À conversa com o reitor do Santuário de Fátima: Centenário terá sucesso se houver “experiência de Deus”

Neste início do Ano Jubilar do Centenário das Aparições de Fátima, o PRESENTE esteve à conversa com o reitor do Santuário, padre Carlos Cabecinhas. Avaliando como positivo o ciclo de preparação dos últimos seis anos, este responsável reconhece a visita do Papa Francisco como ponto alto do programa para 2017, mas considera haver muitos outros motivos para celebrar. Fala-nos do programa cultural e festivo, mas é nas celebrações litúrgicas que resume o fundamental da oferta do Santuário.

Atento às notícias que circulam sobre Fátima, concentra-se no desejo de que os fiéis consigam fazer “uma verdadeira experiência de Deus, conduzidos por Maria”, sobretudo na vivência das peregrinações. Será esse o verdadeiro “sucesso” da comemoração do centenário. Espera, ainda, que que o Santuário mantenha no futuro o dinamismo trazido pelo programa comemorativo, convicto de que a Mensagem de Fátima manterá a sua atualidade nos próximos 100 anos.

Em tom bem-humorado, só não aceitou imaginar o que diria hoje Nossa Senhora, se voltasse a aparecer, mas não tem dúvidas de que ela voltaria a encontrar três crianças disponíveis para acolher a “surpresa” que Deus lhes quisesse revelar.

Entrevista de Luís Miguel Ferraz

 

Chegámos ao ano do centenário, mas podemos dizer que estamos em celebração desde os últimos seis anos. Que balanço faz do percurso feito?

Um balanço nesta fase é ainda arriscado. O que poderemos desde já sublinhar é o ritmo que se foi criando na vivência do Santuário, com o conjunto de iniciativas ligadas à preparação e celebração do centenário. É o caso das relativas à promoção e aprofundamento da Mensagem de Fátima, como os cursos, ciclos de conferências e simpósios.

Também a nível celebrativo, esta dinâmica jubilar ajudou-nos a configurar o programa do Santuário, até com a criação de novas celebrações, como a da evocação das aparições do Anjo a 21 de março, que não existia antes.

Em paralelo, aponto as iniciativas festivas que procurámos desenvolver como ajuda para vivermos em clima jubilar e que atingem o ponto alto neste ano 2017.

Nessa diversidade, que iniciativas salientaria como as opções mais acertadas?

De modo geral, avaliamos todas as opções como acertadas, positivas e com muitos frutos para a vida do Santuário. Dou o exemplo do aprofundamento da Mensagem que se promoveu em iniciativas como o Congresso Eucarístico Nacional em que o Santuário foi coorganizador, o Congresso Internacional de Mariologia da Pontifícia Academia Mariana que acolheu, e o seu próprio Simpósio Teológico-Pastoral. Três eventos com grande adesão, que nos mostraram o acerto da opção em manter uma oferta formativa tão intensa. Outro exemplo poderá ser o musical que encomendámos, que esgotou as quatro sessões apresentadas e – estou certo – continuaria a esgotar mais algumas que se fizessem no salão do Centro Paulo VI.

Penso que isto nos fez perceber, sobretudo, o acerto de abordarmos a Mensagem de Fátima com linguagens muito diversas – teológica, litúrgica, mas também da cultura e das artes – que levam à multiplicidade de leituras e vivências.

Essa programação tem contado com o envolvimento efetivo da Igreja em Portugal?

Obviamente, este é um programa do Santuário, que o dinamiza. Mas o Santuário não é uma ilha, tem carácter nacional, está permanentemente em comunhão com os bispos portugueses e sob a sua aprovação. Além disso, procuramos sempre uma comunhão profunda com a Diocese de Leiria-Fátima, que tem a responsabilidade primeira por este Santuário. Portanto, se a iniciativa e a dinamização são do Santuário, que é um dos rostos da Igreja em Portugal, são-no dela também.

2016-12-01 entrevista1Diálogo com a cultura

Referiu a aposta no diálogo com o mundo da cultura. Está a atingir os objetivos?

Penso que sim. Pela via da cultura, pretendíamos atrair os que já são peregrinos habituais, mas também aqueles para quem Fátima não é tema significativo. A nossa perceção é que tem sido cumprida essa missão, que é também evangelizadora, de tocar o mundo da cultura e dialogar com ele.

A opção é apenas pela via erudita, ou há preocupação em atingir o público de uma cultura mais “popular”?

Temos procurado que seja um programa o mais abrangente possível e não elitista. Por um lado, todas as iniciativas são tendencialmente gratuitas e abertas a todos. Por outro, procuramos corresponder a sensibilidades diversas; quem não se sentir atraído por um concerto de órgão ou espetáculo musical, poderá gostar da proposta de percurso imersivo sobre o Anjo que preparámos em Aljustrel e nos Valinhos, ou do “videomapping” que está pensado para maio do próximo ano, iniciativas que procuram ser uma resposta global a todas as pessoas.

