paroquiais. Os centros sociais paroquiais garantem, em muitos casos, serviços mínimos às populações que servem, funcionando com ajudas da paróquia e da Segurança Social, assumindo-se como instituições particulares de solidariedade social.
Como expressão da atividade sócio caritativa organizada, a Cáritas Diocesana tem respondido às necessidades imediatas das situações de pobreza. Para além de identificar as situações de pobreza, procurando as respostas adequadas, este organismo pastoral trabalha em proximidade com os demais movimentos de cariz social e de âmbito paroquial: CSVP e grupos sócio caritativos. Os pedidos que ali chegam são os mais variados, conta Júlio Martins, presidente da Cáritas Diocesana, desde pedidos para ajuda do pagamento da renda de casa, da conta da luz, da água, da farmácia ou mesmo vestuário.
Uma pobreza envergonhada
Transversalmente, os movimentos sócio-caritativos fazem notar um aumento significativo dos pedidos de ajuda. “Os tempos que correm são muito complicados, as pessoas veem-se desprotegidas, com mais dificuldades e é necessário que haja instituições que colaborem e ajudem”, referiu ao PRESENTE Francisco Frazão, presidente das CSVP da Batalha. Com 20 anos de experiência na ação sócio caritativa, Fernanda Vitorino, responsável pelo Grupo Cáritas da Bidoeira, dá conta de um aumento dos pedidos de ajuda e de uma “pobreza envergonhada”.
“Às vezes, ligam-nos da Cáritas Diocesana a solicitar a nossa intervenção em situações de carência de pessoas que, apesar de morarem na paróquia, optam por lá ir pedir ajuda, porque sentem vergonha de vir falar connosco”.
No Centro de Acolhimento de Leiria (CAL), uma obra social da paróquia de Leiria, são sobretudo desempregados de longa duração, pessoas isoladas sem suporte familiar, com grande incidência em patologias psiquiátricas e depressivas. Na resolução destas situações, aquele serviço procura reinserir a pessoa na comunidade ou família, transmitindo-lhes a mensagem de que são eles os principais condutores das suas vidas.
Conferências Vicentinas
Uma rede de caridade mundial, com ação local
Na diocese de Leiria-Fátima, 28 Conferências Vicentinas exercem a sua ação social, em parceria constante com a Cáritas Diocesana, o Banco Alimentar, Segurança Social, superfícies comerciais e restante comunidade. A sua principal característica é a visita às famílias e pessoas carenciadas, indo ao seu encontro, conversando com elas e levando o calor do amor ao próximo e da palavra. É nesse contacto pessoal que levam as ajudas materiais adequadas à situação encontrada. As visitas repetem-se acompanhando a situação das pessoas. O movimento está inserido em quase 50% das paróquias da Diocese, trabalhando, nalgumas delas, em diálogo com outros grupos sócio-caritativos.
As ajudas consubstanciam-se sobretudo em bens alimentares, no entanto as CSVP também colaboram no pagamento de contas de luz, água, livros escolares, remédios e na oferta de camas articuladas, cadeiras de rodas e outros bens necessários, sempre que, depois de uma análise criteriosa, este tipo de contributo se justifica. Realizam também obras mais urgentes nas habitações das famílias que são ajudadas. Sem estas ajudas, garantem, as famílias ajudadas estariam em situações ainda mais precárias.
As CSVP são um movimento sócio caritativo que espelha a solidariedade da comunidade em que está inserido, no entanto, perante um aumento das necessidades, os responsáveis notam um decréscimo dos donativos, reflexo da diminuição do poder de compra das pessoas que habitualmente contribuem solidariamente. Fátima Fábrica, responsável pelo grupo sócio caritativo dos Milagres, nota, pela experiência que tem na ação sócio-caritativa, uma redução significativa da ajuda, no seu entender, em resultado da crise mas, apesar disso, a comunidade continua a ser solidária, dentro das suas possibilidades.