Espalhar perfume de vida pascal

Não foi fácil para estas testemunhas do sepulcro vazio trocarem de perfumes: deixar o material, que levavam para ungir o morto, e acolherem o espiritual, que lhes entregava o mensageiro divino com a boa notícia de que Jesus estava vivo e a missão de o irem dizer a outros.
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Na tarde do domingo de Páscoa, caminhando pela minha aldeia, fui surpreendido por um intenso e agradável aroma: era o perfume das flores de laranjeira. No regresso, passando de novo pelo local, repetiu-se a mesma boa experiência. Das flores se espalha o perfume e nascem os frutos, como canta a amada do livro bíblico Cântico dos Cânticos (4,16):

“Levanta-te, vento norte;
vem, vento do sul;
vem soprar no meu jardim.
Que se espalhem os seus perfumes.
O meu amado entrará no seu jardim
e comerá os seus frutos deliciosos.”

Perfumes foi o que compraram três mulheres discípulas de Jesus para irem ao sepulcro ungir o corpo do seu Amado Senhor. Ao chegarem, grande surpresa: não encontraram o corpo de Jesus, mas viram um jovem que lhes anunciou que Jesus de Nazaré tinha ressuscitado. Mostrou-lhes o sítio onde estivera e confiou-lhes a missão de levar a boa notícia aos “discípulos e a Pedro”, convidando-os a ir para a Galileia, onde Ele os precederia e lá O veriam. Elas saíram dali “a tremer e fora de si”, não dizendo nada a ninguém, “porque tinham medo” (Mc 16, 1-8). Enquanto o evangelista Marcos sublinha o temor e o silêncio destas mulheres, Mateus, por seu lado, diz que elas se afastaram rapidamente do sepulcro, “cheias de temor e de grande alegria”, e “correram a dar a notícia aos discípulos” (Mt 28, 8).

Não foi fácil para estas testemunhas do sepulcro vazio trocarem de perfumes: deixar o material, que levavam para ungir o morto, e acolherem o espiritual, que lhes entregava o mensageiro divino com a boa notícia de que Jesus estava vivo e a missão de o irem dizer a outros. No caminho, encontram Jesus ressuscitado que lhe diz para não temerem e irem dar a notícia que haviam recebido. Após o encontro com o Senhor ressuscitado, como o perfume que se expande, as mulheres e os demais discípulos dos primeiros tempos da história cristã, “partindo, foram pregar por toda a parte; o Senhor cooperava com eles, confirmando a Palavra com os sinais que a acompanhavam” (Mc 16, 20).

Após a sua ressurreição e pelo tempos fora, Jesus dá-se a conhecer pelo testemunho dos seus discípulos. Assim entende a sua missão o apóstolo Paulo, dizendo que, por intermédio dele, Cristo “difunde em toda a parte o perfume do seu conhecimento”. E mais, reconhece que, pelo fiel comprimento da missão de levar o Evangelho, ele e os companheiros são “para Deus o bom odor de Cristo, para aqueles que se salvam e para aqueles que se perdem: para uns, odor da morte que conduz à morte; para outros, odor da vida que conduz à vida”. Para estar “à altura de uma tal missão”, não falsificam a palavra de Deus, como outros, mas, “com sinceridade, como enviados de Deus”, falam em Cristo, diante de Deus (cf 2 Cor 2, 14-17. O Evangelho é assim “perfume de Cristo” que leva a conhecê-Lo, à vida nova da união com Ele e a saber viver segundo Deus, irradiando para outros esse estilo de vida.

Confiança de ressuscitados

Nas celebrações pascais, a Igreja evoca o Batismo, como participação sacramental na morte e ressurreição de Jesus Cristo, e a vida nova que dele recebe o cristão pela fé. Pela participação na sagrada liturgia pascal, o fiel batizado é chamado a viver a experiência de um renascimento espiritual e enviado a testemunhar e espalhar a vida nova que recebeu. A Primeira Carta de S. Pedro, lida e meditada na oração litúrgica da Igreja na primeira semana do tempo pascal, é quase um manual ou programa para a vida cristã. Aí o Apóstolo ensina aos cristãos como hão de viver e testemunhar a fé caminhando e agindo no mundo com a consciência e a esperança de peregrinos da pátria celeste. A fé cristã inspira uma vida de confiança, sobriedade e serviço, a ser “santos” “como é santo” aquele que os chamou à vida de fiéis batizados, a praticar entre si “um sincero amor fraterno”, amando-se “intensamente uns aos outros do fundo do coração, como quem nasceu de novo, não de uma semente corruptível, mas de um germe incorruptível, a saber, por meio da palavra de Deus viva e perene” (1 Pe 1, 22-23).

O fruto de quem vive a fé depois da unção com o “santo crisma”, tanto no Batismo como na Confirmação, é precisamente exalar “o perfume de uma vida santa”, como se diz na oração de consagração desse óleo na missa crismal de quinta-feira santa. E o Papa Francisco exorta: “difundamos o perfume de uma vida santa inspirada no Evangelho”.

Não nos é fácil deixarmo-nos ungir com o perfume de Jesus ressuscitado e espalhá-lo por onde quer que passamos. Esse perfume é a fé e a esperança na vida eterna, a paz que Cristo nos dá, a confiança de que nos precede nas múltiplas ocasiões de encontro com Ele, a força do amor que deposita nos nossos corações e nos leva a fazer o bem, a graça do perdão que nos reconcilia e reanima, a alegria contagiante que imprime nos nossos rostos, a força para construir fraternidade e promover renovação na família e na sociedade… O cristão é um ressuscitado que passa pelo mundo, agindo e lutando pela transformação deste segundo o Espírito e o Evangelho de Cristo. Ele é, pessoalmente e com os demais homens e mulheres de qualquer crença ou convicção humanitária, promotor de vida e humanidade nova. Por isso, na oração litúrgica de laudes, a Igreja implora a Deus Pai: “Fazei que a nossa vida, escondida em Vós com Cristo, brilhe no mundo, para anunciar aos homens os novos céus e a nova terra”.

É assim nossa missão, hoje, fazer que o perfume da vida pascal, como o da flor da laranjeira, alastre nas nossas cidades, vilas e aldeias.

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