Sublinho que, para a generalidade dos peregrinos, o fundamental é a participação nas peregrinações; é isso que é decisivo e marca a vinda a Fátima e que todos esperam do Santuário. É aí que centramos todo o cuidado e toda a atenção.

Ano marcado pela visita do Papa

Este último ano acabou por assumir o tema global do septenário. Qual o motivo?

Foi por termos a sensação de que esse tema geral, que era o que queríamos destacar, ficou um pouco na “sombra”. Decidimos recuperá-lo porque é plenamente harmonizável com o tema previamente escolhido, de temática mariana, e porque centra a nossa atenção no aspeto fundamental da Mensagem de Fátima, a revelação do Imaculado Coração de Maria. E recuperámos as próprias palavras da Virgem e as imagens fundamentais de “refúgio” e “caminho” contidas nesta promessa feita à Lúcia.

Embora na linha dos últimos seis anos, houve algum aspeto que tenha sido particularmente intensificado no programa para 2017?

O que foi preparado com maior atenção e cuidado foram as peregrinações e respetivas celebrações. Vamos entrar no Ano Jubilar e todas essas peregrinações terão esse carácter “festivo”. Nesse sentido, fazemos propostas como um itinerário para os peregrinos, a passagem pelo pórtico do centenário como sinal visível da travessia espiritual que cada um é convidado a fazer, e uma oração de consagração a rezar em todas as celebrações do ano.

Que iniciativa destacaria do programa como a mais importante?

A vinda do Papa, em maio, é obviamente o momento central e mais importante do ano. Já o seria por ser a peregrinação de maio, data da primeira aparição e da celebração oficial de Nossa Senhora de Fátima, mas com a presença do Papa reforça-se essa centralidade.

Destaco ainda, do ponto de vista cultural, o grande concerto de encerramento das celebrações, no dia 13 de outubro, com obras encomendadas a dois grandes compositores do panorama nacional e internacional.

Têm vindo a público informações dispersas sobre a visita papal. O que é já oficial?

O oficial é o que foi confirmado pelo Papa ao Bispo de Leiria-Fátima, na audiência privada de 25 de abril de 2015: que quer vir à Cova da Iria celebrar o Centenário das Aparições. Quanto aos pormenores dessa visita, nada mais sabemos e aguardamos com serenidade a comunicação pela Santa Sé.

Gostaria que fosse uma visita prolongada e com passagem por outros locais em Portugal?

Tem sido opção do Papa Francisco, nos países europeus, ir aos locais específicos que motivam a sua deslocação e não às capitais, por exemplo. Penso que a opção para Portugal será a mesma.

Quanto ao que eu gostaria… se o Santo Padre quiser ficar uma semana no Santuário de Fátima, cá o acolheremos com alegria!

Com esta centralidade em maio, não se corre o risco de ficar algo “esvaziado” o restante programa do ano?

Penso que esse momento central não esvaziará o que o antecede e o que se seguirá. Todo o ano será festivo e há muitas outras iniciativas que terão, certamente, a atenção dos peregrinos. Basta ver o número de peregrinações nacionais que muitos países têm agendadas entre maio e outubro, bem como grupos de todo o país e do mundo inteiro. Isso marca os que vêm, mas também os que os acolhem e recebem esse testemunho de fé de quem quer estar presente em Fátima neste ano centenário. Esse é um movimento que tem crescido muito já no ano passado, com mais grupos e grupos mais numerosos.

2016-12-01 entrevista2Que tipo de participação no centenário aconselha aos diocesanos de Leiria-Fátima?

O que recomendo é que venham em peregrinação, pois essa é a experiência fundamental e a dimensão específica de vivência da fé que o Santuário promove. Este ano estão previstas peregrinações vicariais e a expectativa que temos é que sejam vividas com essa intensidade, sublinhando também o encontro que proporcionam com o Pastor diocesano. Desejo que sejam fortes experiências de peregrinação e de ação de graças por Fátima pertencer a esta Diocese.

 Olhar o futuro

No final das comemorações do centenário, o que desejaria que ficasse na mente e no coração dos fiéis?

Gostaria que levassem uma forte experiência de Deus e de fé, que é aquilo a que Nossa Senhora nos conduz. Se isso acontecer, se nos sentirmos conduzidos por Maria até Deus, podemos dizer que valeu a pena, que a celebração do centenário foi bem-sucedida.

Depois disto, qual o rumo que prevê para o Santuário?

