A Comunidade Cenáculo, com sede na cidade e diocese de Saluzzo (Itália), é uma associação privada internacional de fiéis, reconhecida pelo Conselho Pontifício para os Leigos, que assume como finalidades “a santificação pessoal dos seus membros” e “o acolhimento, ajuda e promoção de quantos se encontram em situação de desorientados e com carências físicas ou morais e estejam à procura de um sentido para a vida, propondo-lhes de modo explícito um caminho humano e cristão”.
Em dezembro de 2012, a sua fundadora e presidente, Rita Petrozzi, mais conhecida como Madre Elvira, manifestou ao Bispo de Leiria-Fátima o desejo de estender a ação da comunidade a Portugal, pedindo-lhe que reconhecesse e autorizasse a associação a abrir uma casa em Montelo, freguesia de Fátima. D. António Marto respondeu favoravelmente a esse pedido, num decreto de “reconhecimento e ereção canónica da Comunidade Cenáculo na diocese de Leiria-Fátima”, considerando que “o testemunho de vida e o trabalho de recuperação de pessoas carenciadas do ponto de vista físico, moral e espiritual da dita Comunidade é de interesse pastoral para esta Igreja Particular”.
No mesmo decreto, indica-se que no seu trabalho nesta diocese, a associação “empenhar-se-á em manter viva a comunhão e colaboração com esta Igreja Particular, na diversidade e complementaridade dos seus serviços, movimentos e instituições”, observando os respetivos estatutos e as orientações pastorais do Bispo diocesano.
O jornal Presente Leiria-Fátima pediu ao padre Stefano Aragno, responsável internacional da Comunidade Cenáculo, que nos desse a conhecer melhor esta associação de fiéis.
A raiz
Como poderia resumir a apresentação da Comunidade Cenáculo?
É uma Associação Internacional de Fiéis, nascida da ternura de Deus por meio da Irmã Elvira Petrozzi, reconhecida pela Santa Sé junto do Pontifício Conselho para os Leigos, em 16 de julho de 2009. É uma grande família, formada por pessoas que fizeram a experiência viva da misericórdia de Deus, que quer amar, acolher e servir a vida, especialmente a vida dos jovens feridos pelo mal, a solidão, o desespero, as drogas, de acordo com o carisma da “Comunidade Cenacolo”, propondo às pessoas acolher um caminho de ressurreição por uma experiência de vida comunitária, na qual se vive intensamente a vida cristã: oração e trabalho (“ora et labora”), sacrifício, amizade e partilha sincera.
Como foram os pormenores do seu “nascimento”?
Após anos de espera e de oração, em que sentia no coração o chamamento para dedicar a sua vida aos jovens solitários e marginalizados do nosso tempo, a irmã Elvira, a 16 de julho de 1983, no dia de Nossa Senhora do Carmo, recebeu as chaves de uma casa abandonada e em ruínas na colina de Saluzzo (Itália). Aí nasceu a Comunidade Cenáculo, sem meios económicos nem materiais, mesmo sem a pretensão de saber o que teria acontecido com tantos sacrifícios e tanta oração, mas com a única grande certeza da fidelidade de Deus. E assim começou esta aventura que só o Senhor sabia plenamente.
À porta da Comunidade juntaram-se os primeiros jovens: seres esfarrapados, desesperados, drogados, à margem da sociedade, que buscavam um refúgio, um abrigo, um lugar para renascer. Com eles vieram também as primeiras ajudas concretas: comida, algumas ferramentas de trabalho, pessoas dispostas a ajudar… A Providência começou imediatamente a estar presente como um sinal tangível de que Deus estava connosco. Os rapazes começaram a reconstruir as suas vidas e também a reestruturar a casa, e pediram imediatamente, não um teto, uma cama para viver, um prato para comer, mas poderem encontrar a paz, o perdão, a esperança. Vendo a irmã Elvira a rezar, eles pediam: “ensina-nos a rezar”. Assim, a oração foi imediatamente a proposta para nutrir o homem interior, para fazer renascer o homem novo.
Com o passar do tempo, os jovens que batiam às portas da Comunidade aumentaram cada vez mais e tornou-se necessário abrir outras fraternidades para os receber. A semente germinou e cresceu com inúmeras outras casas, primeiro na Itália e depois no exterior. Foram os próprios jovens, recuperados do seu passado de trevas, os primeiros “missionários” que ofereceram a sua disponibilidade gratuita para chegar aos outros com necessidade. Assim despoletou um horizonte missionário inesperado e não programado.
