A liberdade é hoje o principal valor afirmado na nossa sociedade. É colocado até acima da vida. Cada um deve poder pensar, exprimir-se, agir e viver como melhor entende, sem que ninguém lhe possa pôr entraves. Rejeitam-se os limites exteriores, legais ou de opinião alheia. Admite-se somente que a liberdade individual termina onde começa a dos outros. Estes aparecem apenas como condição de possibilidade para que eu seja livre. E todos, mesmo o Estado, devem respeitar, tutelar e ajudar a liberdade de cada um. Gozar de liberdade parece ser o caminho único para a afirmação da pessoa e a sua felicidade.
Entendida neste modo, a liberdade centra-se muito no eu e nos direitos individuais. Falta-lhe a dimensão da responsabilidade própria e pelos outros, da relação, igualdade e cooperação e do bem comum como valor para o qual tende a liberdade individual e que, de algum modo, a deve garantir. Compreendido assim e levado quase ao absoluto, este valor corre o risco de fechar as pessoas em si mesmas, isolando-as e contrapondo-as umas às outras, fazendo-as perder a justa relação, sentido de responsabilidade, convivência feliz e generosa solidariedade.
Estamos muito influenciados por esta conceção, que é sobretudo a possibilidade de cada um decidir por si mesmo e conforme a própria vontade. Que liberdade vivemos e procuramos? Que liberdade pode contribuir para a minha realização pessoal, a feliz convivência com os outros e a construção do projeto comum de desenvolvimento da humanidade na justiça, na solidariedade e na cooperação?
A Palavra de Deus escutada na liturgia do passado domingo (13º do tempo comum) ajuda-nos a compreender a liberdade na perspetiva de Jesus Cristo e da fé cristã. O evangelho (Lc 9, 51-62) apresenta-nos Jesus como um homem determinado e livre: move-se pela relação com o Pai e a missão de anunciar o Reino de Deus; e nada o demove; contraria os discípulos, respeita mesmo aqueles que o rejeitam e ao seu povo, recusando lançar sobre eles a maldição; a quem o quiser seguir e aos que chama aponta a condição de ser livre em relação aos afetos familiares, aos costumes e aos próprios bens. Desta liberdade dá testemunho também Eliseu: perante o chamamento divino, deixa bens e família para seguir Elias e se tornar profeta com ele e como ele, anunciando a palavra de Deus ao povo e aos seus líderes (1 Re 19, 16b.19-21).
Mas é sobretudo S. Paulo que, na Carta aos Gálatas (5,1.13-18), enaltece o dom da liberdade de Cristo aos seus discípulos. Ela comporta um modo de viver novo quer em relação à lei religiosa quer no domínio dos próprios instintos e tendências do corpo e do próprio ser. Para viver uma verdadeira liberdade, é preciso deixar-se imbuir e guiar pelo Espírito de Deus e pelo amor que ele derrama nos corações de quem o acolhe pela fé e o discernimento.
No sentido cristão, a liberdade é dom do Espírito Santo à pessoa e, portanto, experimenta-se e brota do seu interior. Implica consciência de si próprio, da sua dignidade e vocação, da relação com os outros e acima de tudo com Deus, e sentido de responsabilidade. Quem se deixa conduzir pelo Espírito e adquire a liberdade espiritual vive segundo o amor numa relação de reciprocidade com os outros, colocando-se cada um ao serviço dos demais, valorizando-os, respeitando-os e apoiando-os. Por isso, diz S. Paulo, quem assim vive não faz propriamente o que quer, mas o que é bem para si próprio e para os outros. Esta é uma liberdade entendida e vivida na relação e responsabilidade com os outros. Nesta conceção, o bem comum é um valor fundamental para o qual cada um contribui com a sua parte e usufrui segundo as suas necessidades.
A conceção cristã da liberdade não nega nem se contrapõe ao modo como ela é normalmente vivida na sociedade atual. Dá-lhe, no entanto, uma outra motivação, horizonte e referência. Jesus Cristo, diz o Apóstolo, libertou-nos “para a verdadeira liberdade” e esta é vivida na caridade, segundo esta palavra: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo”. É esta liberdade que permite reconhecer e tratar os outros como irmãos e construir com todos a fraternidade. Cabe-nos, enquanto cristãos, viver, testemunhar e promover a verdadeira liberdade, que a todos deve ser reconhecida.
Não deixemos que nos roubem esta liberdade e não nos conformemos enquanto houver alguém que dela não possa usufruir ou a quem, por qualquer motivo, não seja reconhecida. Deus quer-nos livres e capazes de viver na liberdade uns com os outros.