A nossa intenção é manter o dinamismo e o ritmo de iniciativas que se criaram com este ciclo de comemorações. Haverá necessariamente algum abrandamento na quantidade de eventos pontuais, sobretudo no programa cultural, mas queremos dar continuidade à qualidade dos ritmos que se criaram nesse campo e, sobretudo, da oferta formativa e dos aspetos celebrativos que vieram enriquecer a vida do Santuário.

A Mensagem de Fátima continuará a fazer sentido nos próximos 100 anos?

Estou convencido de que continuará sempre a manter a atualidade e a fazer todo o sentido. Antes de mais, porque a sua atualidade é, fundamentalmente, a do Evangelho, para o qual ela remete. Depois, porque é a centralidade e primazia de Deus que está no centro da Mensagem de Fátima, e será sempre necessário reafirmá-lo, hoje, amanhã e daqui a 100 anos.

Há um aspeto que gostaria que perdesse a atualidade nos próximos 100 anos, que é o apelo à paz. Era bom que deixasse de ser necessário rezar pela paz e que ela se tornasse a realidade do mundo, por ter deixado de haver conflitos armados. Claro que a paz é muito mais do isso, mas esse é um aspeto dramático com que debatemos hoje, tal como o é a perseguição aos cristãos, que são atualmente o grupo religioso mais perseguido em todo o mundo. Recordo que a terceira parte do segredo de Fátima fala, precisamente, da perseguição à Igreja, o que é profundamente atual e premente neste primeiro centenário e gostaria que não o fosse no segundo.

Aparições hoje

Se Nossa Senhora aparecesse hoje a três crianças, quais imagina que seriam as palavras que lhes dirigiria?

É um exercício que não consigo fazer. O nosso Deus é um Deus de surpresas e estas manifestações têm sempre carácter surpreendente. E só Nossa Senhora saberia como tocar os corações das crianças, como aconteceu há 100 anos. Imaginar o que diria, será apenas projetar aquilo que gostaríamos de ouvir e não conseguir contar com a surpresa de Deus e a sua capacidade de tocar os corações.

…e Nossa Senhora conseguiria encontrar, no mundo de hoje, três crianças como os Pastorinhos, com disponibilidade para ouvir, acolher e viver esta mensagem de santidade?

Não tenho dúvidas. Também hoje, as crianças são as que estão mais recetivas. E também hoje, as crianças seriam destinatários preferenciais de uma mensagem que Deus quisesse transmitir ao mundo através de Nossa Senhora.

 

2016-12-01 entrevista4Relação com a sociedade

Como reage o Santuário às reações adversas, como a petição que está a circular contra a vinda do Papa?

Prestamos atenção a tudo o que diz respeito a Fátima e, portanto, também às críticas. A opção normal é não comentar, pois, embora possamos não concordar, aceitamos que todos têm a liberdade de ter a sua opinião e de a manifestar.

E a um cristão que queira responder a essas críticas, que argumentos ofereceria?

Bom, o grande argumento começa por ser o reconhecimento oficial da Igreja Católica relativamente ao acontecimento de Fátima, como extraordinário, sobrenatural e digno de crédito.

Em termos de argumento baseado no estudo aprofundado do tema, basta comparar a bibliografia histórica e teológica que fundamenta a verdade de Fátima com os livros que são apresentados para a atacar. É evidente, nestes últimos, um condicionamento ideológico, uma decisão fechada a qualquer possibilidade de diálogo.

E como se relaciona o Santuário com as entidades que promovem outros objetivos, como a economia local, o turismo, a mais-valia política?

O Santuário sempre teve a preocupação de manter todos os canais de diálogo abertos com todos os que têm como missão acolher peregrinos, visitantes ou turistas. Há vários anos que promovemos encontros com hoteleiros e comerciantes de Fátima, na convicção de que um bom serviço que se presta é sempre uma ajuda de parte a parte. Se o Santuário fizer bem o que lhe é específico, ajudará a desenvolver o movimento económico na cidade. Se a hotelaria e o comércio fizerem bem o seu trabalho, ajudarão o Santuário e os peregrinos que aqui se deslocam. Não somos “concorrentes” de ninguém, mas complementares na oferta que fazemos.

Neste campo, não há que “demonizar” o comércio aqui existente, porque ele presta um serviço que responde à procura dos peregrinos, seja para necessidades básicas como a alimentação, seja para levar uma recordação da visita. Há que perceber o que é específico de cada entidade e que cada uma o faça bem e com competência.

E que comentário faz às notícias que dão conta de alugueres de quartos por particulares, por ocasião da vinda do Papa, a preços que chegam a um ou dois milhares de euros por noite?

O único comentário que faço é que, nos alojamentos do Santuário, não fizemos qualquer alteração aos preços diários.

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