Atualmente, as fraternidades na Itália e no mundo são cerca de 60: estamos presentes em três continentes e em 17 países em todo o mundo.
Ao longo dos anos, formou-se, incluindo os envolvidos na Comunidade Cenáculo, um núcleo de pessoas totalmente dedicadas à vida comunitária, que compartilham uma vida de oração, de escuta da Palavra de Deus e de serviço aos pobres a tempo inteiro e em total gratuidade. Fazem parte dele jovens voluntários, famílias, pessoas que abraçam os conselhos evangélicos e muitos amigos, sacerdotes, leigos, envolvidos, cada um segundo a sua capacidade e sua profissão, no caminho da Comunidade, partilhando a espiritualidade, o serviço e a missão, mesmo mantendo-se inseridos no seu ambiente eclesial, profissional e familiar.
A vida
Qual é o seu carisma?
A espiritualidade da comunidade é profundamente eucarística e mariana. Vivem-se durante o dia momentos alternados de oração (Adoração Eucarística, Liturgia das Horas, Rosário), de trabalho e de profunda partilha da própria vida diante da Palavra de Deus e dos irmãos, no jogo, na alegria. Acreditamos que a vida cristã, na sua simplicidade e plenitude, seja a verdadeira resposta a qualquer inquietação do coração e que só num encontro vivo com a misericórdia de Deus o homem renasce na esperança e será libertado das correntes que o fizeram escravo, redescobrindo a alegria de amar.
Como é o seu modo de vida e quais as principais atividades que desenvolve?
O principal objetivo da Comunidade é o nascimento de lugares de acolhimento e de esperança, chamados fraternidades, com o objetivo de acolher pessoas carentes ou feridas interiormente, com total gratuidade.
Acolhemos jovens que vêm do mundo da marginalização e da estrada, muitas vezes com problemas relacionados ao uso de drogas, que desejam renascer e descobrir o verdadeiro sentido da vida; acolhemos pessoas e famílias que desejam viver uma experiência forte de comunidade, de oração, sacrifício, partilha e serviço cristão; e acolhemos crianças de rua, órfãos e abandonados (nas missões do Brasil, México, Peru e Libéria), com os quais alguns jovens missionários leigos, famílias e consagrados compartilham um caminho de reeducação para a vida no amor.
Vivemos na confiança total e incondicional na Providência Divina, que pensa nos seus filhos. Por isso, propomos a todos um estilo de vida simples, família, disciplina, com base na redescoberta dos dons essenciais da oração e do trabalho, da verdadeira amizade, do sacrifício e da fé em Cristo Ressuscitado.
A vida de pessoas necessitadas torna-se bem-vinda, acolhida e amada, através de um caminho de redescoberta do verdadeiro sentido da existência, através de um percurso reeducativo-espiritual, com base na oração, no trabalho, na verdadeira amizade e no sacrifício.
Trabalhamos também com os familiares dos jovens acolhidos, em reuniões periódicas e retiros organizados pela Comunidade, para que a cruz e o sofrimento que as famílias tinham vivido com os seus filhos possam tornar-se no início de um sincero caminho de conversão e de mudança de vida para toda a família.
Como se processa a integração de quem procura a Comunidade?
Todos os jovens que tenham problemas de dependência, ou feridas infligidas por si ou pelos familiares, podem entrar em contacto com a comunidade, para se avaliar a situação e dar indicações para um eventual acolhimento. Normalmente, são necessários alguns encontros, por um lado, para que a pessoa que quer entrar no caminho comunitário o possa conhecer, e por outro, para que a comunidade possa conhecer a pessoa, os seus problemas e a sua família.
Aqueles que desejam aproximar-se da comunidade, porque a veem como caminho de fé e experiência de vida comunitária intensa e exigente, devem primeiro conhecer a nossa realidade e, em seguida, frequentar os passos recomendados para uma possível inclusão numa fraternidade.
Aqueles que descobriram a sua vocação à vida comunitária no carisma da Cenáculo passaram sempre, primeiramente, pela experiência de vida comunitária compartilhada com as pessoas que acolhemos. Este é o primeiro passo para todos, aquele que a irmã Elvira gosta de chamar “uma escola de vida cristã”.
Em Portugal
Como foi a chegada a Portugal?
O grupo que “abriu” a casa chegou no início de dezembro de 2012, para o início dos trabalhos de limpeza e arrumação do local e para preparar a “inauguração” oficial, que foi no 8 de dezembro, Solenidade da Imaculada Conceição. Vieram centenas de pessoas que já conheciam a nossa obra, de Portugal e da Espanha, e foi celebrada a Santa Missa na igreja matriz de Fátima, presidida pelo padre Jorge Guarda, vigário geral da Diocese. Seguiu-se uma visita à casa, um momento de partilha fraterna, amizade e testemunho, depois o Rosário e a consagração da nossa presença ao Imaculado Coração de Maria, na Capelinha das Aparições. Chegámos com muita alegria, para estarmos convosco, ao lado de Nossa Senhora, para rezar por tantos jovens perdidos.
Porquê a escolha da diocese de Leiria-Fátima?
Como disse, temos uma espiritualidade profundamente mariana, e estamos presentes em vários lugares e santuários marianos. O desejo de estar também em Fátima vive no coração da comunidade há anos. Esperou-se com paciência e rezou-se com perseverança para que chegasse o tempo de Deus.
Várias pessoas em Portugal, depois de conhecerem o nosso trabalho nos últimos anos, especialmente em Lourdes e Medjugorje, onde visitaram as nossas casas e ouviram o testemunho dos nossos jovens, mantiveram contacto de amizade connosco, para aprofundar o conhecimento da Comunidade e pedir ao Senhor com insistência o dom da nossa presença junto ao Santuário Fátima. Eles rezaram, esperaram com fé e “funcionou”: tentámos diferentes possibilidades, até àquela que se concretizou, e finalmente chegámos, muito felizes por estar aqui nesta vossa terra abençoada pela Virgem Santíssima.
Que desejam receber desta Diocese e o querem oferecer-lhe com a vossa presença?
O que pedimos à Diocese é o dom de ser acolhido, por aquilo que somos, com o profundo desejo de caminhar e trabalhar juntos. Queremos ser apoiados e ajudados por esta mãe e mestra, que é a Igreja, da qual fazemos parte e onde somos imensamente felizes. Fomos recebidos por vós com amor, carinho e disponibilidade, tanto pelo vigário geral, com o qual tivemos diálogos e reuniões preparatórias para a nossa chegada e, mais tarde, pelo Bispo D. António Marto, que conheceu a irmã Elvira e alguns membros da Comunidade após a abertura da casa, como por tanta gente boa de Fátima, Lisboa e outros lugares, que já ajudam os nossos jovens com a Providência e a amizade.
Um presente “especial” que sempre pedimos aos bispos das dioceses onde estamos é a presença do Santíssimo Sacramento na capela. A oração eucarística é fundamental para a nossa vida comunitária. Quando chegaram cá, os rapazes prepararam imediatamente um ambiente simples, mas muito digno, para esse efeito. Com imensa bondade, o Bispo autorizou que Jesus viesse para o meio de nós! Com a sua presença, temos a certeza de que tudo vai crescer bem e dará muito fruto.
À Diocese, trazemos a nossa pobre e frágil presença, rica porém, e a viva esperança de um testemunho jovem que verdadeiramente a oração e a fé, unida ao sacrifício, são a verdadeira e única força capaz de ressuscitar plenamente a vida humana.
Que mensagem quer deixar aos diocesanos de Leiria-Fátima?
Obrigado por nos terem esperado, obrigado por nos terem recebido, obrigado por nos terem amado! Chegámos há pouco mais de um ano, somos ainda recém-nascidos, bebés, mas já sentimos que a nossa vida foi recebida com assombro e alegria por vós, e esta é uma grande graça de bênção para nós.
Pedimos o dom das vossas orações, para que a obra possa crescer e desenvolver-se, de acordo com os desejos do Coração Imaculado de Maria sobre nós. Rezamos para que os jovens de Portugal que estejam perdidos na escuridão do mal possam encontrar aqui uma luz de esperança para as suas vidas.
A todos os que quiserem vir visitar-nos, estamos em Fátima, em Montelo: vinde… e vede!